segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Primeiro turno: o poder pedagógico do erro

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4 outubro 2010
Por Mauro Carrara

Em Abril, vários canais da chamada blogosfera publicaram texto de minha autoria denominado “E Dilma vai virando outra Marta”.

Naquela ocasião, tratei da fábrica de “hoaxes” graeffista. Contei que a dona da quitanda, aqui perto de casa, já havia recebido e-mail que apontava Dilma Rousseff como “assaltante de bancos” e “prostituta de guerrilheiros”.

Na época, a oposição já trabalhava para colar tudo que há de ruim à imagem da candidata petista.

Repetia-se o rito difamatório que havia arranhado gravemente a reputação de Marta Suplicy, e que lhe tirara a oportunidade de recuperar a prefeitura paulistana.

Em abril, percebia-se um padrão de erro nas ações estratégicas de comunicação do PT e de seus aliados.

Citei a ausência de canais de informação multitemáticos de esquerda, o alcance limitado e a dinâmica circular da “blogosfera lulista”, o receio petista da mídia centralizadora e a ausência de uma ação estratégica de combate aos canais virtuais de difusão de calúnias.

Quando a campanha engatou, Dilma foi catapultada ao primeiro lugar por conta da popularidade de Lula e dos feitos espetaculares de seu governo.

A candidata parecia caminhar para uma vitória fácil no primeiro turno. E logo os comunicadores vermelhos calçaram sapatos femininos de salto agulha, altíssimos e envernizados.

Chegou, então, o Setembro de Fogo, e a artilharia oposicionista passou a assestar outros canhões contra a candidata.

Durante quatro semanas, milhões e milhões de e-mails foram enviados para os brasileiros conectados à Internet.

Outras peças caluniosas acabaram incorporadas ao Youtube, a blogs, listas de discussão e tópicos de comunidades de relacionamento.

Dilma foi pintada como “assaltante de bancos”, “terrorista”, “assassina”, “incompetente”, “autoritária” e “inimiga da fé”.

Semanas atrás, tentei, sem sucesso, disseminar um artigo com informações detalhadas sobre a campanha difamatória promovida por padres, pastores e obreiros de linha conservadora.

Naquela data, a frase “nem Cristo me tira essa vitória”, atribuída falsamente a Dilma, aparecia em nada menos que 120 mil documentos localizados pelo Google.

Até mesmo sessões de “cinema político-religioso” foram realizadas para instigar nos fiéis o ódio pela candidata governista.

Esse trabalho de envenenamento de corações e mentes foi intensificado após o Caso Erenice, exposto com estardalhaço pela mídia monopolista.

Esperava-se, portanto, que o tempo de propaganda na TV e no Rádio fosse utilizado, pelo menos em parte, para esclarecer os eleitores sobre essas questões.

O que se indagava na ruas era: “será verdade?”

Os comunicadores do PT, no entanto, preferiram apostar no silêncio, crentes em uma inevitável vitória na primeira rodada.

Por soberba ou por conta de avaliações técnicas equivocadas do jogo eleitoral, esses profissionais desperdiçaram os últimos programas do horário gratuito.

Na TV e no rádio, pareceram pasteurizados, indistintos, produzidos em outro planeta, descolados da realidade da eleição.

Ao perceber (tardiamente) o estrago promovido nas igrejas, o PT promoveu às pressas um encontro entre Dilma e líderes religiosos progressistas.

No entanto, deu mínima visibilidade ao evento (fiando-se talvez no poder difusor da mídia monopolista) e não foi capaz de esclarecer e acalmar os fiéis.

No 3 de Outubro, muitos foram às urnas convencidos de que Dilma era o próprio “anticristo”, sedenta por perseguir sacerdotes, proibir símbolos religiosos e impor restrições aos programas evangélicos.

No comando da campanha, confunde-se com frequência a chamada “agenda positiva” com “autismo”. Em muitos momentos, as inquietações do eleitor foram solenemente ignoradas.

Alertado por amigos, naveguei pela comunidade “Apoiamos Lula, agora é Dilma” (120 mil membros), na rede de relacionamentos Orkut.

Ali, um certo moderador X3 criou, em 22 de Setembro, um tópico no mínimo curioso. Ao título “Atenção Militantes! É guerra!” agregou a ordem “mas é guerra de silêncio”.

Assegurando ter recebido “orientações”, instruiu os membros a não responder a ataques nas outras comunidades orkutianas. “Pratique solenemente o menosprezo”, ensinou X3.

Já se sabe qual foi o resultado dessa estratégia. Dilma perdeu inúmeros votos entre os cristãos, sobretudo os evangélicos, e teve sua imagem gravemente corroída entre milhões de jovens que atuam nas redes sociais.

O primeiro turno terminou assim, de forma rápida, bruta e dolorosa. E só tem algum valor se constituir um exemplo pedagógico.

Agora, cabe comparar, sim, um governo contra o outro. E beliscar quem não se lembra dos anos finais da gestão FHC, marcados por apagão, desemprego, centralização econômica e desesperança.

Urge igualmente ao PT e seus aliados combater vigorosamente os boateiros profissionais e amadores.

Diante de ataques dessa natureza, é preciso oferecer imediatamente a outra versão dos fatos.

Um partido de massas não pode ser furtar à tarefa de esclarecer, sempre com a redundância e o didatismo exigidos na lida com as multidões.

E esta ação deve mobilizar a candidata, os responsáveis pela propaganda oficial e aqueles ainda concebidos como “militantes”.

Começa agora. Não começou? Já é tempo perdido.

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