terça-feira, 17 de dezembro de 2019

GUAJAJARA: UMA LONGA HISTÓRIA DE RESISTÊNCIA

Nas postagem anterior relembrei das disputas entre não-indígenas e o povo guajajara. A área onde se instalou a Missão dos Capuchinhos Lombardos continuou historicamente alimentado os conflitos com os indígenas até o ano de 1996.

Esta área está localizada nos municípios de Jenipapo dos Vieiras, Barra do Corda e Grajaú.

Os povoados intrusos eram compostos por trabalhadores rurais e pequenos comerciantes e se instalaram na terra indígena a partir da Missão dos Capuchinhos Lombardos (no século XIX).

O povo Guajajara, mesmo depois da brutal repressão do levante de Alto Alegre, jamais aceitou a intrusão.

No final da década de setenta, os conflitos entre índios e não-indígenas se agravaram. A FUNAI conseguiu a retirada dos invasores que habitavam o Alto Alegre e o Centro do Meio, mas o povoado São Pedro dos Cacetes permaneceu no local.O fato continuou a gerar contínuos conflitos, que se agudizaram no início dos anos 90.

Fato curioso de se relembrar é que, em 1979, foi firmado o Convênio nº 080/79, entre a FUNAI e o Estado do Maranhão, para transferências das famílias ocupantes das terras indígenas - Lagoa Comprida, São Pedro dos Cacetes e Alto Alegre.

A FUNAI repassou para o Estado do Maranhão cento e sessenta milhões de cruzeiros, em duas parcelas. Embora tenha recebido estes valores, o Estado não cumpriu sua obrigação contratual e, desta forma, o Povoado São Pedro dos Cacetes permaneceu lá com seus problemas.

Alguns acontecimentos favoreceram o acirramento dessa disputa secular.

a) a demarcação, em 1977, e a homologação da terra indígena Canabrava, em 1991;

b) uma liminar concedida pela justiça federal em 1993, obrigando a desintrusão;

c) A posição formal contrária à desintrusão das autoridades municipais de Grajaú (prefeito e 18 vereadores);

d) dois vereadores de Grajaú, residentes no povoado passaram a incentivar o loteamento da área, facilitando a entrada de mais pessoas não-indígenas;

e) o ataque a tiros a nove indígenas grávidas por moradores de São Pedro dos Cacetes;

f) a morte de um dos fazendeiros da região, atribuída aos indígenas;

g) A vingança da família do fazendeiro, ocorrida no mesmo dia, com a colaboração da Polícia Militar, resultando no homicídio de dois indígenas Guajajara, cujos corpos foram jogados no rio Mearim;

h) os limites dos territórios reivindicados pelos Guajajaras foram desconsiderados pelos decretos de demarcação;

i) a posição ambígua da FUNAI, ora reconhecendo o território,ora fazendo o jogo dos interesses religiosos e ruralistas;

j) a proposta de elevação do povoado de São Pedro dos Cacetes à categoria de município, constante do art. 48 do Ato das Disposições transitórias da Constituinte estadual de 1989s, barrada pelo STF;

Por fim, a retirada do povoado do Alto Alegre ocorreu em 1981. A do São Pedro dos Cacetes, que deveria ter ocorrido, também em 1981, só foi efetivada no ano de 1996.

Foram portanto cerca de 26 anos de disputa pela posse da terra, com o incitamento da população não-indígena local contra os indígenas.

Os problemas envolvendo a desintrusão agravaram a ambiência de preconceito e hostilidades na região. Reassentados não receberam indenizações compatíveis com as benfeitorias, políticos fizeram promessas de compensações que nunca ocorreram.

Os não-indígenas que foram retirados da T.I. e foram morar em povoados dos arredores compuseram e incentivaram a opinião pública dominante entre não-indígenas contra o povo Guajajara até os dias atuais.

Dessa forma, do início da contato, em 1615, com as diversas formas de escravidão instituídas, de 1985 (ano da implantação do projeto missionário dos Capuchinhos), passando pela desintrusão (concluída apenas na década de (90), acrescentando-se a invasão do território pela Eletronorte, cujas compensações nunca foram negociadas a contento, os conflitos prosseguem.

Desde o primeiro contato registrado de colonizadores com os Guajajara, em 1615, por uma expedição francesa às margens do rio Pindaré, na verdade, nunca houve trégua.

Até meados daquele século, os Guajajara foram alvo de expedições de portugueses que buscavam indígenas para escravizar. Muitas aldeias foram exterminadas e a preagem de índios era institucionalizada.

As missões dos jesuítas se instalaram nos territórios guajajara entre 1653 e 1755. Em troca de proteção contra a escravidão dos fazendeiros, instituíram um sistema de dependência e servidão, que desorganizava seu modo tradicional de organização social.

Na metade do século 19, após a saída dos jesuítas do Brasil, o trabalho dos Guajajara voltou a ser explorado por fazendeiros locais. O modelo de semi-escravidão foi reinstalado.

Além da missão dos Capuchinhos, em 1895, entre 1960 e 1970 vieram os fazendeiros, empurrando posseiros para dentro do território guajajara. As madeireiras chegaram na década de 80.

Em 1992, assassinos de aluguel sequestraram e mataram o filho de um cacique guajajara da região. No dia seguinte, os indígenas mataram um trabalhador rual e posteriormente, cerca de mil indígenas bloquearam a rodovia, fazendo 400 reféns que por ali transitavam.

Ainda nos anos 2000 eram retiradas cerca de 30 caminhões de madeira das terras indígenas dos guajajara.Em 2007, ocorreram novos episódios violentos com madeireiros, que realizaram manifestações resultantes em conflitos armados com os indígenas.

A disputa deixou vários feridos e resultou em bloqueios de rodovias, saques de caminhões e lojas e destruição de equipamentos do Ibama.

Em 2015, madeireiros ilegais atacaram uma equipe do Ibama que fiscalizava a Terra Indígena Arariboia, onde havia suspeita de queimadas ilegais.

Os dados sobre a violência contra os guajajara e outros povos do Maranhão foram postados anteriormente. No espaço de dez anos, de 35 mortos indígenas, 26 são da etnia guajajara.

O MONUMENTO AOS "MÁRTIRES" DO ALTO ALEGRE: BRANCOS E CATEQUIZADORES

O depoimento do Frei Carlos de Arary, missionário Capuchinho, quando aqui esteve, em 1951, por ocasião de uma reportagem especial que fazia para o periódico católico “A Voz de São Francisco”, enfocando os 50 anos do massacre do Alto Alegre, é o retrato fiel de um fato histórico pessimamente interpretado por esse segmento da Igreja Católica, até os dias atuais. Dizia o Frei:
“A fim de assistirmos à inauguração da Igreja – Monumento aos Mártires de Alto Alegre, à transladação das relíquias das vítimas da hecatombe de 13 de março de 1901, para o novo templo, e à ordenação de três novos sacerdotes capuchinhos, na Igreja – Monumento, partimos do Ceará, no dia 16 de dezembro próximo passado rumo à Barra do Corda (...)".
O chamado "Monumento aos Mártires de Alto Alegre" continua exposto na Matriz de Barra do Corda. As imagens das "vítimas" estão também expostas na fachada da Igreja.




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Estamos com certeza diante de mais um episódio protagonizado pela Igreja Católica que mereceria uma atenção do Papa Francisco.
O chamado "massacre de Alto Alegre" e suas rituais homenagens sempre esconderam a análise crítica sobre a presença dos Capuchinhos na região, e o modelo de suas pretensões evangelizadoras autoritárias sobre os indígenas guajajara.
O episódio, em verdade, revela uma das principais guerras de resistência do povo indígena do país, contra o massacre de suas identidades étnicas.
Em 1901, o povo guajajara se levantou contra o modelo missionário evangelizador que atacava sua forma de vida tradicional e sua religiosidade.
Os indígenas de várias aldeias reunidas da região atacaram com armas de fogo e mataram os religiosos da Missão de Alto Alegre - um enclave evangelizador  dentro do território indígena, que internava crianças e imobilizava a força de trabalho dos índios para o modelo das missões.
Logo em seguida, tomaram de assalto várias fazendas da região entre Grajaú e Barra do Corda, espalhando o medo e o terror pelo interior do estado. Aproximadamente 1000 indígenas foram mortos em represália.
A memória desse povo ainda guarda, no entanto, o ocorrido. A disputa do Alto Alegre está relacionada ao conflito do povoado São Pedro dos Cacetes (um episódio mais recente para a sociedade não-indígena local).
De um lado, índios Tentehar/guajajara e, de outro, os moradores dos povoados São Pedro dos Cacetes, Alto Alegre e Centro do Meio (também denominado Centro do Felipe Preto), incluindo-se uma missão de frades capuchinhos, que lutavam pela posse de parte da área demarcada sob a denominação de terra indígena Cana Brava/Guajajara. 
Pois bem. Até recentemente a missão dos Capuchinhos, mesmo depois da tragédia do Alto Alegre, tentava legitimar o esbulho da terra indígena, somando forças com os povoados não-indígenas que ali se radicaram à força.

OS DADOS SOBRE AS MORTES DE INDÍGENAS




Desde 2016, com 13 mortos, é o maior número de mortes de indígenas. Em 2019 já são 8 casos.

Os dados da CPT:



Nos últimos 10 anos, segundo o CIMI, os registros subiram entre 2009 e 2011, caíram entre 2012 e 2013, e depois subiram novamente e tiveram um pico de 11 mortes entre 2014 e 2016.

Veja os dados do CIMI:

Mortes de indígenas no Maranhão
2009 - 2019
CasosVariação2009201020112012201320142015201620172018201902,557,51012,5

2012
 Variação: 7
Fonte: Conselho Indigenista Missionário

A SMDH, no entanto, lembra que em 2017 houve duas mortes dos indígenas Gavião, José Caneta Gavião e Sônia Vicente Gavião foram atropelados e mortos por um caminhão madeireiro. Joel Martins Gavião Krenyê também foi vítima de um acidente de moto em 2016.

As mortes por acidente de trânsito precisam ser investigadas também, pois podem esconder uma estratégia de eliminação de lideranças indígenas.

A OFENSIVA CONTRA OS POVOS INDÍGENAS

Um adolescente de apenas 15 anos foi o quarto indígena da etnia Tenetehara (Guajajara) a ser morto em um mês e meio. Erisvan Soares Guajajara estava fora da terra indígena há mais de duas semanas, viajando com pai para a cidade, onde comprariam mantimentos.

A morte foi confirmada na sexta-feira (13/12/2019). Erisvan foi encontrado morto, juntamento com um não-indígena, Roberto do Nascimento, em um campo de futebol, em Amarante/MA. Eles foram trucidados por golpes de facão.

A FUNAI apressou-se em descartar crime de ódio ou relacionado à disputa de terras indígenas. A Polícia Militar atribuiu o duplo homicídio à questão do tráfico.

No sábado passado, dia 7 de dezembro, Firmino Prexede Guajajara e Raimundo Benício Guajajara, todos da mesma etnia, mas da região de Barra do Corda/MA, morreram vítimas de um atentado a tiros no Maranhão.

Eles saíam de uma reunião entre caciques e a empresa Eletronorte,  quando foram atingidos por disparos de arma de fogo que partiram de um veículo branco, às margens da rodovia BR-226, no município de Jenipapo dos Vieiras, entre as aldeias Boa Vista e El Betel, na Terra Indígena Cana Brava. A Polícia Federal ainda investiga o caso e nenhum suspeito ainda foi preso.

No início de novembro, o líder Paulo Paulino Guajajara, integrante de o grupo de autodenominado "guardiões da floresta", foi assassinado também na Terra Indígena Arariboia, a 100 quilômetros do município de Amarante, enquanto caçava.

A Polícia Federal também investiga a morte, que teria sido motivada por uma disputa territorial com madeireiros, que exploram a região de forma ilegal.

A violência crescente contra indígenas no Maranhão levou o ministro da Justiça, Sergio Moro, a determinar neste mês o envio de agentes da Força Nacional à região, a fim de garantir a segurança de servidores da Funai e de indígenas. A medida não inclui a TI Arariboia.


A medida, como se vê, é apenas mais um paliativo, visto que os discursos de ataque a comunidades indígenas e o alinhamento do governo federal aos ruralistas incentivam cada vez mais a violência contra os povos originários.

terça-feira, 12 de novembro de 2019

O GOLPE NA BOLÍVIA

Na Bolívia, Evo Morales foi deposto por um  golpe. 

Desde que a Bolívia realizou eleições gerais em 20/10/2019 a ambiência de ruptura institucional se agudizou.

Os dois principais candidatos à presidência eram o atual presidente Evo Morales (do MAS, Movimento para o Socialismo) e Carlos Mesa (FRI, Frente Revolucionária de Esquerda).

Evo estava no poder desde 2006, em que pese um referendo de 2016 houvesse rejeitado a possibilidade de sua reeleição. Em 2018, a Justiça Eleitoral reverteu a decisão do referendo, autorizando Morales a tentar o quarto mandato presidencial.

O argumento da Corte constitucional era que o limite de mandatos viola a garantia constitucional de que qualquer cidadão tem o direito de se candidatar, de acordo com o ordenamento jurídico boliviano.

A apuração dos votos começou ainda no domingo, dia 20. Na Bolívia o voto é manual, numa cédula gigante com nome e foto dos candidatos, para permitir a participação das pessoas que não sabem ler. 

Por conta da demora para sair os resultados, o TSE boliviano tinha duas apurações. Uma, mais demorada, que contava todos os votos, um por um. E a outra, mais rápido (express), para divulgar os resultados o mais rápido possível.

Ainda na noite do domingo de eleição, saiu uma parcial do resultado da apuração express. Essa parcial indicava que a decisão seria em segundo turno, porque Evo Morales ganhava por menos de 10 pontos de Carlos Mesa. Depois dessa divulgação, a contagem foi interrompida.

Os resultados só voltaram a ser divulgados no final da tarde da segunda-feira, após 20h de interrupção. E, surpresa: agora a apuração indicava que Evo Morales levava em primeiro turno por pequena margem superior aos 10% necessários.

Na noite de segunda-feira (21), após a divulgação de que Evo levaria no primeiro turno, o próprio presidente reivindicou a vitória. Opositores se rebelaram e incendiaram sedes do Tribunal Eleitoral

Na terça-feira (22), Carlos Mesa disse que não iria reconhecer a derrota. Os observadores da OEA também lançaram suspeitas sobre a apuração. A apuração oficial ainda não tinha terminado. Milhares marcharam em La Paz contra Evo. O vice-presidente do TSE boliviano renunciou diante das dúvidas sobre o processo.

Na quarta-feira (dia 24) Quatro dias após a eleição, finalmente a apuração terminou e Evo Morales foi declarado vencedor no primeiro turno. Brasil, Estados Unidos, Argentina e Colômbia não reconhecem a vitória de Evo Morales e pedem realização de segundo turno.

Os opositores, antes liderados por Carlos Mesa, pediam um segundo turno. No mesmo dia 24, mudaram a reivindicação para anulação das eleições e apontam como líder 
Luis Fernando Camacho, empresário, advogado e líder de movimento de direita em Santa Cruz.

Na quinta-feira (dia 25), liderados por Camacho, os manifestantes passam a pedir não só a anulação da eleição, mas uma nova votação, sem Mesa e sem Evo Morales.

Acuado, o governo da Bolívia aceitou que a Organização dos Estados Americanos (OEA) fizesse uma auditoria do processo eleitoral inteiro. Em 10 de novembro, a OEA divulgou resultado preliminar apontando fraude e a necessidade de novas eleições.

Ao tomar conhecimento do relatório, Evo ainda anunciou novas eleições, mas a notícia não foi suficiente para conter o movimento golpista que se alastrava pelas ruas, incendiando residências de governistas, depredando prédios públicos, ocupando ruas, aeroportos e estradas.

Naquele momento, ele já tinha perdido apoio dos militares, que se recusavam a reprimir manifestações. Os chefes das forças armadas "sugeriram" o afastamento do presidente para "pacificar o país". Sem condições de governar, Evo renuncia, mas denuncia que está sendo vítima de um golpe.

Nos últimos dias, várias autoridades na ordem de sucessão de Evo renunciaram também, criando um quadro de desorientação no país.

Os apoiadores de Evo ensaiam protestos nas ruas nos últimos dias e o caos continua. Não há sinais de que a crise possa ser debelada nos próximos dias.

A Conjuntura Política Boliviana

Desde que Evo saiu vitorioso no revogatório de 10 de agosto deste ano e teve seu mandato reconfirmado, a oposição ampliou as manifestações partindo das regiões mais ricas do país, a chamada 'meia lua' (Beni, Pando, Tarija e Santa Cruz).

Exigem a devolução de uma porcentagem do imposto sobre hidrocarbonetos, usado pelo governo para financiar um programa de previdência social e querem autonomia administrativa dos Estados, aprovada em referendo no início do ano.

A oposição rejeita a proposta da nova Constituição, considerada de cunho estatizante, e protestam pelo fato de seu projeto ter sido aprovado sem a presença da oposição.

O discurso anticomunista incita a expulsão de venezuelanos e cubanos da Bolívia. Os protestos ocorrem de fato desde o ano de 2003, atingindo o seu ponto máximo nos últimos dias.

O governo decretou estado de sítio na noite de sexta, onde houve confrontos no aeroporto de Cobija, em Pando. Nas províncias de Santa Cruz, Beni, Pando e Tarija, houve mais de 30 cortes de estradas, ocupações de entidades do Estado e ataques a várias instalações petrolíferas.

Tudo indica que Evo perdeu o apoio das Forças Armadas, que se alinharam com os interesses das regiões mais ricas do país. Mesmo com Evo cedendo e anunciando novas eleições, os militares exigiram sua renúncia.



O PERFIL DO GOLPE

O movimento golpista avançou sobre meios de comunicação estatais e ligados ao movimento sindical. Foi um movimento estratégico para isolar o governo da população. 

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A prefeita da cidade de Vinto, da província de Cochabamba, foi humilhada publicamente pela multidão por transportar camponeses apoiadores de Evo para enfrentar manifestantes.



Maria Eugenia Choque e Antonio Costas, presidente e vice presidente do Tribunal Superior Eleitoral da Bolívia, foram presos pelo corpo militar que tomou o poder no país no domingo (10). A prisão foi apresentada por soldados mascarados em uma entrevista coletiva (https://youtu.be/y1obcM-fnVI). Além deles, mais 36 funcionários da justiça eleitoral foram detidos. Maria Eugenia já havia renunciado ao cargo, quando foi presa.

O presidente Evo Morales ainda tentou um chamado pelo diálogo com os três partidos de oposição que conseguiram eleger deputados nas últimas eleições, mas apenas um aceitou.

Manifestantes oposicionistas invadiram a Bolívia TV e a rádio Pátria Nova, canais estatais bolivianos, no sábado. 

Os jornalistas e trabalhadores das redes foram ameaçados de morte caso não fossem interrompidas as transmissões. Somente com a chegada da Defensoria Pública no local foi garantido que os funcionários pudessem deixar o local com segurança.

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A emissora Bolívia TV e a rádio Pátria Nova tiveram seu sinal cortado pelos golpistas ainda no sábado (9 de novembro) e José Aramayo, diretor de rádio ligada à Confederação Sindical Única de Trabalhadores Campesinos da Bolívia (CSUTCB), foi amarrado em uma árvore pelos oposicionistas. 

A casa dos governadores de Oruro e de Chuquisaca
 também foram alvo dos golpistas. No mesmo dia, a casa da irmã de Morales também foi incendia. O própria Morales teve sua residência invadida e saqueada.

O presidente propôs neste sábado a construção de uma mesa de diálogo para pacificar o país diante das grandes tensões que abalam a Bolívia. 

Morales convidou os três partidos de oposição que obtiveram acento no Parlamento mas recebeu apenas respaldo do Partido Democrata Cristão (PDC), que disputou a Presidência com Chi Hyun Chun e ficou em terceiro lugar.

Já Carlos Mesa, segundo colocado nas eleições pelo Comunidade Cidadã (CC), não aceitou o convite, assim como Oscar Ortíz, do Bolívia Disse Não (BDN). O mais radical opositor é Luis Fernando Camacho.

sexta-feira, 8 de novembro de 2019

LULA SAIU E AGORA O BICHO VAI PEGAR


O Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou nesta quinta-feira (7) a execução de pena após julgamento em segunda instância. O voto decisivo foi do ministro da Suprema Corte, Dias Toffoli, que desempatou o placar, formando maioria a favor do novo entendimento da Corte Suprema do país, que rompe com a jurisprudência sobre o tema criada em 2016.

A decisão, que muda posição vigente desde 2016, foi formada por maioria apertada, com placar de 6 a 5. Foram cinco votos a favor da prisão após segunda instância (Fachin, Barroso, Moraes, Fux e Cármen Lúcia) e seis contra (Marco Aurélio, Lewandowski, Rosa Weber, Gilmar, Celso de Mello e Dias Toffoli). Como presidente do colegiado, coube ao ministro Dias Toffoli o voto decisivo, que desempatou o placar.

Três ações declaratórias de constitucionalidade (ADCs) pediam para o STF declarar constitucional o artigo 283 do Código de Processo Penal, que diz que ninguém pode ser preso sem condenação transitada em julgado.

A decisão representa a mais importante derrota da operação Lava Jato, desde que foi criada e beneficiará, segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), 4.895 pessoas presas após terem sido condenadas em segunda instância.

O processo pelo qual o ex-presidente cumpre pena, no caso do tríplex de Guarujá (SP), ainda tramita no Superior Tribunal de Justiça, que analisa recursos à condenação, portanto ele é um dos beneficiados com a decisão (já foi libertado hoje, inclusive).

Embora o ex-presidente continue impedido de disputar eleições, ainda enquadrado nos critérios da Lei da Ficha Limpa, suas duas condenações ainda poderão ser anuladas pelo STF, com o debate mais recente acerca da ordem dos depoimentos dos delatores.

A libertação de Lula introduz no cenário da conjuntura um elemento novo: mobilizações no país inteiro com ampla participação popular, capazes de desestabilizar o governo Bolsonaro.

quinta-feira, 17 de outubro de 2019

A FAKE NEWS JURÍDICA PARA OS TOLOS DO DIREITO


Quando entrou o debate do julgamento das condenações em segunda instância, os oportunistas de sempre invocaram dados Banco Nacional de Monitoramento de Prisões (BNMP) e concluíram que, se o Supremo fizer valer a Constituição, 190 mil pessoas que hoje estão presas podem deixar a cadeia.

Como juristas - especialmente lavajatistas e bolsonaristas - estavam no meio dos que propalavam essa farsa, reputamos como criminoso esse debaste, porque essas pessoas entendem como funciona o sistema de justiça, mas tentaram ludibriar a população novamente para influenciar o julgamento no STF.

Confundiram presos cumprindo execução provisória com presos provisórios. Dentre estes últimos, sabemos, estão presos em flagrante, que sequer foram condenados em primeira instância. E dentre os primeiros estão outro grupo, que nada tem a ver com o peixe: os presos em razão de prisão preventiva. Nenhum desses constituem os presos por condenação em segunda instância.

Presos condenados em segunda instância são aqueles que recebem mandado de prisão expedidos pelos tribunais (tribunais regionais federais ou tribunais de justiça, especialmente).

A conta cai para 4.895 presos nestas condições. O JN nacional deve ter divulgado a contragosto o informe do CNJ.

A decisão do STF, acaso respeite o princípio constitucional da presunção da inocência, também não impedirá o juiz de decretar a prisão preventiva, conforme o artigo 312, do Código de Processo Penal.

Ou seja, presos de alta periculosidade podem permanecer presos, aguardando o trânsito em julgado, independentemente da decisão do Supremo, A QUALQUER TEMPO. Isso depende do Tribunal e dos requisitos presentes no artigo 312. Olha a largueza desse dispositivo:

'Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria."

Com esse dispositivo ao alcance da mão qualquer juiz faz miséria. Parece até a alavanca de Arquimedes. Move o mundo.

PS: Os últimos dados divulgados pelo CNJ revelam que 41,5% dos presos no Brasil não têm condenação formalizada. Segunda instância para quem, não é mesmo? Mas não adianta também condenar os ricos com outro tipo de malandragem. Princípio de direito vale pra rico e para pobre. Eis a questão.

O SUPREMO FALARÁ POR ÚLTIMO ATÉ QUANDO?

sexta-feira, 4 de outubro de 2019

LAVA JATO OU SUPREMO: UM DOS DOIS VAI PARA O BREJO


A
questão da ordem dos depoimentos dos delatores reposiciona o julgamento do ex-presidente Lula, ao mesmo tempo que tem o poder de anular vários processos da Lava Jato.

A figura do delator foi utilizada amplamente pela Lava Jato. Celebrado o acordo de delação premiada, o delator se institucionaliza legalmente no processo, passando a ter os benefícios que a lei lhe confere.

De igual modo, sua localização processual em relação aos demais no processo não é mais apenas de corréu. Ele inegavelmente passa a atuar como linha auxiliar da acusação, abrindo mão do direito ao silêncio, estando obrigado a delatar.

Diante disso, o interesse processual do delator é absolutamente oposto ao interesse do delatado. Em que pese o delator ser formalmente réu, o seu interesse é pela condenação do delatado.

Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) entenderam, em sua maioria, que os réus delatados devem apresentar as suas alegações finais por último, dando a chance de se manifestarem depois dos delatores.

Diante da tese, contrária à Lava-Jato, os Ministros anularam duas sentenças da operação.

A primeira foi em agosto, quando os ministros invalidaram o processo do ex-presidente da Petrobras Aldemir Bendine, condenado a 11 anos de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

Bendine foi patrocinado pelo advogado criminalista e professor, Alberto Zacharias Toron, que teve a iniciativa de pedir para apresentar as alegações finais por último em sua atuação na defesa do ex-presidente da Petrobras. Na ocasião, o então juiz Sergio Moro negou o pedido e a questão foi levada até o Supremo, que anulou a condenação.

Foi como uma bomba na cabeça dos lavajatistas, porque o Moro tinha por costume não obedecer essa ordem, exatamente para dificultar a defesa dos réus.

Em um novo revés para a Lava Jato, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria nesta quinta-feira, 26, a favor da tese levantada pela defesa de Márcio de Almeida Ferreira, ex-gerente da Petrobras, que alegou que seu cliente sofreu grave constrangimento ilegal por não poder apresentar as alegações finais depois da manifestação dos réus colaboradores.

Com maioria formada, o presidente Dias Toffoli adiou a apresentação de seu voto para a quarta-feira (02/10), para definir como a decisão será aplicada aos processos em andamento nas outras esferas do Poder Judiciário.

Na Quarta, Toffoli resolveu adiar a sessão novamente, sob o argumento de que alguns ministros estariam viajando, mas é evidente que os motivos são outros. Um acordo está em andamento sobre a modulação dos efeitos da decisão.

Os procuradores da Lava Jato já argumentam que a decisão do STF pode levar à anulação de 32 sentenças envolvendo 143 dos 162 condenados na operação. Isso porque os casos voltariam à fase das alegações finais, etapa anterior à sentença de primeira instância, e alguns condenados poderiam ser liberados.

Alexandre de Moraes, que sugedriu a aplicação de medidas apenas em processos nos quais os réus reclamaram o direito de falar por último em primeira instância. Este é a situação de Aldemir Bendine, ex-presidente da Petrobras, e que suscitou o debate que levou à anulação da primeira sentença do ex-juiz Sergio Moro.

O presidente do STF, Dias Toffoli, já defendeu publicamente a criação de um limite para atenuar o alcance da decisão.

O Supremo agora está na berlinda. Se modular, vai restringir o direito de ampla defesa, um direito fundamental. 

Ordem de Habeas Corpus se concede ou não se concede. Nossa tradição jurídica informa que uma vez concedida a ordem, o próprio artigo 580 do CPP determina o efeito extensivo a corréus que estejam na mesma situação fático-jurídica concretizando o princípio da isonomia.

Não há hipótese de modulação - situação excepcional prevista no art. 927, § 3º, do Código de Processo Civil - em Habeas Corpus, remédio heróico para a proteção de direitos fundamentais de liberdade.


Contudo, até já se sabe quais as propostas de modulação estarão em jogo:

A primeira é que ela só se aplique a quem reclamou da ordem das alegações finais na origem do processo. A segunda é que ela só seja válida para quem comprovar o dano causado pela desobediência da ordem.

O CASO DE LULA

A rigor, após a homologação da delação de Leo Pinheiro, a decisão se amolda perfeitamente às duas condenações do ex-presidente Lula: a ação do apartamento do Guarujá e a do sitio de Atibaia.

Um depoimento decisivo para a condenação de Lula foi o de José Aldemario Pinheiro Filho, executivo da empresa OAS, mais conhecido como Léo Pinheiro. 

O depoimento de Leo Pinheiro foi fundamental para a condenação de Lula em 2017, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, pela propriedade de um apartamento triplex na cidade do Guarujá, no litoral paulista, como sabemos.

Na ocasião, Leo Pinheiro foi tratado como delator pela força-tarefa da operação Lava Jato, e recebeu benefícios de delator pelo juiz Sérgio Moro, embora não tivesse, no período, contudo, acordo assinado com o Ministério Público Federal, como exige o art. 4º, §§ 6º e 7º da Lei 12.850/2013, que regulamenta o instituto das delações premiadas.

Somente dois anos depois, em 13 de setembro de 2019, o ministro Edson Fachin homologou o acordo de delação premiada de Leo Pinheiro. A coisa foi tão estranha que até a  então Procuradora Geral da República se posicionou contra a homologação.

No entanto, não sendo Leo Pinheiro, ao tempo do julgamento, um delator, como poderia a defesa do ex-presidente Lula solicitar prazos sucessivos?

Por aí se tira que a tentativa de modulação não será tão simples.

domingo, 29 de setembro de 2019

JANOT DEU UM TIRO NA LAVA JATO

A declaração do ex-procurador geral da república, Rodrigo Janot, ainda vai render muito.

O STF já suspendeu o porte de arma de Janot e o impediu de se aproximar de ministros da Corte, após ele admitir que teve a intenção de matar Gilmar Mendes. Uma decisão autorizou uma busca e apreensão na casa do ex-chefe do MP e foram acautelados uma pistola e aparelhos eletrônico.

A decisão é do Ministro Alexandre de Moraes e é duvidosa, do ponto de vista técnico, decorrendo de um pedido do Ministro Gilmar Mendes. Moraes justificou que tem por objetivo “evitar a prática de novas infrações penais e preservar a integridade física e psicológica dos ministros, advogados, serventuários da Justiça e do público em geral que diariamente frequentam essa Corte”.

Além de ter suspenso o seu porte de arma, Janot está impedido de entrar em qualquer área do tribunal e tem de ficar a pelo menos 200 metros de distância dos magistrados.

Ele era esperado pelo STF para prestar esclarecimentos sobre o assunto, mas se recusou a prestar depoimento.

Provavelmente para fazer um marketing e promover um livro, as revelações comprometem a própria credibilidade de Rodrigo como um dos principais personagens da Lava-Jato. Com certeza não calculou as consequências do que disse.

 Além de ter chegado muito perto de dar um tiro no ministro Gilmar Mendes - fato gravíssimo e inédito no país - Janot confidenciou conversas com Aécio Neves e Michel Temer que deveriam ter sido denunciadas na época. Ou seja, Janot terminou por se incriminar também.

Integrantes da operação sabiam que na época o então procurador geral andava realmente armado, dizendo que iria atirar no ministro Gilmar Mendes. As autoridades da Esplanada relatam que também souberam da ameaça e aumentaram a segurança do ministro.

O jornalista Reinaldo Azevedo contestou a versão dada por Rodrigo Janot como o motivo para ele ter entrado armado em uma sessão do Supremo Tribunal Federal e quase ter assassinado o ministro Gilmar Mendes. 

Para Azevedo, Janot mentiu na entrevista a O Estado de São Paulo quando afirmou que Gilmar Mendes teria dito que a filha dele, Rodrigo, advogava na área penal  para uma empresa denunciada na Lava Jato.

Letícia Ladeira Monteiro de Barros,  filha de Janot, era advogada da OAS e da Odebrecht sim, mas não na área criminal.

Janot alegou o impedimento de Gilmar Mendes para atuar no caso Eike Batista porque o empresário era cliente, na área cível do escritório de Sérgio Bermudes, onde Guiomar Mendes, esposa de Gilmar, figura como associada. A diferença é que Guiomar jamais atuou em algum processo, cível ou criminal relacionado a Eike Batista.

E Reinaldo publicizou uma petição de Letícia endereçada ao CADE, como advogada da OAS, uma das empresas denunciadas na operação Lava Jato. 

Portanto, Gilmar Mendes apenas se defendeu da alegação de suspeição atacando o ponto fraco de Janot, numa escandalosa contradição.

Partindo de um dos mais efetivos apoiadores da Lava Jato, cujas denúncias portavam o timbre da república de Curitiba, as declarações de Janot soam como a pá de cal, porque recursos subirão, sob a alegação de instabilidade mental do ex-procurador geral, para anular dezenas de processos criminais.

Moral da história 1: não apenas o STF precisa fazer uma dura reflexão sobre relações espúrias.

Moral da história 2: Ou Janot é burro ou realmente padece de problemas mentais.

quinta-feira, 26 de setembro de 2019

A LAVA JATO EM INFERNO ASTRAL

O Lavajatismo continua aprofundando sua crise de legitimidade.

Depois da derrubada dos vetos à proposta de Lei de Abuso de Autoridade, veio agora o julgamento no STF sobre a ordem dos depoimentos nos casos envolvendo delação premiada. 

Pois bem, hoje o plenário do Supremo formou maioria no sentido de fixar o entendimento de que os réus delatados têm do direito de falar por último nos processos em que figuram réus delatores.

A decisão atinge de cheio a estratégia amplamente utilizada pela Lava Jato, que culminou com a prisão de dezenas de pessoas nos últimos anos.

Votaram contra a tese lavajatista da república de Curitiba os ministros Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Rosa Weber e Celso de Mello.

Do outro lado, é claro, o núcleo duro da Lava Jato no STF, Edson Fachin, Luis Barroso e Luiz Fux. A ministra Cármem Lúcia ficou a meio termo, defendendo a tese, mas com definições a serem estabelecidas a cada caso.

O julgamento decorre de  um habeas corpus envolvendo o ex-gerente da Petrobrás, Márcio de Almeida Ferreira, condenado pela 13ª vara criminal federal de Curitiba, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Ele pediu a anulação da sentença com base no julgamento do ex-presidente da Petrobrás, Aldemir Bendine, que ocorreu em agosto, perante a 2ª Turma, anulando a sentença do então juiz Sérgio Moro. 

Esse julgamento com certeza vai repercutir em, pelo menos, 32 sentenças proferidas no âmbito da Lava Jato, que sempre concedia o mesmo prazo para alegações finais de todos os réus, delatados ou delatores.

O princípio da ampla defesa orienta que os acusados falem depois da acusação e, nesses casos, os delatores funcionam evidentemente como linha auxiliar do Ministério Público, órgão acusador.


Magistrados que acolheram a tese pelo país afora poderão ter suas decisões revistas, uma vez que o julgamento. O pesadelo para os lavajatistas pode ser maior, uma vez que o julgamento de hoje pode, pelos mesmos motivos, beneficiar Lula e Zé Dirceu.

A Lei de Abuso de Autoridade sobreviveu pelo acaso do destino


Na terça-feira (dia 24), o Congresso Nacional derrubou os 18 vetos do Bolsonaro ao projeto de lei sobre o abuso de autoridade. O projeto tinha sido sancionado no início de setembro, após um acordo de líderes que incluía o PSL.

Os vetos do presidente da república foram considerados uma violação ao acordo celebrado entre as lideranças dos partidos da base de sustentação do governo, para princípio de conversa.

Depois, um episódio mais recente desandou o caldo, quando uma decisão do Ministro Barroso autorizou uma busca e apreensão no gabinete do líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (PMDB-PE).

O Senado recorreu da decisão, proferida inclusive contra parecer da procuradoria geral da República, e houve mobilização dos parlamentares que se reuniram às pressas com o Ministro Dias Toffoli, adiando até a reforma da previdência.

Os Lavajatistas, vejam só, meteram os pés pelas mãos justamente nas prévias de uma votação importante para a sanha punitivista, atrapalhando tudo. A classe política de modo geral entendeu a decisão do Ministro do STF como exemplo típico de abuso que precisaria ser contido.

Graças à burrada de Barroso e companhia, a Lei de Abuso de Autoridade sobreviveu à trama jurídico-midiática e constitui hoje um importante marco de contenção do arbítrio no país.

A Globo, é claro, anunciou a derrubada dos vetos ouvindo apenas lavajatistas, a nova corrente do pensamento jurídico-corporativista do país. Quem ouve essa turma pode até acreditar que seja impossível combater o crime sem violar as garantias individuais mínimas do cidadão.

A periferia, a favela, os acampados e os pobres de modo geral agradecem ao Sr. Ministro Barroso e seus colegas de desatino.

Depois da derrubada, são enquadráveis como crime de abuso de autoridade:

Decretar medida de privação da liberdade (prisão, por exemplo) de forma expressamente contrária às situações previstas em lei – pena de um a quatro anos de detenção;

Decretar a condução coercitiva de testemunha ou investigado manifestamente descabida ou sem prévia intimação de comparecimento ao juízo – pena de um a quatro anos de detenção;

Deixar injustificadamente de comunicar prisão em flagrante à autoridade judiciária no prazo legal – pena de seis meses a dois anos de detenção;

Constranger o preso ou o detento, mediante violência, grave ameaça ou redução de sua capacidade de resistência, a: exibir-se ou ter seu corpo ou parte dele exibido à curiosidade pública; ou submeter-se a situação vexatória ou a constrangimento não autorizado em lei – pena de um a quatro anos de detenção;

Constranger a depor, sob ameaça de prisão, pessoa que, em razão de função, ministério, ofício ou profissão, deva guardar segredo ou resguardar sigilo – pena de um quatro anos de detenção;

Deixar de identificar-se ou identificar-se falsamente ao preso por ocasião de sua captura ou quando deva fazê-lo durante sua detenção ou prisão – pena de seis meses a dois anos de detenção;

Submeter o preso a interrogatório policial durante o período de repouso noturno, salvo se capturado em flagrante delito ou se ele, devidamente assistido, consentir em prestar declarações – pena de seis meses a dois anos de detenção.

Impedir ou retardar, injustificadamente, o envio de pleito de preso à autoridade judiciária competente para a apreciação da legalidade de sua prisão ou das circunstâncias de sua custódia – pena de um a quatro anos de detenção;

Impedir, sem justa causa, a entrevista pessoal e reservada do preso com seu advogado – pena de seis meses a dois anos de detenção;

Manter presos de ambos os sexos na mesma cela ou espaço de confinamento – pena de um a quatro anos de detenção;

Invadir ou adentrar, clandestina ou astuciosamente, ou à revelia da vontade do ocupante, imóvel alheio ou suas dependências, ou nele permanecer nas mesmas condições, sem determinação judicial ou fora das condições estabelecidas em lei – pena de um a quatro anos de detenção;

Inovar artificiosamente, no curso de diligência, de investigação ou de processo, o estado de lugar, de coisa ou de pessoa, com o fim de eximir-se de responsabilidade ou de responsabilizar criminalmente alguém ou agravar-lhe a responsabilidade – pena de um a quatro anos de detenção;

Constranger, sob violência ou grave ameaça, funcionário ou empregado de instituição hospitalar pública ou privada a admitir para tratamento pessoa cujo óbito já tenha ocorrido, com o fim de alterar local ou momento de crime, prejudicando sua apuração – pena de um a quatro anos de detenção;

Proceder à obtenção de prova, em procedimento de investigação ou fiscalização, por meio manifestamente ilícito – pena de um a quatro anos de detenção;

Requisitar instauração ou instaurar procedimento investigatório de infração penal ou administrativa, em desfavor de alguém, à falta de qualquer indício da prática de crime, de ilícito funcional ou de infração administrativa – pena de seis meses a dois anos de detenção.

Divulgar gravação ou trecho de gravação sem relação com a prova que se pretenda produzir, expondo a intimidade ou a vida privada ou ferindo a honra ou a imagem do investigado ou acusado – pena de um a quatro anos de detenção;

Prestar informação falsa sobre procedimento judicial, policial, fiscal ou administrativo com o fim de prejudicar interesse de investigado – pena de seis meses a dois anos de detenção;

Dar início ou proceder à persecução penal, civil ou administrativa sem justa causa fundamentada ou contra quem sabe inocente – pena de um a quatro anos de detenção;

Estender injustificadamente a investigação, procrastinando-a em prejuízo do investigado ou fiscalizado – pena de seis meses a dois anos de detenção;

Negar ao interessado, seu defensor ou advogado acesso aos autos de investigação preliminar, ao termo circunstanciado, ao inquérito ou a qualquer outro procedimento investigatório de infração penal, civil ou administrativa, assim como impedir a obtenção de cópias, ressalvado o acesso a peças relativas a diligências em curso, ou que indiquem a realização de diligências futuras, cujo sigilo seja imprescindível – pena de seis meses a dois anos de detenção.

Exigir informação ou cumprimento de obrigação, inclusive o dever de fazer ou de não fazer, sem expresso amparo legal – pena de seis meses a dois anos de detenção;

Decretar, em processo judicial, a indisponibilidade de ativos financeiros em quantia que extrapole exacerbadamente o valor estimado para a satisfação da dívida da parte e, ante a demonstração, pela parte, da excessividade da medida, deixar de corrigi-la – pena de um a quatro anos de detenção;

Demorar demasiada e injustificadamente no exame de processo de que tenha requerido vista em órgão colegiado, com o intuito de procrastinar seu andamento ou retardar o julgamento – pena de seis meses a dois anos de detenção;

Antecipar o responsável pelas investigações, por meio de comunicação, inclusive rede social, atribuição de culpa, antes de concluídas as apurações e formalizada a acusação – pena de seis meses a dois anos de detenção.

domingo, 25 de agosto de 2019

Cajueiro pós-despejo

O despejo do Cajueiro produziu desdobramentos.

Uma onda de crítica na internet contra o governo, protestos, e uma ocupação da Sedhipop, na sexta-feira (dia 23).

Ontem e hoje, reuniões ocorrem na Casa Civil e talvez acertem o caminho da Secretaria de Desenvolvimento Industrial.

Tudo isso era para ter ocorrido há mais tempo e esperamos que não estejam apenas ganhando tempo.

Quantas audiências e reuniões ocorreram no momento em que a Secretariam de Meio Ambiente se preparava para conceder o licenciamento do Empreendimento?

Quantos apelos foram feitos no sentido de que era necessário, da parte do governo, mais iniciativa e menos posturam contemplativa?

É estranho constatar nesse governo a mesma postura do então governador João Castelo, por ocasião da implantação da Alcoa, quando várias comunidades foram compulsoriamente deslocadas em nome da geração de um punhado de empregos.

Quem não se lembra da chegada da Estrada de Ferro Carajás, do processo de implantação do Porto do Itaqui e seus impactos sobre as comunidades de pescadores, que até hoje esperam por justiça, onde foram jogados numa vila nas proximidades do Tamancão?

Como o governador Flávio Dino se deixou levar pela mesma cantilena do desenvolvimento industrial sem limites, igualando-se às experiências fracassadas de ditadores provincianos?

O que está em jogo é muito mais do que um porto privado e seus bilhões, mas o destino do povo brasileiro para os próximos vinte anos, caso o programa do facismo se estabeleça.

Nesse sentido, é bom que a alternativa se apresente como algo melhor do que o status quo. 

Parcerias com a China agradam mais aos olhos de bolsonaristas, vejam o exemplo do debate envolvendo queimadas na Amazônia, onde o embaixador chinês vislumbra no caso apenas um complô de países capitalistas ciosos por intervir no Brasil - um discurso alinhado com o que existe de mais atrasado em matéria ambiental.

Será que é só isso mesmo ou a Amazônia significa um pouco mais para a humanidade do que o plantio de capim para engordar o gado?

Cajueiro é mais do que um porto privado, governador. Cajueiro é a possibilidade de criação de uma Reserva Extrativista que poderia contribuir para a sustentabilidade da ilha, resguardando direitos e serviços ambientais para futuras gerações. 

Isso não seria estratégico, num futuro e certo cenário de esgotamento das nossas riquezas minerais?









segunda-feira, 12 de agosto de 2019

O DESPEJO NO CAJUEIRO


Houve o despejo do Cajueiro, hoje, dia 12 de agosto.

Desde o início da manhã um batalhão de policiais se deslocou até o povoado, para efetivar a reintegração de posse, em favor da empresa portuária WPR São Luís Gestão de Portos e Terminais Ltda, intitulada, atualmente, de Tup Porto São Luís S.A.

O objetivo da decisão judicial era remover 28 famílias da área, consideradas pelo juiz da vara cível como invasores recentes.

Não é o primeiro despejo forçado da comunidade. Em 2014, a empresa demoliu 19 casas às vésperas do natal de 2014, sem decisão judicial.

Como já dito aqui, a área foi titulada em 1998, em favor da comunidade, após processo de regularização fundiária amplamente divulgado. Nunca nenhum pretenso proprietário havia se manifestado contra a ação fundiária do ITERMA.

Somente em 2014, a Empresa aparece em cena ostentando um título de propriedade incidente sobre o assentamento.

O órgão de terras não reconhece o título da Empresa, mas a Secretaria de Meio Ambiente do Estado concedeu o licenciamento ambiental.

Por sua vez, o Poder Judiciário reconheceu a posse da Empresa por intermédio do título de propriedade.

Na decisão judicial mais recente, a Empresa alegou "invasões" recentes, suscitando um debate que seria desnecessário se a área do assentamento tivesse sido respeitada.

Hoje, o governo do Estado se posicionou por intermédio de nota:

"NOTA
12/08/2019

Sobre a decisão judicial de reintegração de posse na comunidade Cajueiro, zona rural de são Luís, o Governo do Maranhão informa que:

1) trata-se de cumprimento de determinação judicial pela reintegração de posse. Há 28 posses diretamente afetadas, dentre imóveis habitados e não habitados;

2) a Secretaria de Direitos Humanos realizou processo de mediação com o Ministério Público, Defensoria Pública e as partes, a fim de contribuir com a construção de uma solução dialogada;

3) após a atuação da Secretaria, chegou-se à proposta de reassentamento de todas as famílias que residem no local, pagamento mensal de aluguel social e cestas básicas e proposta de capacitação e emprego de um membro de cada família;

4) esgotado o processo de mediação, cabe ao Estado cumprir a determinação judicial.

Secretaria da Comunicação Social e Assuntos Políticos do Governo do Estado do Maranhão"


O Detalhe é que o esforço de mediação foi relâmpago, sem o tempo necessário para que a comunidade pudesse debater e se orientar tecnicamente sobre a tal proposta de acordo.

Um reunião extraordinária da COECV (Comissão de Combate à Violência no Campo) foi convocada, mas as entidades da sociedade civil que acompanhavam juridicamente o Cajueiro não puderam comparecer.

Várias solicitaram nova data, na mesma semana, mas a reunião foi mantida, para atender as exigências da Empresa.

A proposta foi debatida, mas repleta de detalhes mal esclarecidos, os advogados dos moradores e a própria defensoria pública tiveram acesso à mesma, somente no dia da reunião extraordinária.

Sem conseguir esgotar os termos do acordo, a SEDHIPOP, contrariando a opinião de vários membros da COECV considerou esgotado o processo de mediação, comunicando imediatamente ao Comando da Polícia Militar, num dos mais rápidos processos de mediação da história da comissão.

O Comando da Polícia Militar, por sua vez, após receber o comunicado da COECV, ainda teria que seguir o Manual de Diretrizes Nacionais para Execução de Mandados Judiciais de Manutenção e Reintegração de Posse Coletiva, que estava sendo cumprido pelo governo, até então.

Inexplicavelmente, o Comando da Polícia Militar rasgou a norma da Ouvidoria Agrária (um documento caro para os  movimentos sociais ligados à terra) e efetivou o despejo, sem sequer notificar os moradores acerca de hora e data do cumprimento do ato judicial.

O Manual é claro, nesse sentido:


"A autoridade policial responsável comunicará o cumprimento da medida judicial aos trabalhadores, ao requerente e aos demais envolvidos com antecedência mínima de 48 horas. 
A comunicação deverá conter: I – a comarca, o juízo e a identificação do processo em que foi determinada a medida; II – o número de famílias instaladas na área a ser desocupada; III – a data e a hora em que deverá ser realizada a desocupação; IV – a identificação das unidades policiais que atuarão no auxílio ao cumprimento da ordem judicial. "

Todos os procedimentos preparatório ao despejos também foram ignorados e não se confundem com o Decreto do Governo que orienta a atuação da COECV.

Os moradores do Cajueiro ainda tentam saber quem os enganou. Se foi o PCdoB de 1998, aliado da família Sarney, que indicou um filiado na época para presidir o ITERMA e concedeu títulos ilegítimos a várias comunidades do interior da Ilha; se é o PCdoB atual, que nega legitimidade a um título de propriedade concedido regularmente por um órgão de terras simplesmente para favorecer a Empresa Portuária.

Alguém está mentindo nessa história.



quinta-feira, 8 de agosto de 2019

CAJUEIRO É UM NÓ PARA O GOVERNO


O povoado Cajueiro, uma comunidade tradicional do interior da Ilha, novamente entra na pauta dos conflitos fundiários do Estado, sem solução.

Uma decisão judicial autoriza o despejo de moradores, apontados como invasores recentes da área, um antigo assentamento do ITERMA, titulado ainda em 1998.

Os moradores estão novamente sob a perspectiva de mais uma violência fundiária, promovida pela WPR São Luís Gestão de Portos e Terminais. Essa empresa tem tem como acionista majoritária a empreiteira W/Torre, que contribuiu com a campanha do atual governador, Flávio Dino.

A situação é incômoda, porque, antes de tudo, a Secretaria de Meio Ambiente do Estado - SEMA, concedeu a licença ambiental para a WPR, ignorando a existência do assentamento.

De outro lado, a Procuradoria do Estado, jamais se pronunciou sobre o título condominial emitido pelo órgão de terras. O fato é estranho porque o título de terras de Cajueiro foi emitido juntamente com vários outros, beneficiando várias comunidades do interior da Ilha.

No âmbito do Poder Judiciário, vários processos tramitam desvelando um litígio de várias dimensões: culturais, ambientais e sociais.

Embora não haja nada conclusivo acerca da legitimidade do título de propriedade da empresa, ela continua operando livremente e já suprimiu quase toda a cobertura florestal da área, já comprou posses e continua negociando e ameaçando os moradores, como se dona fosse do local.

A repercussão do conflito é péssima para o governo, que se apresenta como contraponto à virada conservadora no país.

Cajueiro exige um tratamento adequado, sob pena de os tratores da WPR levarem de rodo a imagem progressista do governador perante a opinião pública nacional.

segunda-feira, 29 de julho de 2019

Bolsonaro ataca a memória do pai do presidente da OAB

Se o presidente da república fala nesse tom do pai do presidente da OAB, imagine.
Ele disse que sabia porque o pai de Felipe Santa Cruz havia sido morto pelo regime militar, algo que está sendo investigado há mais de quarenta anos.
Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira era pai do atual presidente da OAB Nacional, Felipe Santa Cruz, que desapareceu na ditadura, porque militava em um dos vários grupos de guerrilha que resolveram pegar em armas para resistir contra o regime.
Na cabeça de Jair Bolsonaro resistir contra a ditadura militar seria algo muito condenável.
De outro lado, o assunto veio à tona para atacar a OAB. Aí o presidente ataca toda a advocacia - porque se trata de questão envolvendo prerrogativas dos advogados.
Desconheço qual presidente de OAB não adotaria a mesma postura, sob pena de cair em desgraça perante seus pares.
Em março, o desembargador do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) Néviton Guedes atendeu a pedido do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (CFOAB) e da OAB de Minas Gerais e suspendeu apurações sobre a suposta participação do advogado Zanone Manuel de Oliveira Júnior, que defendeu Adélio, no atentado contra o presidente.
Em dezembro, sob justificativa de tentar identificar quem estaria financiando a defesa do autor do atentado, a PF em Minas Gerais cumpriu dois mandados de busca e apreensão em endereços ligados ao advogado.
Foram apreendidos na ocasião livros caixa, recibos e comprovantes de pagamento de honorários e de seu aparelho telefônico.
Na ocasião, OAB interviu contra a ação arbitrária da PF em defesa de prerrogativas da advocacia, conforme a proteção conferida pelo Estatuto da OAB (uma lei federal).
Bolsonaro não compreende o que significa Justiça de Transição nem muito menos prerrogativa de advogados.
Esse é o presidente da república que nós temos. É o mesmo que acabou de falar que a defesa da Amazônia só interessa aos veganos. Uma pérola em cima da outra.

quarta-feira, 10 de julho de 2019

Nova audiência pública sobre o acordo brasil-EUA: a nova retórica do consenso compulsório

É triste ver pessoas e governos de esquerda tergiversando sobre o acordo de salvaguardas tecnológicas Brasil-EUA.

Os artifícios de retórica são inúmeros, para justificar o alinhamento a uma concepção de desenvolvimento, um consenso disfarçado para aderir ao utilitarismo.

O desenvolvimentismo sempre uniu a direita e amplos setores da esquerda, nessa cruzada de acumulação perpétua. Resta evidente que ele fornece guarida para essas acrobacias verbais que justificam o sacrifício dos quilombolas em favor dos milhões de dólares canalizados pela indústria aeroespacial.

Uma dessas armadilhas é o jogo de palavras consistente em dizer-se que ninguém é contra o Acordo de Salvaguardas Tecnológicas (AST).

A outra consiste na separação entre AST e cessão da base espacial para atividades comerciais de lançamento de foguetes, como se fossem coisas completamente distintas e separadas uma da outra.

Fazem longas digressões afirmando que é necessário dar uma utilidade lucrativa para uma base espacial obsoleta e sub-utilizada e que isso por si só justificaria a tramitação do acordo no Congresso, com seus inúmeros e cansativos debates.

Juntam-se nesse ponto de vista perverso esquerda e direita. A esquerda floreando o palavreado, fazendo sinalizações pontuais para uma eventual solução da dívida social histórica, juntamente com o debate do AST. A direita faz ouvidos moucos e vai tocando o acordo assim mesmo.

O acordo é a ponta de lança para os novos deslocamentos. Os militares já deram um novo nome para disfarçar a violência fundiária: "consolidação". Eles já anunciam que vão avançar e expandir a base para o litoral até atingir mais vinte mil hectares, varrendo povoados e uma população de cerca de setecentos quilombolas.

Quando vai se concretizar a tragédia pouco importa. Somente na cabeça de um burocrata de governo reacionário ser expulso de sua casa é questão secundária. As comunidades de Alcântara estão há quarenta anos atormentadas com a perspectiva de novos despejos.

Se alguém diz que o despejo não será para agora o efeito é o mesmo, porque implicitamente está dizendo que vai haver despejo e que o território nunca será dos quilombolas.

Setores da esquerda esquecem que a direita joga esse tipo de isca para pescar os incautos. Se o acordo for aprovado não haverá solução para a questão quilombola.

A oposição ao governo Bolsonaro deve aproveitar o momento para estabelecer como condição pra aprovação do acordo a solução prévia do impasse fundiário.

Se o governo estivesse agindo de boa fé já teria titulado a área, porque todo esse trabalho fundiário já foi efetuado pelo INCRA, sendo que as terras já são públicas e federais.

Portanto, chega de passar o pano, é preciso dizer em alto e bom som que nestas condições SOMOS CONTRA O ACORDO BRASIL-EUA.

Essa tramitação deveria ser suspensa até que a questão do território quilombola fosse resolvida definitivamente.

Os quilombolas vão invocar o ordenamento jurídico nacional e internacional para impedir qualquer deslocamento, com ou sem aprovação do acordo, isso é uma certeza.

segunda-feira, 3 de junho de 2019

O DESASTRE AMBIENTAL DE UM GOVERNO RURALISTA


O governo Bolsonaro demonstrou desde o primeiro dia sua rejeição às políticas ambientais. Pudera, cercado de terraplanistas e negacionistas do clima, não poderia dar outra.

Logo de cara a pasta ambiental perdeu a Agência Nacional das Águas para o Ministério da Integração Nacional. O Serviço Florestal Brasileiro foi entregue para o Ministério da Agricultura (dos ruralistas), sob o comando de Valdir Colatto (MDB/SC).

Como não poderia deixar de ser, Colatto é um colecionador de barbaridades ambientais na sua trajetória de deputado. É um crítico do percentual de áreas verdes em propriedades rurais, conforme reza a cartilha da bancada ruralista. Quando exercia o mandato de deputado federal, apresentou projetos de lei que regulamentavam a caça de animais silvestres e alterações nas demarcações de terras indígenas.

Para não deixar por menos, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, anunciou a revisão de todas as 334 Unidades de Conservação do país, desde o Parque Nacional de Itatiaia (criado em 1934) até o Refúgio da Vida Silvestre da Ararinha Azul (criado em 2018). Para ele, as unidades foram feitas "sem critério técnico", e poderão ter os traçados revistos ou serem até extintas. Essa sempre foi também uma aspiração da bancada ruralista, que quer transformar tudo em pasto.

O filho do presidente da República, o Senador Flávio Bolsonaro (PSL/RJ) já apresentou um projeto de lei propondo simplesmente o fim das reservas legais, alegando o direito (pasmem!) constitucional de propriedade. Estudos indicam que se esse projeto for aprovado, a área desmatada poderia alcançar 167 milhões de hectares (maior que o estado do Amazonas). Isso equivale a 30% de toda a vegetação nativa do Brasil.

As multas aplicadas pelo IBAMA por desmatamento ilegal diminuíram sensivelmente no governo Bolsonaro. Foi o índice mais baixo dos últimos onze anos, representando uma queda de 34%. Alguns episódios retratam como o governo tem desestimulado a fiscalização, como aquele em que o Ministro do Meio Ambiente recriminou publicamente fiscais que destruíram equipamentos usados por criminosos para retirada de madeira ilegal de uma unidade de conservação no Pará.

O governo também criou os chamados "núcleos de concilliação", para analisar as multas ambientais aplicadas pelos fiscais de todo o Brasil, incluindo as que os infratores não reclamem do procedimento. É uma espécie de advocacia administrativa em favor de infratores ambientais!

Na semana passada o IBAMA divulgou nota informando que a fiscalização iria se deslocar para terras indígenas e unidades de conservação no sudoeste do Pará, região da Floresta Nacional do Jamanxim, contrariando o protocolo de sigilo e segurança do próprio Instituto. Além de alertar aos desmatadores, o aviso expôs os fiscais ao risco de serem alvos de ataques programados pelos criminosos.

Causou espécie também a pretensão do governo de transformar a Estação Ecológica de Tamoios (um refúgio de espécies marinhas) numa "Cancún" brasileira. O detalhe é eles querem fazer tudo por decreto e Constituição limita à lei específica qualquer alteração. Ou seja, o governo não compreendeu ainda como a CF regula a proteção das unidades de conservação no país. Já há um movimento em curso de ambientalistas em defesa da Estação Ecológica de Tamoios, criada em 1990, para atender dispositivo legal que determina que todas as usinas nucleares deverão ser localizadas em áreas delimitadas como estações ecológicas.

Localizada entre os municípios de Angra dos Reis e Paraty, a Estação tem o objetivo de preservar o riquíssimo ecossistema insular e marinho da Baía da Ilha Grande, bem como permitir o monitoramento de sua qualidade ambiental.

Foi no interior dessa mesma Unidade de Conservação que Jair Bolsonaro fora multado pelo IBAMA, flagrado em um barco com varas de pescar e outros petrechos de pesca. A multa foi aplicada pelo Chefe do Centro de Operações Aéreas da Diretoria de Proteção Ambiental do IBAMA, José Augusto Morelli. O episódio agravou o ranço do presidente contra políticas ambientais. Um ano depois de ser multado ele apresentou um projeto de lei na Câmara para desarmar os fiscais do IBAMA e do ICMBio. O projeto foi arquivado, contudo, depois da posse como presidente da República, o fiscal foi afastado do cargo.

Outro episódio que causou estupor: durante um evento organizado com o apoio de ruralistas do município de Tavares (RS), o Ministro Ricardo Salles ameaçou abrir procedimentos administrativos contra fiscais do ICMBio, pelo simples fato de os mesmos não estarem presentes no evento. Dois dias depois, o presidente do Instituto pediu demissão do cargo, em evidente ato de solidariedade aos colegas, que não foram convocados para o fatídico evento ruralista. E, diga-se de passagem, fiscais de órgãos ambientais geralmente não são bem-vindos. Em seguida, três outros diretores do ICMBio também pediram demissão.

Aproveitando a deixa, o Ministro Ricardo Salles exonerou pelo twitter um quarto diretor, reformulando totalmente o órgão, com as nomeações de policiais militares para os cargos vagos, sem nenhuma qualificação na área ambiental.

Não é uma novidade dizer que o governo Bolsonaro está infestado de pessoas que negam o aquecimento global. O primeiro deles é o próprio Ministro Ricardo Salles, para quem o tema é meramente acadêmico e não prioritário. Foi por isso que se recusou a sediar a COP-25, maior encontro climático do mundo. Salles chegou a anunciar o cancelamento da Semana do Clima da América Latina e Caribe (Climate Week), em Salvado, alegando que seria apenas uma oportunidade para as pessoas fazerem turismo em Salvador e comerem acarajé. Ocorre que o prefeito de Salvador é também presidente do DEM, e obrigou o Ministro a voltar atrás. O desgaste foi visível.

O coordenador executivo do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas foi exonerado por Salles, logo depois de organizar um evento na sede da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (FIRJAN), onde compareceram 12 governadores que se comprometeram a agir conjuntamente contra o aquecimento global.

O governo Bolsonaro cortou 95% da verba destinada às políticas ambientais. O Fundo Amazônia também está ameaçado. Noruega e Alemanha contribuem com 95% dos recursos que alcançam a cifra de 3 bilhões de reais. O Ministro convocou uma coletiva para criticar o modelo de gestão do projeto, provocando um incidente diplomático ainda não resolvido. Na verdade, Salles quer mudar o Comitê orientador do Fundo, elevando a participação do governo, para destinar parte dos recursos doados para pagar indenizações a proprietários rurais que intrusam unidades de conservação, um antigo anseio ruralista. Salles já afirmou que só publicará decreto retomando as atividades do Comitê quando houver "acordo com todas as partes", o que provavelmente não vai acontecer.

O arquipélago de Abrolhos agora está ameaçado, em razão da nova posição do Ministério do Meio Ambiente, que autorizou a realização de um leilão em outubro para a oferta de sete blocos de exploração de petróleo na região. Um parecer técnico do IBAMA alerta que qualquer incidente com derramamento de óleo, poderá atingir "todo o litoral sul da Bahia e a costa do Espírito Santo, incluindo todo o complexo recifal do banco de Abrolhos", mas foi solenemente desconsiderado pelo Ministério. No local existem cerca de 1,3 mil espécies da biodiversidade marinha, 45 delas consideradas ameaçadas.

E, por fim, o governo já anunciou que vai ressuscitar a MP 867 (aprovada na Câmara e "enterrada" pelo Senado na semana passada) que muda as regras do Código Florestal. As regras que o governo propõe beneficiam apenas 4% dos proprietários rurais do Brasil, que não cumprem a lei aprovada em 2012. Entre outras vantagens indevidas, não haveria mais a exigência de recompor matas e florestas que, somadas, equivaleriam a duas vezes o Estado de Sergipe.

O governo Bolsonaro já liberou 169 novos agrotóxicos, um recorde histórico no país. Desses, 26% não são permitidos na União Européia. Ninguém sabe o impacto da liberação dessas centenas de produtos ao meio ambiente e à saúde da população.

Três dos 31 registros mais recentes são de agrotóxicos que usam como base o glifosato , substância classificada pela OMS como potencial provocadora de câncer . Estudos recentes comprovaram a relação entre a substância e linfoma Não-Hodgkin. 

E assim, a lista das insanidades ambientais seguirá seu curso, até o final do mandato dos loucos reacionários. Antes se lutava apenas contra os reacionários.