Até este outubro de 2012, pelo menos outros 30 suicídios já ocorreram entre os índios Kaiowá e Guarani no Mato Grosso do Sul, segundo dados obtidos por Terra Magazine junto ao Conselho Indigenista Missionário, o CIMI, na região de Dourados.
Na segunda-feira, 22, abordamos aqui a tragédia dos indios Kaiowá e Guarani no Mato Grosso do Sul. No período entre 1986 e 1999 e, basicamente na região sul do Estado, 308 índios se suicidaram. Mais de 90% deles com idade variando entre 12 e 28 anos, enforcaram-se.
Relatório da SESAI (Secretaria Especial de Saúde Indígena, do Ministério da Saúde) traz dados oficiais: do ano 2000 até 2011, outros 555 Kaiowá-Guarani se suicidaram. No total, 863 mortos.
Em tempo: suicídio aos olhos e saber de culturas que não a dos Kaiowá-Guarani. Para eles, uma morte que ocorre em reação a agressões, à opressão, não deve, como nestes casos, ser encarada como "suicídio".
Os motivos para essa tragédia são muitos. Pesquisadores concordam em alguns pontos.
Uma das ações que define o modo de vida Kaiowá-Guarani é o "Tekoha". "Teko" significa "jeito de ser", "jeito de viver"; "ha" quer dizer "lugar". Os índios no Mato Grosso do Sul têm sido abrutalhados, confinados em espaços cada vez menores. Expulsos de suas terras por decisões judiciais, são mais forçados ainda a se misturarem com outras etnias e raças.
Numa escalada, têm sido cercados e mortos por pistoleiros a serviço de fazendeiros. Nos últimos anos, 12 lideranças foram assassinadas.
Expulsos de suas terras, os índios lutam pelo "Tekoha". Ou seja, o que os Kaiowá e Guarani querem é o "lugar onde viveram desde sempre", desde que existem. Estas são algumas das razões para as centenas de suicídios ao longo das três últimas décadas.
Há duas semanas, em um trecho de uma espécie de carta-testamento, os Kaiowá-Guarani rogaram:
- Pedimos ao Governo e à Justiça Federal para não decretar a ordem de despejo/expulsão, mas decretar nossa morte coletiva e enterrar nós todos aqui. Pedimos para decretar nossa extinção/dizimação total, além de enviar vários tratores para cavar um grande buraco para jogar e enterrar nossos corpos. Este é nosso pedido aos juízes federais.
No Mato Grosso do Sul, o que se tem em relação a essa tragédia, há décadas, são os atos, os fatos, e uma impunidade quase absoluta. Com a repercussão, reações do governo federal. A ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, disse num post em seu twitter:
- Estamos buscando um diálogo que preserve a vida e dignidade dos Kaiowá. As decisões judiciais sobre as terras têm dificultado ainda mais.
Disse ainda a ministra:
- Nossas equipes de Direitos Humanos e a Força Nacional estão junto aos Guarani-Kaiowá. Estamos atentos, preocupados sim, mas com encaminhamentos.
A conferir.
O fotógrafo Luciano Andrade e eu estivemos nas reservas/aldeias dos Kaiowá-Guarani em 1999. Eles estavam entregues à sua própria sorte, protegidos, secundados apenas pelo CIMI e por antropólogos, ou historiadores como Antonio Brant. Pelas informações obtidas por Terra Magazine neste outubro de 2012, a anunciada proteção a lideranças indígenas juradas de morte, por exemplo, inexiste.
Portanto, a se acompanhar e conferir anúncios feitos em época de crise e reações à crise e seus desdobramentos.
O Conselho Indigenista Missionário lançou uma nota nesta quarta-feira, 24. Aos mal informados, ou mal intencionados, o CIMI esclarece em um trecho da nota:
- Os índios não cometem nem falam em suicídio coletivo. Falam em morte coletiva no contexto da luta pela terra. Ou seja: se a Justiça e pistoleiros contratados pelos fazendeiros insistirem em tirá-los de suas terras tradicionais, eles estão dispostos a morrerem todos nelas, sem jamais abandoná-las. Vivos eles não sairão do chão dos antepassados.
Esse é o cenário da tragédia vivida pelos 43 mil sobreviventes dos povos Kaiowá e Guarani. Estes são alguns dos mais graves motivos para os suicídios chamados de "sansônicos". O que, traduzindo, quer dizer "suicídios de protesto".