domingo, 22 de maio de 2016

A lógica do golpe no sistema de segurança e nos presídios

As notícias são gravíssimas nos últimas dias, com ônibus sendo incendiados em vários bairros, provocando o recolhimento da frota, por três dias seguidos na Capital.

Mesmo com a grande mobilização da polícia e a intensificação das abordagens nas ruas, o clima de insegurança se alastrou.

Os episódios de violência na região metropolitana repõem a questão da presença das facções no sistema prisional, contrariando a eufórica propaganda governamental sobre um suposto controle dos presídios.

Não há mais como negar que não há controle algum sobre os presídios e que a política de segurança pública adotada não está articulada a um programa mais amplo de combate à violência, com prevenção e inteligência.

Também é preciso dizer: os ataques não estão relacionados a uma suposta ofensiva do governo contra as facções. Líderes das facções andam tranquilamente pelas ruas, sem qualquer monitoramento. Mensagens enviadas por celulares nos presídios não orientam investigações e planos emergenciais de segurança, tudo indica pela política adotada,  que hipertrofia o policiamento repressivo.

No momento em que escrevo essas linhas, mais um ataque a ônibus ocorre no Alto Turu, e 26 adolescentes infratores fogem da unidade de cumprimento de medida socioeducativa do Vinhais, causando novo pânico na população.

O governador já anunciou a vinda da Força Nacional de Segurança, no momento em que faccionados do Bonde dos Quarenta dão ordem para fechar o comércio no bairro do Coroadinho. Tal medida é anunciada hoje pelo mesmo grupo político que há dois anos atrás considerava a presença dessa força militar como simples confissão de incompetência local.

Ficamos tristes, não comemoramos a vitória dos fatos sobre a propaganda de governo. Não apenas a sociedade está perdendo, mas um campo político que deveria estar transformando a realidade do nosso Estado.

Não adianta lutar contra o golpe e reforçar a lógica do golpe. Dilma caiu exatamente por isso. Precisamos de uma concepção de segurança pública que supere a beligerância e a repressão, pura e simples. Essa é a lógica de polícia que está ao lado do golpe: seletiva, antidemocrática e repressiva. Ninguém elege governo de esquerda para continuar experimentando isso.

Desde o início do governo Dino temos notado o discurso facistóide do comando da Segurança Pública. Não avançamos nada em matéria de segurança pública preventiva, policiamento comunitário, participação e controle social do sistema de segurança. Apenas um arremedo da polícia de Alckmim, beligerante, violenta, impermeável aos movimentos de direitos humanos. O governo Dino aumentou incrivelmente os números da letalidade policial, direcionada especialmente aos mais pobres da periferia.

O mesmo ocorre na área prisional. Temos um secretário importado do governo mineiro de Anastasia, fechado em si mesmo, incapaz de dialogar com a sociedade civil, reproduzindo as mesmas mazelas do sistema prisional. O governo Dino anistiou servidores envolvidos com denúncia de corrupção e tortura, fazendo exatamente um movimento de retrocesso na gestão prisional.

De outro lado, tentou, contrariando a opinião das entidades de direitos humanos, vender a imagem de que a separação das facções criminosas por unidades prisionais teria sido obra sua. Aproveitando-se de uma trégua momentânea, quis afirmar uma autoridade inexistente sobre o sistema prisional, manejando números que demonstravam a baixa do número de mortes nas cadeias, resultado da simples separação das facções.

Tudo o mais no sistema prisional foi relegado ao segundo plano, com o abandono da política de ressocialização em larga escala, com o incremento da superlotação, com o agravamento das condições indignas de salubridade do cárcere de forma geral, além do reforço de situações de maus tratos e tortura.

As últimas decisões administrativas apenas cuidavam de restringir cada vez mais os direitos dos presos, tais como visitas de familiares, banho de sol e entrada de alimento. O governo foi gradualmente avançando sobre o limite do tolerável. Era de se esperar uma reação das facções.

A gota d'água ocorreu com a repressão que seguiu à morte do auxiliar penitenciário, no início de maio, na Vila Kiola. O cavalo doido foi solto, espalhando o pânico na cidade. E saber o que pretende o Bonde é mais difícil. Mas que o salve em andamento está relacionado aos presídios, isso está.

Não seria preciso dizer que não se combate organizações criminosas apenas com a força bruta e o discurso de guerra. Corpos deitados ao chão não deveriam orientar a melhor estratégia de defesa da sociedade, inspirada no birô de um ex-juiz com perfil supostamente progressista.

Hoje, podemos dizer de forma objetiva que a máscara caiu. Se o governo Flávio Dino quiser compor um projeto político de resistência contra a onda conservadora no país, deverá repensar o que faz na área da segurança pública e no sistema prisional. Estamos diante da mais pura e escancarada falta de sintonia entre o discurso e a prática.

sábado, 21 de maio de 2016

A Frente Povo Sem Medo em São Luís







A Frente Povo Sem Medo está se estruturando no Estado do Maranhão. Isso é bom, na conjuntura de retrocessos em que vivemos.

Nosso Estado está no coração da esquerda pós-golpe agora e precisa mais do que nunca reconfigurar um campo político de mudança para além do governo Flávio Dino, com a cara da esquerda autêntica, capaz de levar adiante as transformações estruturais que a sociedade brasileira necessita.

Com golpistas, não dá!





Seu primeiro ato de envergadura ocorreu ontem, dia 20 (sexta-feira) e contou com cerca de mil trabalhadores rurais vindos de cerca de 30 municípios do interior do Estado.

A Frente Brasil Popular esteve presente com alguns militantes, PT, PCdoB, CUT e CTB, especialmente. A presença majoritária era de militantes do PSOL e do movimento Redes e Fóruns de Cidadania.

A FPSM é o espaço crítico da esquerda para uma possível reconfiguração da resistência contra o neoliberalismo, diante da perda da capacidade de liderança política do PT.

O PSOL apoia essa Frente porque acredita que agora não se trata de defender o governo Dilma, mas de garantir a permanência da democracia, com os direitos já assegurados pela classe trabalhadora. O governo Temer consegue ser pior do que os governos do PT é já anuncia o pacote de retrocessos políticos, sociais e econômicos, cuja conta será jogada exclusivamente nas costas dos mais pobres.

O PT precisa ser superado agora, por seus erros e por suas ilusões em relação à direita brasileira. Mas o governo Temer também não terá trégua, até que a democracia se restabeleça no país.

As colunas de bandeiras amarelo e vermelho encheram as ruas do centro histórico de São Luís, durante toda a tarde da sexta-feira, encerrando o ato na escadaria da Biblioteca Pública Benedito Leite.

A mobilização conjugou o protesto contra a prisão dos trabalhadores de Anajatuba que lutam contra o cercamento ilegal dos campos naturais e a resistência contra o Governo Temer e suas primeiras medidas recessivas contra a classe trabalhadora.

O Poder Judiciário já decidiu soltar os 3 presos. Nesse sentido, mobilização também comemorou uma vitória parcial sobre a grilagem dos campos públicos. Quanto ao Temer, serão 180 dias de luta e quantos forem necessários até a vitória popular.








segunda-feira, 16 de maio de 2016

As lições da derrota e o que fazer doravante - Por Celso Lungaretti


O jornalista Bernardo Mello Franco é um dos muitos críticos do último governo do PT que veem consequências sinistras na queda de Dilma Rousseff: “A posse de Michel Temer deve marcar a mais brusca guinada ideológica na Presidência da República desde que o general Castello Branco vestiu a faixa, em abril de 1964. Após 13 anos de governos reformistas do PT, o país passa ao comando de uma aliança com discurso liberal na economia e conservador em todo o resto”.

Por um dever de coerência, todos que pretendemos contribuir para a emergência de uma sociedade que concretize os melhores anseios da humanidade através dos tempos – a justiça social e a liberdade – tivemos de repudiar o que o governo Dilma se tornou: responsável pela pior recessão brasileira da História e, desde janeiro de 2015, meramente neoliberal (ou seja, empenhado em corrigir suas lambanças anteriores à moda de Milton Friedman, sacrificando os explorados e os coitadezas ao invés de entregar a conta aos que sempre foram privilegiados demais, como os parasitas do sistema financeiro, os predadores ambientais do agronegócio, os detentores de grandes fortunas e os aquinhoados com grandes heranças).

Mas, a partir da descaracterização que a esquerda sofreu nas últimas décadas, isso significou ficarmos, os minimamente coerentes, na contramão dos muitos que passaram a considerar que a alternativa aos governos de direita fosse essa sopa aguada de populismo com reformismo que nos servia o Partido dos Trabalhadores.

Por mais bandeiras históricas que o PT depositasse no arquivo morto, por mais que o Lula candidamente admitisse que os grandes capitalistas nunca lucraram tanto quanto em seus dois governos, por mais esdrúxulas que fossem as alianças firmadas (e os abraços clicados) com vilões da laia de Paulo Maluf, José Sarney, Fernando Collor, Kátia Abreu, o falecido ACM, etc., ainda assim os petistas mais simplórios e os maria-vai-com-as outras da internet continuaram considerando que tal partido era a quintessência da esquerda e nós, que repudiávamos quaisquer dessas aberrações, direitistas enrustidos ou inocentes úteis.

Então, alguns colunistas da grande imprensa que se sentiam incomodados por estarem à margem do não vai ter golpe, mas percebiam que sem o impeachment este país marcharia para a depressão econômica e a explosão social, agora vão, aliviados, reconciliar-se com seus leitores mais desprovidos de espírito crítico, descendo o porrete em Temer e seu ministério.

Não será esta a minha opção. Os colunistas deste blogue, se quiserem, poderão marchar em tal direção, numa boa. Mas, como já me disseram, continuarei sendo um velho teimoso.

No primeiro texto personalizado que escrevi na minha longa trajetória política, em 1968, eu me alinhava firmemente com a revolução e repudiava o reformismo, apoiando-me na obra célebre de Rosa Luxemburgo. Quase meio século depois, minhas mais profundas convicções são exatamente as mesmas.

Acredito, basicamente, que:
o capitalismo já cumpriu seu papel histórico no desenvolvimento das forças produtivas e está tendo sobrevida cada vez mais parasitária, perniciosa e destrutiva –tanto que mantém a parcela pobre da humanidade sob o jugo da necessidade quando já estão criadas todas as premissas para o reino da liberdade, e o 1º mundo sob o jugo da competitividade obsessiva, estressante e neurótica, quando já estão criadas todas as premissas para uma existência fraternal, harmoniosa e criativa;
os meios de comunicação que ele desenvolveu, como a internet, facilitam a disseminação e coordenação dos movimentos revolucionários em escala mundial, de forma que um novo 1968, p. ex., hoje seria muito mais abrangente (está longe de ser utópica, agora, a possibilidade de uma onda revolucionária varrer o mundo, como previa e preconizava Marx);
a necessidade de adotarmos como prioridade máxima a colaboração dos homens para promover o bem comum, em lugar da ganância e da busca de diferenciação e privilégio, será dramatizada pelas consequências das alterações climáticas e da má gestão dos recursos imprescindíveis à vida humana, gerando crises tão agudas que só unidos e solidários conseguiremos sobreviver;
a forte componente libertária original do marxismo tem de ser reassumida, pois os melhores seres humanos, aqueles dos quais precisamos, jamais nos acompanharão de outra forma.

Em termos práticos, isso me leva a colocar como prioridade máxima, doravante, a construção de uma nova vanguarda, que não se limite a querer gerenciar o capitalismo para os capitalistas (en passant obtendo pequenas concessões para os explorados e garantindo consideráveis ganha-pães para seus dirigentes), mas lute pela transformação em profundidade da sociedade brasileira.

É hora de reaprendermos que a alternância no poder característica da democracia burguesa apenas significa que alguns governos imporão rigidamente a supremacia dos valores e interesses capitalistas, até as tensões sociais começarem a se tornar insuportáveis, quando serão substituídos por outros, menos impiedosos, que vão afrouxar os parafusos por algum tempo, até sobrevir uma grave crise econômica e as tensões sociais começarem novamente a se tornar insuportáveis, pavimentando o terreno para a volta da austeridade e do conservadorismo.

Ou seja, a perspectiva é de uma eterna gangorra. Então, se apenas desconstruirmos o governo ruinzinho que começa, levando água para o moinho dos que almejam só trazer de volta em 2018 o governo bonzinho (com o jogo de cintura do Lula no lugar da incompetência e autoritarismo de Dilma Rousseff), contribuiremos para a sociedade brasileira continuar patinando sem sair do lugar.

Temos de avaliar a retomada de alguns valores dos quais nunca deveríamos ter abdicado:

- a colocação da esquerda como alternativa ao Estado burguês e não como seu penduricalho, empenhada em substituí-lo e não em retocar sua maquilagem sem extirpar sua desigualdade intrínseca;

- como consequência, sairmos dele, passarmos a combatê-lo de fora para dentro e a organizarmos nossas forças à margem do Estado e contra o Estado (prescindindo, inclusive, das boquinhas e das verbinhas governamentais, pois o preço da autonomia política é a independência financeira e nada há de errado em sustentarmos nossas organizações e atividades com rifas, eventos, vendas de artigos e contribuições solidárias, como fazíamos outrora); e

- voltarmos a encarar as lutas reivindicatórias e as segmentadas (movimento negro, bandeiras ambientais, feminismo, LGBT, etc.) não como finalidades em si, mas como parte da acumulação de forças para o confronto decisivo com o capitalismo, que é o que realmente definirá se viveremos numa sociedade livre das injustiças, iniquidades e preconceitos.

Ou, até se, meramente, sobreviveremos. Pois, em seus estertores, o capitalismo ameaça destruir os próprios requisitos da existência humana.

* Celso Lungaretti é jornalista, escritor e ex-preso político. Edita o blogue Náufrago da Utopia.

Nocaute - Por André Singer

IHU

O lulismo estava nas cordas desde a quinta-feira, 27 de novembro de 2014, em que a presidente reeleita anunciou que havia decidido entregar a condução da economia do país ao projeto austericida que condenara na campanha eleitoral. Um ano e meio depois, na aurora de anteontem (12), o exausto lutador caiu. Ao afastar Dilma Rousseff da Presidência por 55 a 22 votos, o Senado encerrou talvez uma das lutas mais dramáticas – embora perca para a de 1954 – da história democrática brasileira.

Haverá ainda prorrogação, mas só um milagre reverterá o jogo no espaço senatorial em que se fará o julgamento dos inexistentes crimes da mandatária afastada. Um bloco partidário e social comandado pelo PMDB se formou para isolar, desmoralizar e, caso possível, extinguir o arco de forças comandado por Lula. O lulismo não morreu, mas talvez sejam necessários anos para reconstruir as condições de disputa perdidas na manhã da quinta passada (12).

Pois embora o fator econômico tenha sido decisivo, não se tratou da mera derrocada de um governo associado a desemprego, inflação e queda da renda. Foi também o resultado das revelações e da manipulação da Mãos Limpas nacional, conhecida como Lava Jato. Dilma subestimou o tamanho dessas duas encrencas, que apareceram com nitidez no último ano do seu primeiro mandato.

Se a antiga ministra da Casa Civil tivesse percebido a força da coalizão capitalista consolidada em torno do ajuste recessivo assim como o potencial que a delação premiada traria à investigação na Petrobras, o mais racional era ter entregue a recandidatura a Lula. O ex-presidente reunia melhores condições para o pugilato de pesos-pesados.

Só o tempo dirá em que ponto do percurso Sergio Moro, Deltan Dallagnol e outros personagens das investigações resolveram colocar a bomba atômica que controlavam a serviço da demolição do lulismo. De toda maneira, em março deste ano, quando o juiz curitibano fez a condução coercitiva de Lula e a divulgação do diálogo deste com Dilma, ficou claro que já não havia isenção.

Independentemente das falhas de avaliação de Dilma, o lulismo foi incapaz de oferecer uma narrativa coerente sobre a avalanche de acusações formuladas pelo Partido da Justiça sediado em Curitiba. De outro lado, a mídia estimulou um clima de caça às bruxas decisivo para cimentar a maioria que deu suporte ao golpe parlamentar.

Com a traumática derrubada do lulismo, interrompe-se mais uma vez a tentativa — no fundo a mesma de Getúlio Vargas — de integrar os pobres por meio de uma extensa conciliação de classe. Venceu de novo a forte resistência nacional a qualquer tipo de mudança verdadeiramente civilizatória. Mesmo a mais moderada e conciliadora.

terça-feira, 10 de maio de 2016

A PRESEPADA DE WALDIR




Durou menos de 24 h a decisão de Waldir Maranhão. Ele pretendia anular a sessão da Câmara que decidiu pela admissibilidade do impeachment da Presidenta da República. Nem teve tempo de atualizar suas redes sociais, que continuam a divulgar a decisão anterior.

Waldir Maranhão não resistiu à fuzilaria da direita, mesmo sendo direita. Era aliado de Cunha e foi eleito pelo PP para vice-presidência da Câmara por uma articulação conservadora. Nem assim foi digno de piedade, tal a sede pela deposição da Presidenta Dilma.

Eduardo Cunha, que se deu ao luxo de criticar a decisão de Waldir, seu ex-aliado, passou nada menos do que quinze meses como presidente da Câmara, com um currículo criminal digno de dar inveja aos mafiosos, sem receber o mesmo tratamento.

A vida pessoal de Waldir Maranhão foi devassada, sua família foi retaliada, numa crescente violência moral, jamais vista. E nem voltando atrás poderá conter um movimento para o seu afastamento da vice-presidência na Câmara ou até a mesmo para a perda do seu mandato. 

Waldir Maranhão, presidente interino da Câmara, não foi certamente o único a transformar  o país numa república de bananas. Mas os golpistas se anistiam mutuamente.

A ampla coalizão pelo impeachment demonstrou sua força no tecido social, combinando hegemonia institucional, controle da mídia e pressão nas mídias sociais. Waldir está sendo imolado, não esperava ficar sozinho no campo de bombardeio.

A decisão de Waldir só teria sentido se o presidente do Senado devolvesse o processo para a Câmara. Mas algo deu errado e Renan Calheiros pulou fora. Os governistas ficaram com o grito de gol entalado na garganta.

Acuado, ele recuou na madrugada, incompatibilizando-se com os dois campos políticos. Deixou o governador Flávio Dino em situação delicada, no momento em que já colhia os louros pelo aborto do impeachment. 

Por solidariedade ao projeto petista ou por instinto de preservação da própria pele, o Governador do Maranhão teve a coragem de enfrentar o golpismo. Se Waldir Maranhão perder o mandato, Dino terá a obrigação moral de acomodá-lo em algum lugar do governo estadual, embora a trajetória desse provável exilado político não recomende esse tipo de solidariedade. 

segunda-feira, 9 de maio de 2016

A esquerda para além do petismo



O artigo de José Antonio Lima — publicado em 06/05/2016 13h10, em Carta Capital, é bom, como análise de conjuntura. Está intitulado "A Esquerda precisa superar o PT".

Ele fala a respeito do chamado "pacote de bondades" da Dilma, nas duas últimas semanas de mandato. De fato, o eleitorado progressista não votou por duas semanas de governo.

Dilma destravou a reforma agrária e o Minha Casa Minha Vida Entidades, destinou novas áreas a comunidades quilombolas, homologou demarcações de terras indígenas, aumentou recursos para o Pronaf, liberou recursos para a promoção da igualdade racial e assinou decreto que permite o uso do nome social em crachás por servidores LGBT.

Apesar da limitações crônicas, como Belo Monte, e da cagada envolvendo o decreto que reestrutura o programa Defensores de Direitos Humanos, o Governo Dilma parece identificar bem o que é pauta progressista quando quer. 

O partido parece que se afastou de sua base social por acreditar que ela não vai se descolar dele, por falta de alternativa. Tem consciência de que abriu mão das reformas estruturais e promoveu um modelo de desenvolvimento para as elites, inviável do ponto de vista social e ambiental.

Resta saber se o cataclisma que vem por aí vai deixar as esquerdas de novo orbitando em torno do PT ou se vamos conseguir ir além do petismo puro e simples, sem sermos antipetistas, reunindo forças capazes de fazer a autocrítica e reafirmar algumas conquistas sociais do petismo.

Golpe e contragolpe

O golpe não é questão de semântica. Pode ser até questão de hermenêutica (interpretação), mas não de semântica.

Eu acredito que estamos no cenário de um golpe, porque os motivos são oportunistas. A direita está se aproveitando da crise econômica e da seletividade do sistema de justiça para reverter a derrota de 2014. Os motivos alegados para a deposição do governo são artificiais, não refletem causas suficientemente graves para justificar um impeachment.

Dizer que é um golpe não significa defender o governo Dilma, como poderia ser óbvio. Procedimento de impeachment não é golpe. Isso está descrito na Constituição e na Lei. Até já foi detalhado em julgamento do STF. Mas procedimento não quer dizer motivo ou causa.


Se estamos insatisfeitos com os escândalos de corrupção onde se meteu o PT, deveríamos também estar insatisfeitos com os outros partidos que estão atolados até o pescoço nos mesmos escândalos. A indignação seletiva é típica da consciência golpista, porque antes de tudo é um tomada de posição ideológica.

Ideologia não quer dizer necessariamente militância partidária. Ela é uma visão de mundo. Isso explica porque os defensores do golpe falam menos dos crimes fiscais do que da corrupção do PT. E comemoram a cada de notícia de corrupção envolvendo o governo mas silenciam completamente quando o Cunha ou o Temer são envolvidos na mesma lama.

Defender o golpe também não é coisa propriamente da direita. Tem esquerda aceitando as razões desse golpe. Assim como tem gente filosoficamente de direita contra. O problema é que a direita brasileira no geral é facista, apoiou golpes militares, e, portanto, nem de longe raciocina com a democracia.

Eu diria que estamos dentro da construção de dois campos políticos que vão dividir águas no cenário político. Essa divisão talvez seja funcional para refazer um novo projeto de esquerda no Brasil.


Um governo de mentirinha

Flávio Dino, do PCdoB, foi eleito governador do Maranhão com 63,52% dos votos válidos. O candidato do grupo Sarney, Lobão Filho (PMDB) teve 33,69% desse percentual. No contexto da crise política atual, muito se fala de governo de conciliação de classes. No Maranhão, o movimento de Flávio Dino foi bem mais amplo: reuniu democratas e golpistas, como se poderia dizer no jargão ressentido de um setor da esquerda que reverencia o Lulismo.

Nas eleições de 2014, Dino subiu nos palaques dos golpistas Aécio, Eduardo Campos e Marina. Verdade que nesse tempo o impeachment era hipótese remota. Mas os muros que separam a direita e a esquerda brasileiras continuavam e continuam de pé.

A coligação, que reuniu PCdoB, PSB, PTC, PPS, PDT, PSDB, PP, PROS, Solidariedade, e, ainda de parte da Militância Petista, elegeu seis deputados federais, três de oposição ao governo Dilma: Eliziane Gama (PPS), Zé Reinaldo Tavares (PSB) e João Castelo (PSDB). Esses três últimos votaram votaram a favor do impeachment.

O vice-governador é Carlos Brandão (PSDB), tucano, integrante da bancada ruralista e o Senador eleito, foi Roberto Rocha (PSB), também de origem tucana e ruralista. Os dois também são golpistas, como se infere das posições de seus partidos. Terão voz e vez no futuro governo Temer.

A aliança pró Flávio Dino elegeu apenas 16 deputados estaduais. Hoje, o Governo Dino tem o presidente da Assembleia Legislativa e apenas quatro deputados efetivamente na oposição ao governo, conforme um pacto de governabilidade, orientado pela força de atração do Palácio. Não há nada de programático nisso, apenas fisiologismo puro.

O governo Dino é o governo Dilma piorado. Ainda está de pé porque é cedo. Todos os anúncios de melhorias desse governo são no mínimo questionáveis. A elefante pariu um ratinho de botica. Analise o que anda acontecendo na área da saúde, educação e segurança pública, só para começo, e verá.

A intensa troca de secretários é sinal de que o governo ainda não se encontrou. Não existe um programa coerente de governo. É tudo colcha de retalho e fragmentação, gestores debutantes, sem verniz político ou ideológico.

Em 2016, esse consórcio precisará urgentemente de um candidato a prefeito em São Luís, porque o Edvaldo já era. Esse é o primeiro sinal da derrocada. Se no contexto nacional a esquerda precisa ir além da experiência petista, aqui não será diferente com o PCdoB.

sábado, 7 de maio de 2016

O Lulismo como equívoco do PT



No cenário da crise, alguns textos me chamam enormemente a atenção.

O primeiro, o de Rudá Ricci, no seu blogue. Ele trabalha com alguns conceitos importantes, como "campo popular-democrático", que ele inteligentemente diferencia do "campo das esquerdas". Ele diz:

"Chega o momento de começarmos a dividir o joio do trigo no campo das esquerdas e, também, popular-democrático.O campo popular democrático nem sempre é declaradamente de esquerda, mas por defender direitos civis e sociais, se afasta – e até refuta – do campo liberal-conservador. Daí não grafar democrático-popular para não gerar confusões.

Não se trata, portanto, de um campo desarticulado ou amorfo, desorganizado, mas amalgamado a partir de organizações populares, envolvendo lutas por habitação popular, saúde pública de qualidade, mobilidade urbana, direitos civis (gays, mulheres, étnicos, entre outros) e até experimentações culturais."

Esses dois campos, segundo ele, apenas se aproximam, mas não se sobrepõem. Nem sempre o popular-democrático é esquerda, servindo como exemplo a vertente do chamado "Lulismo".

A reflexão é importante, porque um dos equívocos do PT foi exatamente exaltar o Lula como líder máximo e inquestionável. Mas em muitos momentos Lula negou o PT, atropelando suas instâncias e rejeitando suas bandeiras históricas. O PT ficou refém do Lulismo, com sua política de conciliação de classes.

O PT, para continuar viável, precisa não apenas se refazer, mas se desfazer do Lulismo. Talvez por isso os últimos movimentos do governo Dilma, acenando para as suas bases sociais. Seria uma tentativa de liderar as esquerdas na oposição ao governo Temer?

Se for, o PT insistirá no erro, porque a aproximação com as pautas progressistas se dá no limite de conveniências e não no bojo de uma profunda autocrítica.

Depois falo dos outros escritos de conjuntura. Para ler o texto completo de Rudá: http://www.rudaricci.com.br/a-crise-do-lulismo-e-a-crise-do-pt-a-crise-do-pt-e-a-crise-da-esquerda-seria-tudo-igual/

Força policial brasileira é a que mais mata no mundo, diz relatório


Um relatório da Anistia Internacional destaca o Brasil e os EUA, sendo que o Brasil aparece como o país que tem o maior número geral de homicídios.

Brasil e Estados Unidos têm em comum números trágicos sobre letalidade policial. Se as forças policiais brasileiras mata mais no mundo, a americana é considerada uma das três polícias mais violentas. 

Isto está dito no relatório da organização Anistia Internacional, divulgado nessa segunda-feira (7). O documento traz números assustadores da violência policial.

O relatório sugere a criação de ferramentas para reduzir as mortes por violência policial. Entre elas, investigações independentes, punições em caso de abuso e regras mais rígidas sobre a atuação dos agentes da lei, estatutos que deixem claro quando o uso da força se justifica.

Nesse documento, o Brasil e os Estados Unidos são países em destaque.

O Brasil aparece como o país que tem o maior número geral de homicídios no mundo inteiro. Só em 2012, foram 56 mil homicídios. Em 2014, 15,6% dos homicídios tinham um policial no gatilho. Segundo o relatório da Anistia Internacional, eles atiram em pessoas que já se renderam, que já estão feridas e sem uma advertência que permitisse que o suspeito se entregue.

O levantamento se concentrou na Zona Norte do Rio de Janeiro, que inclui a Favela de Acari.
Entre as vítimas da violência policial no Rio, entre 2010 e 2013, 99,5% eram homens. Quase 80% das vítimas eram negras e três em cada quatro, 75%, tinham idades entre 15 e 29 anos.

A maioria dos policiais nunca foi punida. A Anistia Internacional acompanhou 220 investigações sobre mortes causadas por policiais desde 2011. Em quatro anos, em apenas um caso, o policial chegou a ser formalmente acusado pela Justiça. Em 2015, desses 220 casos, 183 investigações ainda não tinham sido concluídas.

Nos Estados Unidos, não existem números oficiais sobre a violência policial no país inteiro. Mas estatísticas regionais sugerem que o perfil das pessoas mortas pelos agentes da lei é muito parecido com o do Brasil. A maioria é de homens negros e jovens.

Em menos de um ano, três casos mobilizaram os americanos. Em julho de 2014, o camelô Eric Gardner foi morto em Nova York. O policial Daniel Pantaleo aplicou uma gravata, uma manobra proibida pelo departamento de polícia da cidade. Gardner avisou 11 vezes que não estava conseguindo respirar, até morrer sufocado.

Em Ferguson, no estado do Missouri, o policial Darren Wilson matou o jovem Michael Brown, que estava desarmado. Houve uma série de protestos na cidade. Nos dois casos, os policiais nem chegaram a ser denunciados.

Em abril deste ano, o jovem Freddy Gray morreu dentro de um camburão da polícia de Baltimore. A investigação concluiu que ele foi vítima de homicídio por espancamento. Os seis policiais envolvidos foram indiciados e esperam o julgamento.

O link para a reportagem:http://g1.globo.com/globo-news/noticia/2015/09/forca-policial-brasileira-e-que-mais-mata-no-mundo-diz-relatorio.html?utm_source=facebook&utm_medium=share-bar-desktop&utm_campaign=share-bar