terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Awá-Guajá: Remoção de Não-índios é iminente

Postagem atualizada e corrigida em 31.01.2013.

Foram julgadas as apelações no processos que questionam a demarcação da TI Awá-Guajá. O reexame necessário foi julgado no dia 06.08.2012. O Acórdão confirmou a sentença do juiz federal, Dr. José Carlos do Vale Madeira. Nesse processo foi interposto Recurso Especial, para o STJ, no dia 16 de novembro do ano passado. O recurso ainda será submetido ao exame de admissibilidade perante o TRF da 1ª Região. Se considerado admissível, subirá para o STJ. Se não for dado o efeito suspensivo, a sentença de primeiro grau poderá ser executada.

Um dos principais opositores da demarcação, a empresa AGROPECUÁRIA TURIAÇU teve seu recurso de apelação (0000349-69.1995.4.01.3700) julgado ainda 09.12.2011. Esse processo transitou em julgado desde abril de 2012 e já foi baixado para a justiça federal no Maranhão.

Da portaria de interdição da FUNAI (1992) até os dias atuais não houve qualquer ação preventiva dos órgãos fundiários no Estado, seja INCRA, seja ITERMA, no sentido de prevenir os impactos da desintrusão sobre os agricultores familiares que se utilizam da TI.  O INCRA dispõe de um cadastro de mais de mil pessoas que moram ou apenas praticam agricultura no interior do território. A retirada dos ocupantes agora é iminente. 

A TI Awá, está localizada nos municípios de Centro Novo do Maranhão, Governador Newton Belo, São João do Caru e Zé Doca, no estado do Maranhão. O processo de regularização fundiária da TI Awá teve início ainda na década de 1970. Em 1987, a Funai interditou uma área de 147.500ha, conforme Portaria nº 3767/E de 01.12.1987. A delimitação foi finalizada com e publicação da Portaria n. 373, de 29 de julho de 1992, que declara a terra indígena como posse imemorial indígena com 118.000ha. A TI Awá foi homologada em 2005 e registrada no SPU em 2009.

Em 2002, o Ministério Público Federal instaurou uma Ação Civil Pública (2002.37.00.003918-2), contra Funai, União e Agropecuária Alto Turiaçu, requerendo  a demarcação da referida terra indígena “de acordo com os termos da Portaria n. 373/92 e o laudo antropológico” produzidos nos autos do Processo n. 95.0000353-8 e declarando a nulidade dos títulos de domínio invocados pela Agropecuária. Em 2009, o juiz acolheu os pedidos do MPF, determinando a demarcação da TI Awá, e a “remoção de todas as pessoas – posseiros, agricultores, madeireiros etc. – que se encontrarem no interior da Área Indígena Awá-Guajá”. Algumas apelações foram interpostas a esta decisão, contudo, em dezembro de 2011, o juiz mantém a decisão de 2009, determinando a conclusão do procedimento em 1 ano. Abaixo, trecho da parte dispositiva da sentença de primeiro grau:


ANTE O EXPOSTO, acolho os pedidos formulados pelo Autor (CPC 269 I), condenando os Réus a demarcarem, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, a contar da intimação da presente sentença, a Área Indígena Awá-Guajá de acordo com os termos da Portaria n. 373/92 e o Laudo Antropológico elaborado pela Antropóloga ELIANE CANTARINO O’DWYER – produzido nos autos do Processo n.  95.0000353-8 –, seguindo-se os atos de homologação e registro imobiliário.

Por conseqüência, ficam declarados nulos e extintos, “não produzindo efeitos jurídicos” (CF 231 § 6º), os atos que tenham possibilitado a ocupação, o domínio ou a posse de terras situadas no interior da Área Indígena Awá, inclusive aqueles praticados pela empresa Agropecuária Alto do Turiaçu Ltda.

Em prol da efetividade do provimento jurisdicional ora apresentado (CPC 461 § 5º; LACP 11), imponho aos Réus as seguintes obrigações, a serem cumpridas no prazo de 180 (cento e oitenta dias), sob pena do pagamento de multa diária fixada em R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), a incidir após o exaurimento do prazo ora fixado: (i) remoção de todas as pessoas – posseiros, agricultores, madeireiros etc. – que se encontrarem no interior da Área Indígena Awá-Guajá; (ii) desfazimento de construções,

cercas, estradas ou quaisquer obras existentes no interior da Área Indígena Awá-Guajá e que sejam tidas por incompatíveis com a utilização das terras pelos Guajá; (iii) colocação de placas ao longo de todo o perímetro da área demarcanda, com indicações didáticas (= que possam ser compreendidas pelo homem comum) de a área indígena ter sido demarcada por determinação da Justiça Federal no Maranhão, com a proibição do ingresso de pessoas naqueles locais sem autorização da FUNAI; e (iv) divulgar os trabalhos de 
demarcação perante a comunidade em geral e, em particular, perante os sindicatos, associações, prefeituras, câmaras municipais e outras entidades que tenham interesse direto ou sofram quaisquer conseqüências jurídicas da demarcação da Área Indígena Awá-Guajá.

Custas processuais e honorários advocatícios indevidos (CF 128 § 5º II a).

Sentença sujeita ao duplo grau de jurisdição (CPC   475 I).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

São Luís, 30 de junho de 2009.

JOSÉ CARLOS DO VALE MADEIRA
Juiz Federal

Obs: o inteiro teor da sentença pode ser acessado aqui.



O acórdão do TRFda 1ª região sobre o reexame necessário  segue abaixo e a movimentação do processo pode ser visualizada aqui:

E M E N T A
CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DEMARCAÇÃO DE TERRAS INDÍGENAS. GRUPO AWÁ-GUAJÁ. VALIDADE DA PORTARIA 373/92 DO MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. REGULARIDADE DA PERÍCIA TOPOGRÁFICA E ANTROPOLÓGICA. PERITOS QUALIFICADOS. DECRETO 22/91. APELAÇÃO DE TERCEIROS ALEGADAMENTE PREJUDICADOS NÃO CONHECIDA. PERDA PARCIAL DO OBJETO DA DEMANDA NÃO CONFIGURADA. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE NA FIXAÇÃO DO PRAZO JUDICIAL. OCUPAÇÃO TRADICIONAL DE TERRA INDÍGENA.
I. Na “Constituição do Índio” conforme denominação atribuída a Uadi Lammêgo Bulos, merece destaque a proeminência com que o constituinte de 88 tratou as questões indígenas, alçando-as a patamares tão relevantes que tracejou sua disciplina em inúmeros dispositivos constitucionais, como se vê dos arts. 20, XI; 22, XIV; 49, XVI; 109, XI; 129, V e 176, § 1º e, especialmente, no arremate definido no capítulo VII do título que trata da ordem social, constituído pelos arts. 231 e 232 da Carta Política de 88, que consagrou o direito originário dos índios sobre as terras que ocupam tradicionalmente.
II. A conjunção dos dispositivos supra mencionados configura as reservas indígenas como bens da União com afetação especial aos índios que nelas habitam, podendo usufruir com exclusividade da posse originária outorgada pelo constituinte de 88. Precedente do STF – RE 183.188/MS.
III. A disciplina para o processo administrativo de demarcação de terras indígenas no Brasil é de competência da União e consiste numa série de atos correlatos. Sendo certo que a demarcação não representa título de posse ou requisito de ocupação, uma vez que o pleno gozo dos índios sobre suas terras independe de qualquer ato administrativo. Assim, o processo demarcatório da terra indígena é regulado por decreto do Poder Executivo, materializando-se num procedimento administrativo conduzido pela Fundação Nacional do Índio – FUNAI e concluído com um decreto homologatório do Presidente da República. Esse procedimento tem início com a formação de um grupo técnico especializado que deverá promover o estudo etno-hisórico, sociológico, jurídico, cartográfico e ambiental, bem como o levantamento fundiário necessários à delimitação das terras indígenas, a fim de elaborar relatório circunstanciado a ser encaminhado ao Ministro da Justiça. Este, por sua vez, expedirá portaria delineando os limites da demarcação administrativa da área e concluirá o processo enviando-o ao Presidente da República que tem competência para editar decreto homologatório.
IV. Desse modo, é regular e está em consonância com os princípios da Administração Pública insculpidos no art. 37/DF, o procedimento demarcatório de terras indígenas em que o Presidente da FUNAI expediu portaria e constituiu grupo técnico multidisciplinar com a finalidade de adequar os limites da Terra do Grupo Indígena AWÁ-GUAJÁ, nos Municípios de Caratapera, Bom jardim e Zé Doca, Estado do Maranhão. E, em seguida, encaminhou proposta fundamentada ao Ministro da Justiça que expressou sua motivação e considerou caracterizada a área de ocupação tradicional e permanente dos índios na conformidade dos arts. 231 da CF e 17 do Estatuto do Índio, editando a Portaria 373/92, em que declarou a área de posse permanente indígena para efeito de demarcação.
V. O procedimento de demarcação de terras indígenas não está adstrito a aviso circular, que não tem força imperativa a ensejar alteração nas regras do procedimento demarcatório estabelecido, à época, no Decreto 22/91. O aviso representa mero “expediente pelo qual os Ministros de Estado se comunicam com iguais ou subalternos, transmitindo instruções, fazendo solicitações, interpretando dispositivos regulamentares, ou determinando providências necessárias à boa ordem dos serviços públicos” (NEY, João Luiz. Prontuário de Redação Oficial. 6ª ed. 1971, p. 93).
VI. O acervo probatório, constituído de perícia técnica, oitiva de testemunha, exibição de documentos, esclarecimentos prestados em audiência pelos peritos, laudo topográfico e inspeção judicial, mostra-se robusto e suficiente para ratificar os estudos conduzidos pela FUNAI e conformar o convencimento do julgador pela validade da Portaria 373/92 do Ministro da Justiça, firmando a concepção de que a área demarcada é de posse tradicional do grupo indígena Awá-Guajá.
VII. A partir do momento em que o perito é nomeado pelo juiz para participar do processo judicial, passa a ser considerado um serventuário especial no auxílio à justiça, devendo atuar com presteza e imparcialidade, até porque responde na esfera civil, penal e administrativa por eventual dano que venha a causar aos interessados. O perito não tem interesse que uma ou outra parte se consagre vencedora na demanda. Sua função é fornecer os elementos informativos de ordem técnica conforme determinado pelo juízo, e sua atuação está jungida à forma estabelecida em lei.
VIII. O laudo pericial topográfico elaborado por engenheiro agrônomo comprovadamente qualificado para descrever os limites do imóvel da Agropecuária Alto do Turiaçu Ltda., mostrou-se suficiente e válido ao apurar que 89,98% da área da Empresa-Apelante encontra-se no interior das terras do grupo indígena Awá-Guajá, tal qual descrita na Portaria 373/92.
IX. A perícia antropológica constituída para investigar as formas de existência social e cultural, bem como os processos de territorialização do grupo indígena Awá-Guajá, além da formação de um campesinato tradicional e/ou fronteira agrícola e a situação de exploração e trajetória da Agropecuária Turiaçu Ltda mostrou-se firme, didática e eficaz ao revelar que “A área definida na Portaria nº 373/92 da FUNAI (fls. 71/72 dos autos) é de posse permanente do grupo indígena Awá-Guajá e integrava o território da antiga Reserva Florestal do Gurupi”.
X. Independentemente do momento em que a Empresa Agropecuária tenha iniciado suas atividades na área, as terras reconhecidas como de ocupação indígena já recebiam, desde antes, tutela constitucional. Ou seja, não há falar em direito adquirido a bem jurídico com força em valores desacolhidos pela nova ordem constitucional. O reconhecimento do direito originário dos povos indígenas em ocupar suas terras é ato meramente declaratório e não constitutivo, uma vez que a Lei Maior declarou expressamente a nulidade dos atos que tenham por objeto a ocupação, domínio e posse das terras indígenas (art. 2131, § 6º, CF).
XI. Para ingressar nos autos em fase de recurso contra sentença de primeiro grau, por força do art. 499, § 1º, do CPC, é preciso demonstrar o nexo de interdependência entre o interesse processual em intervir na demanda e a relação jurídica com as partes a ensejar a sucumbência decorrente do decisum recorrido. Meras procurações concessivas de amplos poderes, muitas delas sem assinatura, contendo apenas impressão digital, em desarmonia com o art. 654 do CC, são insuficientes para comprovar relação jurídica com os demais integrantes da causa, ou mesmo com o objeto da Portaria 373/92 a ensejar integração à demanda nessa fase do processo, razão pela qual não se conhece das apelações manejadas por terceiros alegadamente prejudicados.
XII. O argumento de perda parcial do objeto da demanda em razão da demarcação administrativa carece de relevância jurídica na hipótese em que o poder público, embora tenha procedido à demarcação e homologação da terra indígena, concedeu títulos dominiais ou permitiu a instalação de terceiros na região a conformar verdadeiro embaraço para que os silvícolas, parte hipossuficiente na espécie, pudessem apossar-se das áreas que lhes foram reconhecidas. Para conferir eficácia à homologação de terra indígena, é preciso que o poder público cumpra as medidas aptas a dar efetividade ao procedimento administrativo, especialmente a extrusão dos ocupantes não índios da área e a remoção das obras e construções que impedem a efetiva utilização da terra para o desiderato que lhe foi dado pela norma administrativa constituída em harmonia com a Constituição Federal.
XIII. O estabelecimento de prazo para cumprimento de decisão consistente em remoção de pessoas e desfazimento de construções em áreas demarcadas como terras indígenas deve ser temperado de razoabilidade a fim de evitar conflitos. Caso em que o prazo de 1 (um) ano, a contar da data de intimação deste acórdão, mostra-se suficiente para que sejam removidas as pessoas não índias e desfeitas as construções edificadas na área reservada ao grupo indígeena Awá-Guajá.
XIV. A ocupação tradicional de terras indígenas a que se refere o art. 231, § 1º, da CF diz respeito a relação dos autóctones com o território conforme seus usos, costumes e tradições para a promoção de seu bem-estar e de sua reprodução física. É despicienda a ocupação física em toda a terra indígena. Ou seja, “O tradicionalmente refere-se não a uma circunstância temporal, mas ao modo tradicional de os índios ocuparem e utilizarem as terras e ao modo tradicional de produção, enfim, ao modo tradicional de como eles se relacionam com a terra, já que há comunidades mais estáveis, outras menos estáveis, e as que têm espaços mais amplos em que se deslocam etc. Daí dizer-se que tudo se realiza segundo seus usos, costumes e tradições.” (José Afonso da Silva, in Os Direitos Indígenas e a Constituição, 1993).
XV. Atestado administrativo negativo da presença de silvícolas na região perde a robustez diante de pesquisas e estudos elaborados para a demarcação de terras indígenas que concluíram em sentido contrário, máxime quando o referido atestado alerta para a demarcação da terra indígena.
XVI. A robustez do acervo probatório conduz ao reconhecimento da higidez da Portaria 373/92 do Ministério da Justiça e da demarcação levada a cabo pelo poder público que. Assim, eventual direito de propriedade adquirido sob a égide de normas anteriores não subsiste diante da nova ordem constitucional inaugurada em 5 de outubro de 1988, de modo que acolher eventual título de propriedade em áreas reconhecidamente ocupadas por grupos indígenas é labor inútil em razão da imperatividade da norma constitucional.
XVII. Recursos dos terceiros prejudicados não conhecido. Apelação da FUNAI provida e parcialmente providos a remessa oficial e o recurso da UNIÃO. Apelação da Agropecuária Alto do Turiaçu Ltda. desprovida. Determinação para que a UNIÃO e a FUNAI promovam o registro da área demarcada no cartório imobiliário e na Secretaria do Patrimônio do Ministério da Fazenda e, no prazo de um ano, a contar da intimação deste julgado, a remoção das pessoas não-índias que se encontram no interior da terra demarcada, bem como o desfazimento das construções edificadas no perímetro da Portaria 373/92, além do cumprimento das demais determinações oriundas da sentença recorrida.
A C Ó R D Ã O
Decide a Sexta Turma, por unanimidade, não conhecer dos recursos dos terceiros prejudicados, dar provimento à apelação da FUNAI, dar parcial provimento à remessa oficial e ao recurso da União e negar provimento à apelação da Agropecuária Alto do Turiaçu LTDA.
Sexta Turma do TRF da 1ª Região – 09.12.2011.
Desembargador Federal JIRAIR ARAM MEGUERIAN
Relator



O  acórdão do julgamento da apelação da Agropecuária Turiaçu segue abaixo e a movimentação do processo pode ser visualizada aqui.



Processo:
AC 349 MA 0000349-69.1995.4.01.3700
Relator(a):
DESEMBARGADOR FEDERAL JIRAIR ARAM MEGUERIAN
Julgamento:
09/12/2011
Órgão Julgador:
SEXTA TURMA
Publicação:
e-DJF1 p.93 de 26/01/2012

Ementa

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DEMARCAÇÃO DE TERRAS INDÍGENAS DO GRUPO AWÁ-GUAJÁ. VALIDADE DA PORTARIA DO MINISTRO DA JUSTIÇA N. 373/92. REGULARIDADE DA PERÍCIA TOPOGRÁFICA E ANTROPOLÓGICA. QUALIFICAÇÃO DOS PERITOS. DECRETO 22/91.
I. Remessa oficial não recebida, pois a demanda não se ajusta aos parâmetros delineados pelo art. 475 do CPC.
II. Merece destaque a proeminência com que o constituinte de 88 tratou as questões indígenas, alçando-as a patamares tão relevantes que tracejou sua disciplina em inúmeros dispositivos constitucionais, como se vê dos arts. 20, XI; 22, XIV; 49, XVI; 109, XI; 129, V e 176, § 1º e, especialmente, no arremate definido no capítulo VII do título que trata da ordem social, constituído pelos arts. 231 e 232 da Carta Política de 88, que consagrou o direito originário dos índios sobre as terras que ocupam tradicionalmente.
III. A conjunção dos dispositivos supra mencionados configura as reservas indígenas como bens da União com afetação especial aos índios que nelas habitam, podendo usufruir com exclusividade da posse originária outorgada pelo constituinte de 88. Precedente do STF - RE 183.188/MS.
IV. A disciplina para o processo administrativo de demarcação de áreas indígenas no Brasil é de competência da União e consiste numa série de atos correlatos. Sendo certo que a demarcação não representa título de posse ou requisito de ocupação, uma vez que o pleno gozo dos índios sobre suas terras independe de qualquer ato administrativo. Assim, o processo demarcatório da terra indígena é regulado por decreto do Poder Executivo, materializando-se num procedimento administrativo conduzido pela Fundação Nacional do Índio - FUNAI e concluído com um decreto homologatório do Presidente da República. Esse procedimento tem início com a formação de um grupo de trabalho multidisciplinar que deverá promover o estudo etno-histórico e cartográfico de identificação dos povos e das terras indígenas, bem como o levantamento fundiário da região a fim de elaborar relatório circunstanciado a ser encaminhado ao Ministro da Justiça. Este, por sua vez, expedirá portaria delineando os limites da demarcação administrativa da área e concluirá o processo enviando-o ao Presidente da República que tem competência para editar decreto homologatório.
V. Desse modo, é regular e está em consonância com os princípios da Administração Pública insculpidos no art. 37/CF, o procedimento demarcatório de terras indígenas em que o Presidente da FUNAI expediu portaria e constituiu grupo técnico especializado com a finalidade de adequar os limites da Terra do Grupo Indígena AWÁ-GUAJÁ, nos Municípios de Caratapera, Bom jardim e Zé Doca, Estado do Maranhão. E, em seguida, encaminhou proposta fundamentada ao Ministro da Justiça que expressou sua motivação e considerou caracterizada a área de ocupação tradicional e permanente dos índios na conformidade dos arts. 231 da CF e 17 do Estatuto do Índio, editando a Portaria 373/92, em que declarou a área de posse permanente indígena para efeito de demarcação.
VI. O procedimento de demarcação de terras indígenas não está adstrito a aviso circular, que não tem força imperativa a ensejar alteração nas regras do procedimento demarcatório estabelecido, à época, no Decreto 22/91. O aviso representa mero "expediente pelo qual os Ministros de Estado se comunicam com iguais ou subalternos, transmitindo instruções, fazendo solicitações, interpretando dispositivos regulamentares, ou determinando providências necessárias à boa ordem dos serviços públicos" (NEY, João Luiz. Prontuário de Redação Oficial. 6ª ed. 1971, p. 93).
VII. Na espécie a demarcação da terra indígena Awá, objeto da Portaria 373/92 do Ministério da Justiça, foi devidamente homologada pelo Decreto Presidencial de 19 de abril de 2005. As demais formalidades administrativas exigidas no Decreto 22/91, como o registro no cartório imobiliário e no Departamento do Patrimônio Nacional, carecem de decisão judicial para dar eficácia à demarcação e cancelar os títulos dominiais expedidos pelo poder público.
VIII. O ato administrativo que demarca os limites de área indígena não representa restrição ao direito de propriedade, locomoção ou liberdade. Os direitos fundamentais dos quais se ocupam os arts. , caput, incisos XXIII e LXVIII e 170, II da Constituição devem conviver em harmonia com a preservação do meio ambiente (art. 170, VI, CF) e o reconhecimento da organização social do índio, expressada pelos seus costumes, línguas, crenças e tradições (art. 231, caput), posto que todos são mandamentos conformadores do desiderato constitucional de formar uma sociedade livre, justa e solidária, com erradicação da pobreza e promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade, e quaisquer outras formas de discriminação, garantindo o desenvolvimento nacional (art. 3º/CF).
IX. A propósito, "Ao Poder Público de todas as dimensões federativas o que incumbe não é subestimar, e muito menos hostilizar comunidades indígenas brasileiras, mas tirar proveito delas para diversificar o potencial econômico-cultural dos seus territórios (dos entes federativos). O desenvolvimento que se fizer sem ou contra os índios, ali onde eles se encontrarem instalados por modo tradicional, à data da Constituição de 1988, desrespeita o objetivo fundamental do inciso II do art. da Constituição Federal, assecuratório de um tipo de"desenvolvimento nacional"tão ecologicamente equilibrado quanto humanizado e culturalmente diversificado, de modo a incorporar a realidade indígena." (Pet 3388, Rel. Ministro Carlos Brito, Tribunal Pleno, DJ 30/6/2010).
X. O acervo probatório, constituído de perícia técnica, oitiva de testemunha, exibição de documentos, esclarecimentos prestados em audiência pelos peritos e inspeção judicial, mostra-se robusto e suficiente para ratificar os estudos conduzidos pela FUNAI e conformar o convencimento do julgador pela validade da Portaria 373/92 do Ministro da Justiça, firmando a concepção de que a área demarcada é de posse tradicional do grupo indígena Awá-Guajá. XI. A partir do momento em que o perito é nomeado pelo juiz para participar do processo judicial, passa a ser considerado um serventuário especial no auxílio à justiça, devendo atuar com presteza e imparcialidade, até porque responde na esfera civil, penal e administrativa por eventual dano que venha a causar aos interessados. O perito não tem interesse que uma ou outra parte se consagre vencedora na demanda. Sua função é fornecer os elementos informativos de ordem técnica conforme determinado pelo juízo, e sua atuação está jungida à forma estabelecida em lei. XII. O laudo pericial topográfico elaborado por engenheiro agrônomo comprovadamente qualificado para descrever os limites do imóvel da Agropecuária Alto do Turiaçu Ltda., mostrou-se suficiente e válido ao apurar que 89,98% da área da Empresa-Apelante encontra-se no interior das terras do grupo indígena Awá-Guajá, tal qual descrita na Portaria 373/92. XIII. A perícia antropológica constituída para investigar as formas de existência social e cultural, bem como os processos de territorialização dos grupos indígenas Awá-Guajá, além da formação de um campesinato tradicional e/ou fronteira agrícola e a situação de exploração e trajetória da Agropecuária Turiaçu Ltda. mostrou-se firme, didática e eficaz ao revelar que "A área definida na Portaria nº 373/92 da FUNAI (fls. 71/72 dos autos) é de posse permanente do grupo indígena Awá-Guajá e integrava o território da antiga Reserva Florestal do Gurupi". XIV. Independentemente do momento em que a Empresa Agropecuária tenha iniciado suas atividades na área, as terras reconhecidas como de ocupação indígena já recebiam, desde antes, tutela constitucional. Ou seja, não há falar em direito adquirido a bem jurídico com força em valores desacolhidos pela nova ordem constitucional. O reconhecimento do direito originário dos povos indígenas em ocupar suas terras é ato meramente declaratório e não constitutivo, uma vez que a Lei Maior declarou expressamente a nulidade dos atos que tenham por objeto a ocupação, domínio e posse das terras indígenas (art. 2131, § 6º, CF). XV. Apelação conhecida, em parte e, nesta parte, nega-se provimento.

Acordão

A Turma, por unanimidade, conheceu, em parte, da apelação e, nessa parte, negou-lhe provimento.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Lei de Santa Catarina proíbe nomes de torturadores em bens públicos

LEI Nº 15.973, de 14 de janeiro de 2013



Procedência: Depta. Luciane Carminatti
Natureza: PL./0332.7/2012

DO: 19.494 de 15/01/13

Fonte - ALESC/Coord. Documentação


Altera o caput do art. 1º da Lei nº 12.118, de 2002, que dispõe sobre a denominação de bens públicos e adota outras providências.


O GOVERNADOR DO ESTADO DE SANTA CATARINA,

Faço saber a todos os habitantes deste Estado que a Assembleia Legislativa decreta e eu sanciono a seguinte Lei:



Art. 1º O caput do art. 1º da Lei nº 12.118, de 07 de janeiro de 2002, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 1º Fica proibido atribuir nome de pessoa viva e de pessoa falecida que tenha praticado ato de lesa-humanidade, tortura ou violação de direitos humanos, a bem público, de qualquer natureza, pertencente ao Estado ou a pessoas jurídicas da Administração Indireta.” (NR)



Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.



Florianópolis, 14 de janeiro de 2013


JOÃO RAIMUNDO COLOMBO
Governador do Estado

Trabalho escravo no Brasil: ganância, miséria e impunidade


http://www.ihu.unisinos.br/noticias/517221-trabalho-escravo-no-brasil-ganancia-miseria-e-impunidade#.UQZv3M0fv7A.facebook

No próximo dia 28 de janeiro, o Brasil celebra o Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo. A data é uma homenagem ao assassinato dos auditores fiscais do trabalho Erastóstenes de Almeida Gonçalves, João Batista Soares Lage e Nelson José da Silva, e o motorista Ailton Pereira de Oliveira, no ano de 2004, quando apuravam denúncia de trabalho escravo na zona rural de Unaí (MG). A data foi oficializada em 2009, no entanto, essa luta é mais antiga. Desde o início dos anos 1970, a Igreja, com dom Pedro Casaldáliga, e a Comissão Pastoral da Terra (CPT), organismo vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), tem denunciado a utilização do trabalho escravo na abertura das novas fronteiras agrícolas do país.
A reportagem é publicada pelo Boletim da CNBB, 25-01-2013.

A CPT foi pioneira no combate ao trabalho escravo e levou a denúncia às Organização das Nações Unidas (ONU). “A Igreja precisava tomar um posicionamento diante da realidade já muito explícita de trabalho escravo no Brasil, o Governo negava que existia esse tipo de situação”, disse o assessor da Comissão Episcopal Pastoral para o Serviço da Caridade, Justiça e da Paz, padre Ari Antônio dos Reis. Com isso, o Estado se comprometeu em criar uma estrutura de combate a esse crime em território brasileiro.

De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o trabalho escravo apresenta características bem delimitadas. Além das condições precárias, como falta de alojamento, água potável e sanitários, por exemplo, também existe cerceamento do direito de ir e vir pela coação de homens armados. Os trabalhadores são forçados a assumir dívidas crescentes e intermináveis, com alimentação e despesas com ferramentas usadas no serviço.

Por parte do Estado, existem ações que podem auxiliar no combate ao trabalho escravo, como por exemplo, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 438. A "PEC do Trabalho Escravo" é considerada um dos projetos mais importantes de combate à escravidão, tanto pelo forte instrumento de repressão que pode criar, mas também pelo seu simbolismo, pois revigora a importância da função social da terra, já prevista na Constituição.

A PEC 438 foi apresentada em 1999, pelo ex-senador Ademir Andrade (PSB-PA), e propõe o confisco de propriedades em que forem encontrados casos de exploração de mão-de-obra equivalente à escravidão, e/ou lavouras de plantas psicotrópicas ilegais, como a maconha. A PEC 438/2001 define ainda que as propriedades confiscadas serão destinadas ao assentamento de famílias como parte do programa de reforma agrária.

A Igreja do Brasil está atenta à realidade do tráfico humano. Prova disso, é que a Campanha da Fraternidade de 2014 terá como tema “Fraternidade e Tráfico Humano” e lema “É para a liberdade que Cristo nos libertou” (Gl 5,1). “A partir do trabalho e da reflexão dentro da CNBB, e do Conselho de Pastoral, foi aprovado para a Campanha da Fraternidade de 2014, tratar do trabalho escravo, por sua vez, ligado ao tráfico humano. Então nós vamos trabalhar na Campanha essas duas propostas: a denúncia do tráfico de pessoas e trabalho escravo, e todas as consequências que essas denúncias trazem para a Igreja”, explicou padre Ari.

De acordo com a secretária do Grupo de Trabalho (GT) de Enfrentamento ao Tráfico Humano, da CNBB, irmã Claudina Scapini, o trabalho escravo é uma entre as modalidades do tráfico humano. “O trabalho escravo, a exploração sexual, o tráfico de órgãos, e a adoção irregular, são, para nós, as grandes modalidades do tráfico de seres humanos”, afirmou.

Segundo os últimos dados da Campanha Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, os casos de trabalho escravo em 2012, somaram 189, com a libertação de 2.723 trabalhadores, em todo o país. Ainda de acordo com as informações, o número de trabalhadores resgatados do trabalho escravo cresceu 9% em relação a 2011. Os maiores índices foram encontrados na região Norte, onde foi registrada metade do número total de trabalhadores envolvidos em situação de escravidão, e 39% dos que chegaram a ser resgatados.

No ano de 2011, o estado do Pará havia deixado de ser o campeão permanente do ranking entre os estados, pelo número de trabalhadores envolvidos em situação de escravidão. Já em 2012, voltou ao topo do ranking em todos os critérios: número de casos (50), número de trabalhadores envolvidos (1244) e número de libertados (519). O Tocantins vem logo em seguida com 22 casos, 360 envolvidos e 321 libertados (três vezes mais que em 2011).

No estado do Amazonas, onde a fiscalização passou a operar mais recentemente, foram identificados 10 casos, e resgatados quase três vezes mais trabalhadores do que no ano anterior: 171 pessoas. Alagoas, em apenas um caso, passou de 51 para 110 trabalhadores resgatados e o Piauí (com 9 casos), de 30 para 97.

Outro dado que chama a atenção é o aumento da participação da região Sul na prática desse crime. Em 2011, foram registrados na região 23 casos, envolvendo 158 trabalhadores, sendo que 154 foram resgatados pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).

De uma forma geral, os números mostram que houve resgate de trabalhadores em 20 estados, o que demonstra que essa prática criminosa persiste de norte a sul do nosso país, mesmo diante das ações de órgãos do governo e de organizações sociais que lutam pelo seu fim. A CNBB é aliada ao combate desse tipo de prática, fazendo o chamamento ao diálogo de dioceses, paróquias, comunidades e entidades ligadas à missão pastoral.

Persistem alguns desafios para o Estado, a Igreja e a sociedade civil, voltados na perspectiva de enfrentamento e superação desta situação. Destacam-se a fiscalização eficiente, a mobilização social contra esta prática, a reforma agrária, superação da miséria. A impunidade, ainda constante, precisa ser combatida. Na chacina de Unaí, nove anos depois, nenhum dos nove réus indiciados foi julgado. Agora são oito réus, pois Francisco Elder Pinheiro, acusado de ter sido o contratante dos pistoleiros, morreu no último dia 7 de janeiro, aos 77 anos, vítima de um Acidente Vascular Cerebral (AVC).

Primeiro presídio privado será inaugurado em Minas


http://www.conjur.com.br/2013-jan-16/primeiro-presidio-privado-inaugurado-nesta-semana-minas-gerais

O primeiro complexo penitenciário construído por meio de PPP e administrado por uma empresa privada será inaugurado nesta semana em Minas Gerais. Instalado em Ribeirão das Neves, região da Grande Belo Horizonte, o presídio tem 3.040 vagas distribuídas em cinco unidades com capacidade para 608 detentos. A notícia é do portal R7.
Foram investidos R$ 280 milhões na penitenciária, cuja primeira unidade será inaugurada com chegada de 608 presos de diferentes cadeias do estado. O presídio se destina a detentos do sexo masculino, que não sejam chefes de quadrilha e que cumpram pena em regime fechado ou semiaberto por crimes que não sejam considerados violentos. A administração da cadeia será feita pelo consórcio Gestores Prisionais Associados (GPA), por meio de contrato com 27 anos de vigência. As demais unidades do complexo devem ser inauguradas até o fim de 2013.
Para que receba integralmente as verbas repassadas pelo governo, a administração deverá cumprir 380 indicadores de desempenho. Uma das metas é manter a totalidade dos encarcerados trabalhando e estudando. Também deverá ser oferecida assistência médica, odontológica, social e jurídica aos detentos a cada dois meses.
O consórcio responsável pela gestão é formado por cinco empresas: CCI – Construções S/A, Construtora Augusto Velloso S/A, Empresa Tejofran de Saneamento e Serviços, N.F Motta Construções e Comércio e o Instituto Nacional de Administração Prisional (Inap).
Revista Consultor Jurídico, 16 de janeiro de 2013

Sejap entrega relatório do mapeamento de detentos provisórios ao TJ


http://imirante.globo.com/noticias/2013/01/28/pagina329559.shtml

Imirante, com informações da Secom
28/01/2013 00h20

SÃO LUÍS - O secretário de Estado de Justiça e Administração Penitenciária (Sejap), Sérgio Tamer, entregou ao desembargador Froz Sobrinho, coordenador do Grupo de Monitoramento Carcerário do Tribunal de Justiça do Maranhão, relatório elaborado pela secretaria sobre a situação dos presos provisórios. A entrega aconteceu durante reunião na sexta-feira (25).
O relatório, elaborado pela equipe multidisciplinar da Sejap, analisou a situação dos internos do Centro de Detenção Provisória (CDP) de Pedrinhas, em São Luís, custodiados por mais de 120 dias na unidade e diagnosticou 368 internos na referida situação. O objetivo do levantamento é buscar garantir aos custodiados tratamento digno e respeito aos seus direitos.
O desembargador Fróz Sobrinho descreveu a iniciativa como inédito no Maranhão “Com o relatório, o juiz pode analisar o perfil do preso e fazer uma analise mais humanizada. A Sejap desenvolveu uma ferramenta muito importante”.
De acordo com o desembargador, o conteúdo do relatório será fundamental para o trabalho de diminuição no número de presos provisórios “A meta desse ano é conseguir diminuir em 20% o quadro de presos provisórios do estado. É um trabalho audacioso, mas possível”, ressaltou.
O secretário Estado de Justiça e Administração Penitenciária, Sérgio Tamer, destacou a parceria entre a Sejap e o TJ. “O grupo de monitoramento, em especial, tem sido grande aliado no desenvolvidos e evolução dos trabalhos nas unidades prisionais”.
O secretário informou que uma das metas é a retirada dos presos das delegacias “Em 2012 já foram 400 internos a menos nas delegacias. Com a abertura de novas vagas, devido a construção de novos estabelecimentos penais, será possível retirar todos os presos provisórios das delegacias” explicou Tamer.
Participaram da reunião, a subsecretária e o assessor da Sejap, Leopoldina Amélia Barros e Leonel Amorim, respectivamente, e o Coordenador Executivo da Unidade de monitoramento Carcerário, Ariston Apoliano.
Durante a reunião ficou estabelecida a continuação na administração das Associações de Proteção e Assistência aos Condenados (Apac´s) e acriação de um novo convênio sobre as Apac’s entre a Sejap e o Tribunal de Justiça para aprovação da Procuradoria.

Extintas as designações genéricas como "autos de resistência", "resistência seguida de morte", nos registros policiais


Presidência da República Secretaria Especial dos Direitos Humanos Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana

RESOLUÇÃO Nº 8, DE 20 DE DEZEMBRO DE 2012

PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA
SECRETARIA ESPECIAL DOS DIREITOS HUMANOS
CONSELHO DE DEFESA DOS DIREITOS DA PESSOA HUMANA
DOU de 21/12/2012 (nº 246, Seção 1, pág. 9)
Dispõe sobre a abolição de designações genéricas, como "autos de resistência", "resistência seguida de morte", em registros policiais, boletins de ocorrência, inquéritos policiais e notícias de crime.
A MINISTRA DE ESTADO CHEFE DA SECRETARIA DE DIREITOS HUMANOS DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, na qualidade de PRESIDENTA DO CONSELHO DE DEFESA DOS DIREITOS DA PESSOA HUMANA, no uso das atribuições que lhe são conferidas pela Lei nº 4.319, de 16 de março de 1964, com alterações proporcionadas pelas Leis nº 5.763, de 15 de dezembro de 1971, e nº 10.683, de 28 de maio de 2003, esta última com a redação dada pela Lei nº 12.314, de 19 de agosto de 2010, dando cumprimento à deliberação unânime do Colegiado do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, realizada em sua 214ª reunião ordinária, nas presenças dos senhores Percílio De Sousa Lima Neto, Vice-Presidente do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana; Gláucia Silveira Gauch, Conselheira Representante do Ministério das Relações Exteriores; Carlos Eduardo Cunha Oliveira, Conselheiro Representante do Ministério das Relações Exteriores; Aurélio Virgílio Veiga Rios, Conselheiro Representante do Ministério Público Federal; Tarciso Dal Maso Jardim, Conselheiro Professor de Direito Constitucional; Fernando Santana Rocha, Conselheiro Professor de Direito Penal; Eugênio José Guilherme de Aragão, Conselheiro Professor de Direito Penal; Edgar Flexa Ribeiro, Conselheiro Representante da Associação Brasileira de Educação e Ivana Farina Navarrete Pena, Conselheira ad hoc Representante do Conselho Nacional de Procuradores Gerais dos Ministérios Públicos dos Estados e da União,
considerando que os direitos à vida, à liberdade, à segurança e à integridade física e mental são elementares dos sistemas nacional e internacional de proteção de direitos humanos e se situam em posição hierárquica suprema nos catálogos de direitos fundamentais;
considerando que todo caso de homicídio deve receber do Estado a mais cuidadosa e dedicada atenção e que a prova da exclusão de sua antijuridicidade, por legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento de dever legal ou exercício regular de direito, apenas poderá ser verificada após ampla investigação e instrução criminal e no curso de ação penal;
considerando que não existe, na legislação brasileira, excludente de "resistência seguida de morte", frequentemente documentada por "auto de resistência", o registro do evento deve ser como de homicídio decorrente de intervenção policial e, no curso da investigação, deve-se verificar se houve, ou não, resistência que possa fundamentar excludente de antijuridicidade;
considerando que apenas quatro Estados da Federação divulgam amplamente o número de mortes decorrentes de atos praticados por policiais civis e militares (Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, São Paulo e Santa Catarina) e que, nestes, entre janeiro de 2010 e junho de 2012, houve 3086 mortes em confrontos com policiais, sendo 2986 registradas por meio dos denominados autos de resistência (ou resistência seguida de morte) e 100 mortes em ação de policiais civis e militares;
considerando que a violência destas mortes atinge vítimas e familiares, assim como cria um ambiente de insegurança e medo para toda a comunidade;
considerando o disposto na Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011, que regulamenta o direito fundamental ao acesso à informação e na Lei nº 12.681, 04 de julho de 2012, que institui o Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública, Prisionais e sobre Drogas - SINESP;
considerando que o Decreto nº 7.037, de 21 de dezembro de 2009, que aprova o Programa Nacional de Direitos Humanos 3 - PNDH - 3, em sua Diretriz 14, Objetivo Estratégico I, recomenda "o fim do emprego nos registros policiais, boletins de ocorrência policial e inquéritos policiais de expressões genéricas como "autos de resistência", "resistência seguida de morte" e assemelhadas, em casos que envolvam pessoas mortas por agentes de segurança pública;
considerando o Relatório 141/11, de 31 de outubro de 2011, da Comissão Interamericana de Direitos Humanos/OEA para o Estado Brasileiro, recomendando a eliminação imediata dos registros de mortes pela polícia por meio de autos de resistência;
considerando o disposto no Relatório do Relator Especial da ONU para Execuções Extrajudiciais, Sumárias ou Arbitrárias - Philip Alston -, que no item 21, b, expressa como inaceitável o modo de classificação e registro das mortes causadas por policiais com a designação de "autos de resistência", impondo-se a investigação imparcial dos assassinatos classificados como "autos de resistência", recomenda:
Art. 1º - As autoridades policiais devem deixar de usar em registros policiais, boletins de ocorrência, inquéritos policiais e notícias de crimes designações genéricas como "autos de resistência", "resistência seguida de morte", promovendo o registro, com o nome técnico de "lesão corporal decorrente de intervenção policial" ou "homicídio decorrente de intervenção policial", conforme o caso.
Art. 2º - Os órgãos e instituições estatais que, no exercício de suas atribuições, se confrontarem com fatos classificados como "lesão corporal decorrente de intervenção policial" ou "homicídio decorrente de intervenção policial" devem observar, em sua atuação, o seguinte:
I - os fatos serão noticiados imediatamente a Delegacia de Crimes contra a Pessoa ou a repartição de polícia judiciária, federal ou civil, com atribuição assemelhada, nos termos do art. 144 da Constituição, que deverá:
a) instaurar, inquérito policial para investigação de homicídio ou de lesão corporal;
b) comunicar nos termos da lei, o ocorrido ao Ministério Público.
II - a perícia técnica especializada será realizada de imediato em todos os armamentos, veículos e maquinários, envolvidos em ação policial com resultado morte ou lesão corporal, assim como no local em que a ação tenha ocorrido, com preservação da cena do crime, das cápsulas e projeteis até que a perícia compareça ao local, conforme o disposto no art. 6º, incisos I e II; art. 159; art. 160; art. 164 e art. 181, do Código de Processo Penal;
III - é vedada a remoção do corpo do local da morte ou de onde tenha sido encontrado sem que antes se proceda ao devido exame pericial da cena, a teor do previsto no art. 6º, incisos I e II, do Código de Processo Penal;
IV - cumpre garantir que nenhum inquérito policial seja sobrestado ou arquivado sem que tenha sido juntado o respectivo laudo necroscópico ou cadavérico subscrito por peritos criminais independentes e imparciais, não subordinados às autoridades investigadas;
V - todas as testemunhas presenciais serão identificadas e sua inquirição será realizada com devida proteção, para que possam relatar o ocorrido em segurança e sem temor;
VI - cumpre garantir, nas investigações e nos processos penais relativos a homicídios ocorridos em confrontos policiais, que seja observado o disposto na Resolução 1989/65 do Conselho Econômico e Social das Nações Unidas (ECOSOC).
VII - o Ministério Público requisitará diligências complementares caso algum dos requisitos constantes dos incisos I a V não tenha sido preenchido;
VIII - no âmbito do Ministério Público, o inquérito policial será distribuído a membro com atribuição de atuar junto ao Tribunal do Júri, salvo quando for hipótese de "lesão corporal decorrente de intervenção policial";
IX - as Corregedorias de Polícia determinarão a imediata instauração de processos administrativos para apurar a regularidade da ação policial de que tenha resultado morte, adotando prioridade em sua tramitação;
X - sem prejuízo da investigação criminal e do processo administrativo disciplinar, cumpre à Ouvidoria de Polícia, quando houver, monitorar, registrar, informar, de forma independente e imparcial, possíveis abusos cometidos por agentes de segurança pública em ações de que resultem lesão corporal ou morte;
XI - os Comandantes das Polícias Militares nos Estados envidarão esforços no sentido de coibir a realização de investigações pelo Serviço Reservado (P-2) em hipóteses não relacionadas com a prática de infrações penais militares;
XII - até que se esclareçam as circunstâncias do fato e as responsabilidades, os policiais envolvidos em ação policial com resultado de morte:
a) serão afastados de imediato dos serviços de policiamento ostensivo ou de missões externas, ordinárias ou especiais; e
b) não participarão de processo de promoção por merecimento ou por bravura.
XIII - cumpre às Secretarias de Segurança Pública ou pastas estaduais assemelhadas abolir, quando existentes, políticas de promoção funcional que tenham por fundamento o encorajamento de confrontos entre policiais e pessoas supostamente envolvidas em práticas criminosas, bem como absterem-se de promoções fundamentadas em ações de bravura decorrentes da morte dessas pessoas;
XIV - será divulgado, trimestralmente, no Diário Oficial da unidade federada, relatório de estatísticas criminais que registre o número de casos de morte ou lesões corporais decorrentes de atos praticados por policiais civis e militares, bem como dados referentes a vítimas, classificadas por gênero, faixa etária, raça e cor;
XV - será assegurada a inclusão de conteúdos de Direitos Humanos nos concursos para provimento de cargos e nos cursos de formação de agentes de segurança pública, membros do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública, com enfoque historicamente fundamentado sobre a necessidade de ações e processos assecuratórios de política de segurança baseada na cidadania e nos direitos humanos;
XVI - serão instaladas câmeras de vídeo e equipamentos de geolocalização (GPS) em todas as viaturas policiais;
XVII - é vedado o uso, em fardamentos e veiculos oficiais das polícias, de símbolos e expressões com conteúdo intimidatório ou ameaçador, assim como de frases e jargões em músicas ou jingles de treinamento que façam apologia ao crime e à violência;
XVIII - o acompanhamento psicológico constante será assegurado a policiais envolvidos em conflitos com resultado morte e facultado a familiares de vítimas de agentes do Estado;
XIX - cumpre garantir a devida reparação às vítimas e a familiares das pessoas mortas em decorrência de intervenções policiais;
XX - será assegurada reparação a familiares dos policiais mortos em decorrência de sua atuação profissional legítima;
XXI - cumpre condicionar o repasse de verbas federais ao cumprimento de metas públicas de redução de:
a) mortes decorrentes de intervenção policial em situações de alegado confronto;
b) homicídios com suspeitas de ação de grupo de extermínio com a participação de agentes públicos; e
c) desaparecimentos forçados registrados com suspeita de participação de agentes públicos.
XXII - cumpre criar unidades de apoio especializadas no âmbito dos Ministérios Públicos para, em casos de homicídios decorrentes de intervenção policial, prestarem devida colaboração ao promotor natural previsto em lei, com conhecimentos e recursos humanos e financeiros necessários para a investigação adequada e o processo penal eficaz.
Art. 3º - Cumpre ao Ministério Público assegurar, por meio de sua atuação no controle externo da atividade policial, a investigação isenta e imparcial de homicídios decorrentes de ação policial, sem prejuízo de sua própria iniciativa investigatória, quando necessária para instruir a eventual propositura de ação penal, bem como zelar, em conformidade com suas competências, pela tramitação prioritária dos respectivos processos administrativos disciplinares instaurados no âmbito das Corregedorias de Polícia.
Art. 4º - O Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana oficiará os órgãos federais e estaduais com atribuições afetas às recomendações constantes desta Resolução dando-lhes ciência de seu inteiro teor.
Art. 5º - Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.
MARIA DO ROSÁRIO NUNES

domingo, 27 de janeiro de 2013

Juíza remete decisão sobre a “Chacina de Unaí” para município onde o crime ocorreu



Raquel Vasconcelos Alves de Lima, juíza substituta da 9ª Vara da Justiça Federal, em Belo Horizonte (MG), declarou-se incompetente para julgar os acusados da “Chacina de Unaí”, conforme informou a Agência Brasil. O processo deve ser remetido para a Vara Federal do município onde ocorreu o crime – o que, de acordo com organizações de direitos humanos que acompanham o caso, pode retardar ainda mais o processo e influenciar no resultado do julgamento dado o poder econômico e político dos envolvidos. A chacina completa nove anos de impunidade nesta segunda.
Em 28 de janeiro de 2004, quatro funcionários do Ministério do Trabalho e Emprego foram assassinados enquanto realizavam uma fiscalização rural de rotina na região de Unaí, Noroeste de Minas Gerais. O motorista Aílton Pereira de Oliveira, mesmo baleado, conseguiu fugir do local com o carro e chegar à estrada principal, onde foi socorrido. Levado até o Hospital de Base de Brasília, Oliveira não resistiu e faleceu no início da tarde. Antes de morrer, descreveu uma emboscada: um automóvel teria parado o carro da equipe e homens fortemente armados teriam descido e fuzilado os fiscais. Erastótenes de Almeida Gonçalves, Nelson José da Silva e João Batista Soares Lages morreram na hora. O caso ganhou repercussão na mídia nacional e internacional.
A Polícia Federal afirmou ter desvendado o crime seis meses depois, com o indiciamento de envolvidos, que incluíram os irmãos Norberto e Antério Mânica, família que é uma das maiores produtoras de feijão do país. O inquérito entregue à Justiça afirmou que a motivação do crime foi o incômodo provocado pelas insistentes multas impostas pelos auditores. Nelson José da Silva seria o alvo principal. Ele já havia aplicado cerca de R$ 2 milhões em infrações à fazenda dos Mânica por descumprimento de leis trabalhistas. Ambos chegaram a ser presos, mas hoje respondem ao processo em liberdade. Após isso, Antério foi eleito (em 2004, com com 72,37% dos votos válidos pelo PSDB) e reeleito (2008) prefeito de Unaí, ganhando e mantendo fórum privilegiado até este ano.
Também foram envolvidos os pistoleiros Erinaldo de Vasconcelos Silva (o Júnior), Rogério Alan Rocha Rios e William Gomes de Miranda; o contratante dos matadores, Francisco Élder Pinheiro (conhecido como “Chico Pinheiro”, que faleceu este ano, aguardando o julgamento em liberdade) e os intermediários Humberto Ribeiro dos Santos, Hugo Alves Pimenta e José Alberto de Castro. Três dos acusados estão presos e um foi solto, pois o crime pelo qual foi denunciado já prescreveu dado o atraso do julgamento. Os outros, estão em liberdade beneficiados por habeas corpus.
De acordo com o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho, os recursos dos réus foram apreciados e negados – inclusive em instâncias superiores. Ou seja, não existia mais razão para protelar os julgamentos. A Corregedoria Nacional de Justiça, acionada pelo Ministério Público Federal, havia informado que a juíza Raquel marcaria o início do julgamento para o mês de fevereiro. O MPF deve recorrer da decisão de remeter o caso para Unaí.
A votação em primeiro turno da Proposta de Emenda Constitucional 438/2001 (que prevê o confisco de propriedades flagradas com escravos e sua destinação à reforma agrária ou ao uso social urbano) na Câmara dos Deputados, em 2004, ocorreu sob a forte comoção pública gerada pelo assassinato dos quatro funcionários do MTE. Isso pode ter influenciado na decisão dos deputados, que aprovaram o texto com algumas modificações. Há parlamentares que eram contrários à aprovação da PEC, mas na votação em plenário, feita por voto aberto, posicionaram-se a favor, provavelmente para não terem sua imagem vinculada à manutenção dessa forma de exploração do trabalho em um momento delicado como aquele, em que a Chacina ainda aparecia na mídia internacional. Passada a comosção, a PEC entrou na geladeira da Câmara, sendo aprovada – após muita pressão popular – em maio do ano passado. Agora, aguarda apreciação do Senado.
Em 2009, o 28 de janeiro se tornou oficialmente o Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, aprovado no Congresso Nacional por proposta do então senador José Nery. Durante uma semana, eventos sobre o tema devem ser realizados em todo o país com o objetivo de que a Chacina de Unaí não fique impune. Mas também sensibilizar a população e aumentar a pressão social para erradicar a escravidão contemporânea. Entre os eventos, estão previstos, na próxima segunda (28), uma reunião da Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae), no Auditório da Procuradoria da República em Minas Gerais, a partir das 10h, e um Ato Público que pedirá o julgamento dos acusados da chacina, em frente ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região em Belo Horizonte (MG).
Repito o que já disse aqui. Não é incompreensível a demora da Justiça porque infelizmente não é. A verdade é que a velocidade de funcionamento de grande parte do sistema judiciário normalmente depende de quem é o réu/acusador. Se for rico, será rápido (se ele quiser que seja rápido) ou lento (se quiser que seja lento) e será julgado conforme suas conveniências, antes ou depois dos demais acusados (se assim for melhor para sua defesa). Se for pobre, a Justiça faz o caminho inverso.
Neste caso, os acusados de serem os mandantes quiseram ser julgados antes dos demais. Dessa forma o que aparecesse nos outros júris não poderia ser usados contra eles. Não conseguiram. Mas o processo foi remetido à Unaí, onde a população elegeu um dos acusados de ser mandante prefeito duas vezes. Isso pode ser considerado uma vitória parcial.
Em novembro de 2008, Antério Mânica foi um condecorados com a Medalha da Ordem do Mérito Legislativo, em cerimônia promovida pela Assembléia Legislativa de Minas Gerais, realizada no Palácio das Artes e “aplaudida por mais de mil convidados”, como explica o site da instituição. O prêmio, que foi considerado por muitos como um desagravo, gerou indignação e mal-estar em parte da sociedade civil e dos deputados mineiros.

População carcerária cresceu 6,8% em seis meses


http://www.conjur.com.br/2013-jan-23/luiz-flavio-gomes-populacao-carceraria-cresceu-68-seis-meses


Por Luiz Flávio Gomes

* A fábrica de encarceramento no Brasil está funcionando eficazmente. O Brasil continua fechando escolas e abrindo presídios. Os últimos dados divulgados pelo Depen (Departamento Penitenciário Nacional) apontaram que o Brasil fechou o primeiro semestre de 2012 com um total de 549.577 presos, um montante superior em 34.995 detentos em relação a dezembro de 2011(Veja: Brasil fechou 2011 com 514.582 presos).

Assim, de acordo com os levantamentos realizados pelo Instituto Avante Brasil, em apenas seis meses (dez./11 — jun./12), a população carcerária brasileira cresceu 6,8%, percentual este que representou o crescimento carcerário de todo um ano, quando olhamos para 2007 e 2008, por exemplo. Trata-se, portanto, de um crescimento muito expressivo, sobretudo num lapso de seis meses. Esse crescimento sugere que podemos fechar o ano de 2012 com um aumento total de 14%, maior taxa desde 2004.

O maior crescimento percentual anual do país se deu entre os anos de 2002 e 2003e até o momento não foi superado, já que neste período, houve um estrondoso aumento de 28,8% na população carcerária brasileira.

O crescimento no número de presos no Brasil é espantoso. Na última década (2003/2012), houve um aumento de 78% no montante de encarcerados do país. Se considerados os últimos 23 anos (1990/2012), o crescimento chega a 511%, sendo que no mesmo período toda a população nacional aumentou apenas 30%.



Contudo, tantas prisões não têm sido capazes de diminuir a criminalidade(o Brasil hoje é o 20º país que mais mata no mundo)nem tampouco de deixar a população brasileira mais tranquila,já que a sensação de pânico e insegurança é cada vez maior e a opinião pública clama por leis mais severas, redução da maioridade penal etc.(Leia: Política brasileira errada não reduz violência).

Por outro lado, tantos aprisionamentos também não têm evitado a reincidência nem tornado os encarcerados pessoas melhores, tendo em vista as condições indignas e desumanas de sobrevivência nas unidades prisionais (Veja:Relatório do Mutirão Carcerário 2010/2011). Diante desse cenário, surgem as indagações: O que fundamenta e para onde está nos levando todo esse encarceramento massivo, sobretudo de gente que não cometeu crime violento?

Com razão dizia o criminólogo norteamericano Jeffery: “Mais leis, mais penas, mais policiais, mais juízes, mais prisões, significa mais presos, porém não necessariamente menos delitos. A eficaz prevenção do crime não depende tanto da maior efetividade do controle social formal (mais prisões), senão da melhor integração ou sincronização do controle social formal (polícia, justiça, penitenciárias) com o informal (família, escola, fábricas, religião etc.)” (veja García-Pablos e Gomes, Criminologia, 2010, p. 344).

O Brasil é um exemplo de encarceramento massivo que diminui a criminalidade nem a sensação de insegurança da população.
_________________________________________________
*Colaborou Mariana Cury Bunduky, advogada, pós-graduanda em Direito Penal e Processual Penal e pesquisadora do Instituto Avante Brasil.

Luiz Flávio Gomes é advogado e professor. Fundador da Rede de Ensino LFG, diretor-presidente do Instituto de Pesquisa e Cultura Luiz Flávio Gomes.



Revista Consultor Jurídico, 23 de janeiro de 2013



sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Sobre a audiência pública com povos indígenas

Foto: Representantes Gavião denunciando a violência em Amarante.Foto: Edilson Krikati falando na audiência pública, em São Luís.


Nesta quinta-feira (24), a Sociedade Maranhense de Direitos Humanos (SMDH) e o Conselho Indigenista Missionário (CIMI) solicitaram uma audiência pública com o presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, Domingos Dutra (PT) e com o presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-MA, Luis Antonio`Pedrosa, para debater a situação dos índios de várias etnias do Estado. A reunião ocorreu na sede do sindicato dos bancários, no centro histórico de São Luís.
A situação mais grave detectada ainda é a do povo Gavião Pukobjê, do município de Amarante. Eles estão sofrendo ameaças  por parte de madeireiros, desde que tomaram a iniciativa de apreender quatro caminhões e um trator, de propriedade dos madeireiros, que faziam extração ilegal no interior da Terra Indigena Governador. Os índios denunciam que, em função das hostilidades, estão impedidos de entrar na cidade de Amarante, inclusive para estudar e receber atendimento médico. A estrada vicinal que corta a TI encontra-se interditada pelos índios, durante à noite, onde somente transitam pessoas doentes.  Os índios afirmaram também que vereadores, a prefeita e secretários municipais tentaram negociar a liberação dos caminhões, inclusive propondo quantia em dinheiro para os índios, que não foi aceita. Os caminhões foram entregues à Polícia Federal e ao IBAMA, mas até agora ninguém foi preso. Várias lideranças indígenas estão ameaçadas de morte por conta disso.
 O encontro teve a participação de quatro povos indígenas (Guajajara, Krenyê, Krikati e Gavião Pukobjê), os quais apresentaram as demandas e necessidades de cada comunidade.

Representantes do povo Krenyê, residentes na periferia de Bacabal, também denunciaram que o governo federal lhes nega o direito de ter um território. O processo deles está tramitando vagarosamente. Enquanto isso, passam fome e toda sorte de necessidades. O Povo Kreniê foi retirado do seu território originário, na região de Bacabal, na década de 70, pelo antigo SPI, e espalhado por várias terras indígenas, em Santa Inês, Bom Jardim e Alto Turi. 

O problema comum a todos os territórios, no entanto, é intrusão para a extração ilegal de madeira nas florestas. O Maranhão, é o Estado que reune cinco das 20 terras mais invadidas do país, com os principais registros de conflitos. A estratégia de combate a esse tipo de intrusão não surtem o efeito desejado, uma vez que os madeireiros sempre retornam às áreas e raramente são punidos.

A relações desses grupos sociais com índios, políticos e autoridades locais também dificulta as operações repressivas. De modo geral, o modelo de desenvolvimento adotado pelas cidades próximas dos territórios indígenas e unidades de conservação passa pela exploração ilegal de madeira.

O fato é que essa  exploração está causando o esgotamento das fontes de alimentos e dos recursos hídricos nas reservas, além do desequilíbrio do processo de organização interna das aldeias.

Anísio Guajajaras, do município de Bom Jardim, informou que a exploração dos recursos hídricos e a criação extensiva do gado reduziram para 15 mil hectares a área ocupada pelos indígenas da região, de uma extensão territorial que abrangia 60 mil hectares antes da chegada dos exploradores. Ele informou que já foram encaminhados documentos aos órgãos competentes, mas que nenhuma medida efetiva teria sido tomada para a proteção dos índios. Por lá, as lideranças indígenas também estão sendo ameaçadas.

No fim do encontro, o deputado federal Domingos Dutra afirmou que os encaminhamentos da discussão se dariam de acordo com a situação de cada povo, devendo ser agendadas reuniões com os ministros da justiça e do meio ambiente, para solicitar dessas autoridades executivas providências imediatas em relação à questão indígena.

Além disso, o parlamentar considerou a necessidade de se acionarem forças de segurança, como a Força Nacional e a Polícia Civil maranhense, a fim de garantirem a segurança dos povos ameaçados pelos grupos invasores.

Domingos Dutra também afirmou que novas discussões devem ser realizadas, com o objetivo de elaboração, por representantes dos próprios indígenas, de uma proposta de segurança e preservação dos territórios, segundo as experiências dos próprios povos afetados.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Réquiem para o sistema prisional



Não é nada boa a situação do sistema penitenciário do Estado. As notícias de interdição de delegacias no interior revelam que persistem os mesmos problemas de ausência de vagas nas Unidades Prisionais.

Lentamente, as notícias de execução de presos confirmam um gradual, mas firme retrocesso. 

Há poucos dias, o Grupo de Monitoramento do Sistema Penitenciário discutia a possibilidade de encerramento das atividades das Apacs no Estado. Por um triz não foram extintas.

Próxima semana, haverá paralisação de advertência dos agentes penitenciários. Já avisaram que não haverá visita na quarta feira, uma notícia que sempre deixa a comunidade carcerária sob tensão.

Na quarta-feira (23), o interno Pedro Araujo da Silva, 35, foi morto a chuçadas no Presídio São Luís II. Ele havia chegado no dia 18 de Zé Doca.

Um princípio de motim teria sido controlado pelo Batalhão de Choque da Polícia Militar no CDP de Pedrinhas na tarde desta quinta-feira (24).

Para completar, Paulo Rogério Barbosa Soares, 29, preso do CDP de Pedrinhas, foi encontrado morto na ala delta da unidade, com uma chuçada no peito, logo depois de controlado o princípio de rebelião.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Comissão da OEA admite analisar caso Vladimir Herzog


http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2013/01/comissao-da-oea-admite-analisar-caso-vladimir-herzog.html

22/01/2013 19h47- Atualizado em 23/01/2013 11h17

Jornalista foi morto em dependência do Exército durante a ditadura militar.

Petição busca responsabilização internacional do Estado brasileiro.

Do G1 SP

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA) admitiu oficialmente o caso Vladimir Herzog, por meio de um relatório de admissibilidade aprovado em novembro de 2012 e divulgada nesta terça-feira (22).

Em 2009, a Comissão Interamericana recebeu uma petição em que foi reivindicada a responsabilização internacional do Estado brasileiro pela detenção, tortura e morte do jornalista Vladimir Herzog ocorrida em dependência do Exército em 25 de outubro de 1975 e a contínua impunidade dos autores devido à Lei da Anistia. O Estado alega nas respostas à petição que não há omissão, já que reconheceu sua responsabilidade pela morte de Herzog.

A Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República afirmou em nota que o governo federal respeita a decisão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos de acolher o caso e reafirma que o esforço do Brasil é fortalecer a democracia com o esclarecimento pleno das circunstâncias dos desaparecimentos forçados durante a ditadura militar. Segundo a SDH, para este objetivo foi instituída a Comissão Nacional da Verdade. A SDH também afirmou que o Estado brasileiro reconhece desde 11 de abril de 1996 a sua responsabilidade pela morte de Herzog.

Segundo o Instituto Vladimir Herzog, a decisão do órgão da OEA estabelece que não há empecilhos formais ao prosseguimento da denúncia e dá início a uma nova fase para definir quanto à responsabilidade internacional do Estado brasileiro pela tortura e morte do jornalista.

"A Comissão Interamericana enxerga que existem fatos suficientes para admitir essa ação da família contra o Estado brasileiro, pedindo justiça no caso do meu pai. Claro que agora tem de vir uma resposta do Estado brasileiro, mas basicamente, o Estado brasileiro não concordando, se coloca em uma situaçlão de oposição à comunidade internacional e à Organização dos Estados Americanos, da qual o Brasil é signatário", disse Ivo Herzog, filho de Wladimir Herzog e presidente do instituto que leva o nome do pai.

O caso de Vladimir Herzog foi denunciado à CIDH em 2009 pelo Centro pela Justiça e o Direito Internacional, pela Fundação Interamericana de Defesa dos Direitos Humanos e pelo Grupo Tortura Nunca Mais de São Paulo. Apesar das tentativas em âmbito interno, nenhum dos envolvidos na morte do jornalista foi responsabilizado penalmente pela tortura e morte de Herzog.
De acordo com o Instituto Vladimir Herzog, a decisão de admitir o caso segue a jurisprudência firme do Sistema Interamericano de Direitos Humanos no sentido de que “são inadmissíveis as disposições de anistia, as disposições de prescrição e o estabelecimento de excludentes de responsabilidade” que pretendam obstaculizar a investigação e o julgamento dos perpetradores de graves violações.

Supremo recebe ADIs contra dispositivos do novo Código Florestal


http://stf.jusbrasil.com.br/noticias/100305921/supremo-recebe-adis-contra-dispositivos-do-novo-codigo-florestal


A Procuradoria-Geral da República (PGR) ajuizou três Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs 4901, 4902 e 4903) com pedidos de liminar no Supremo Tribunal Federal (STF) nas quais questiona dispositivos do novo Código Florestal brasileiro (Lei 12.651/12) relacionados às áreas de preservação permanente, à redução da reserva legal e também à anistia para quem promove degradação ambiental. Nas ações, a PGR pede que seja suspensa a eficácia dos dispositivos questionados até o julgamento do mérito da questão. Também foi pedida a adoção do chamado rito abreviado, o que permite o julgamento das liminares diretamente pelo Plenário do STF em razão da relevância da matéria.
ADI 4901
Na primeira ADI (4901), que terá a relatoria do ministro Luiz Fux, a procuradora-geral da República em exercício, Sandra Cureau, questiona, entre outros dispositivos, o artigo 12 (parágrafos 4º, 5º, 6º, 7º e 8º), que trata da redução da reserva legal (em virtude da existência de terras indígenas e unidades de conservação no território municipal) e da dispensa de constituição de reserva legal por empreendimentos de abastecimento público de água, tratamento de esgoto, exploração de energia elétrica e implantação ou ampliação de ferrovias e rodovias.
A PGR aponta os prejuízos ambientais decorrentes das modificações legislativas e argumenta que o novo Código fragiliza o regime de proteção das áreas de preservação permanente e das reservas legais, que podem ser extintas de acordo com a nova legislação. Outros pontos questionados pela PGR na primeira ADI são os que preveem a compensação da reserva legal sem que haja identidade ecológica entre as áreas e a permissão do plantio de espécies exóticas para recomposição da reserva legal. O novo Código ainda permite a consolidação das áreas que foram desmatadas antes das modificações dos percentuais de reserva legal, item que também é questionado.
ADI 4902
Distribuída à ministra Rosa Weber, a ADI 4902 questiona temas relacionados à recuperação de áreas desmatadas, como a anistia de multas e outras medidas que desestimulariam a recomposição da vegetação original. O primeiro tópico questionado, o parágrafo 3º do artigo 7º, permitiria novos desmatamentos sem a recuperação daqueles já realizados irregularmente. O artigo 17, por sua vez, de acordo com a ADI, isentaria os agricultores da obrigação de suspender as atividades em áreas onde ocorreu desmatamento irregular antes de 22 de julho de 2008.
Dispositivos inseridos no artigo 59, sustenta a ação, inserem uma absurda suspensão das atividades fiscalizatórias do Estado, bem como das medidas legais e administrativas de que o poder público dispõe para exigir dos particulares o cumprimento do dever de preservar o meio ambiente e recuperar os danos causados. Nos artigos 61 e 63 estaria presente a possibilidade de consolidação de danos ambientais decorrentes de infrações anteriores a 22 de julho de 2008. Os trechos impugnados, alega a PGR, chegam ao absurdo de admitir o plantio de até 50% de espécies exóticas em áreas de preservação permanente.
ADI 4903
Na ADI 4903, a PGR questiona a redução da área de reserva legal prevista pela nova lei. Com base no artigo 225 da Constituição Federal, a procuradora-geral Sandra Cureau pede que sejam declarados inconstitucionais os seguintes dispositivos da Lei nº 12.651/12: artigo 3º, incisos VIII, alínea b, IX, XVII, XIX e parágrafo único; artigo 4º, III, IV, parágrafos 1º, 4º, 5º, 6º; artigos 5º, 8º, parágrafo 2º; artigos 11 e 62.
Entre os pedidos da ação, a PGR ressalta que, quanto às áreas de preservação permanente dos reservatórios artificiais, deverão ser observados os padrões mínimos de proteção estabelecidos pelo órgão federal competente [Conselho Nacional de Meio Ambiente]. O ministro Gilmar Mendes é o relator desta ADI. VP,FT,EC/EH