sábado, 12 de novembro de 2011

Identidades contra o Beija-Flor Cagão


As identidades africanas do Estado, fizeram aqui proliferar terreiros do culto Mina, a partir das culturas jeje daomeanas (Benin-África Ocidental), das culturas iorubanas (Nigéria, Togo, parte do Benin) e das culturas de escravos provenientes da Costa do Ouro, atual República de Gana, lugar de onde veio a etnia Fanti-Ashanti.

Essa identidade religiosa foi se afirmando com a participação de entidades esprirituais de dentro e de fora do panteon africano, como é o caso dos "caboclos", e dos rituais de pajelança, de induvidosa contribuição indígena.

O etnocentrismo Europeu e a modernidade neoliberal tenta suplantar a tradicionalidade presente na identidade maranhense, negando essa religiosidade que influi decisivamente para a afirmação de nossas manifestações culturais, como o tambor de crioula, o bumba-meu-boi e a não menos importante medicina natural, herança da inspiração xamânica.

De fato, dos índios, herdamos, no aspecto reiligioso, os rituais de Cura ou pajelança, mais conhecida como "brinquedo" ou "toque de maracá", muito praticado ritualmente nos terreiros de São Luís, onde o curador ou pajé, através de uma sessão espiritual, incorpora variadas entidades espirituais, incluindo espíritos de animais. Daí veio a contribuição dos banhos, dos chás, partilhada entre nós até pelos que não desconfiam das suas origens.

 Em tempos neoliberais, nossa tradições são atiradas num jogo competitivo, onde a religião se confunde com uma empresa mercantil. Precisa de marketing, para motivar a arrecadação dos dízimos juntos aos fiéis, ávidos por soluções imediatas aos seus problemas. São as religiões que precisam de cantores e grandes espaços televisivos, bancados a peso de ouro, para inspirar as conversões espetaculares, como que relembrando as cruzadas medievais.

 Em tempos de "beija-flor cagão" (como cunhou Joaquim Itapariy), a mídia nega e as autoridades renegam o próprio povo, ao esconder a identidade maranhense que se afirma no silêncio e na discrição do terreiro.

Fora do jogo neoliberal, os terreiros não competem e não precisam convocar o fiel à conversão. O povo-de-santo não se converte, por argumentos retóricos de líderes religiosos: o santo (como experiência mística individual) traz ele ao terreiro - a identidade é uma pulsão.

Essa religiosidade, embora negada por muitos, reflete com precisão o cenário de uma luta pela afirmação da identidade.

São muitos os relatos, dentre nós, dos acometidos por transtornos mentais, motivados pela renúncia ao "Santo". Nas comemorações dos quatrocentos anos, nossa identidade foi alienada (vendida) a peso de ouro para a indústria do espetáculo mercantil. Uma letra qualquer diz o que somos, antes que possamos nos manifestar: é o mercado que tenta ditar a identidade maranhense.

Soubemos entristecidos que até as índias que ornamentarão o espetáculo dessa alienação mental foram escolhidas dentre as dançarimas superficializadas do Boi de Morros. Lutamos nós contra nós mesmos, na esquizofrenia globalizante em que o pós-moderno nega a tradição.

A identidade sobreviverá à homogeinização neoliberal, porque os que se negam são lançados no abismo da alienação. Nas comemorações dos quatrocentos anos, mesmo que alijados, como sempre, da mesa farta do orçamento público, jamais deixaremos de ser maranhenses. Se o governo diz que nos vende, nesse balcão, nossa identidade se recusa a ser mercadoria.

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