domingo, 13 de novembro de 2011

Capitalismo ou democracia - por Emir Sader

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Até um certo momento os grandes empresários mantinham um baixo perfil. Quase tinham vergonham de serem tão ricos em sociedades tão pobres. Ou também preferiam não chamar a atenção sobre as fontes da sua riqueza.

A passagem à hegemonia neoliberal, com a criminalização do Estado e da política, e a exaltação do mercado e das empresas, promoveu também a imagem dos grandes empresários. Começaram a proliferar as biografias e auto-biografias de empresários. Todos teriam nascido pobres e ascendido com muito trabalho, enfrentando todas as dificuldades, exibindo-se assim como exemplos para todos das possibilidades de ascensão ampla e irrestrita.

Da apologia dos empresários como modelo de cidadãos se passou às tentativas de sua promoção como bons governantes. Se deram certo dirigindo suas empresas, teriam que dar certo como governantes. Ainda mais que passou ao centro da agenda política o tema dos “excessivos gastos do Estado”. Ninguém melhor do que um empresário para racionalizar os gastos do Estado.

Como se a lógica da busca do lucro das empresas privadas se aplicasse ao Estado. A empresa privada busca lucros e dar satisfação aos acionistas. O Estado tem que defender os direitos da cidadania, de todos, privilegiando especialmente os mais pobres. Roberto Campos dizia que as empresas estatais deveriam dar lucro, da mesma forma que as empresas privadas. Isto é, queria que o direito de todos fosse prejudicado em favor da eficiência. Os serviços públicos, por exemplo, deveriam obedecer a esses critérios, ao invés de garantir o direito do acesso de todos à educação, à moradia, à saúde publica, à luz, à agua.

Berlusconi tornou-se o modelo mesmo do tipo de empresário de sucesso que se propôs a governar o pais com os mesmos critérios das suas empresas. Como muitos, ele encabeça um grande conglomerado de empresas, de distintos setores, incluindo a Fininvest e o monopólio dos meios de comunicação. Este aspecto, multiplicado pela mídia estatal, permitiu aumentar ainda mais o controle sobre a formação da opinião pública.

Durante quase duas décadas Berlusconi dirigiu a Itália, coincidindo com a decadência do país, misturado com casos reiterados – e assumidos – de escândalos sexuais e de corrupção, promovendo a vulgaridade e o escracho como estilo de política. Não foi a oposição, nem as mobilizações populares ou as denúncias que terminaram derrubando Berlusconi, mas ataques especulativos, mostrando que nem um grande empresário está imune a eles.

Pinera se elegeu no Chile com a mesma fama de empresário de sucesso. Impulsionado pela ditadura militar - em que seu irmão foi ministro do Trabalho do Pinochet, tristemente célebre por ter introduzido o tema da “flexibilização laboral” -, o grupo se expandiu, nas asas da expansão da Lan Chile, chegou até a comprar o Colo Colo, mesmo que torcendo para outro time.

Pinera gozou de uma lua-de-mel, mas logo começaram a se acumular crises, com mobilizações sociais contra o governo de diferentes setores, até que os estudantes expressaram o descontentamento com a privatização da educação publica – realizada por Pinochet -, catalizando o descontentamento popular. A capacidade de mobilização dos estudantes – que conseguiu agregar o movimento sindical – gerou uma crise política nacional, com o desgaste radical da popularidade de Piñera. De nada lhe adiantou sua capacidade de gerenciamento empresarial. O Estado é outra coisa, pertence à esfera política, é radicalmente diferente do mercado.

Como aqui, os governos neoliberais governavam para 1/3 da população, isto é, para o mercado, para os que tem poder aquisitivo garantido. Para isso basta um empresariado ou alguém com mentalidade empresarial. As políticas de inclusão social promoveram o resgate da política, da esfera dos direitos, do povo como cidadania. Disso os empresários, com sua mentalidade de busca do lucro, não entendem. A lógica do lucro é contraditória com a democracia.

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