quinta-feira, 19 de abril de 2012

Presidente do TSE diz que o povo merece a sobrecarga dos juízes no período eleitoral


http://www.em.com.br/app/noticia/politica/2012/04/18/interna_politica,289425/presidente-do-tse-diz-que-o-povo-merece-a-sobrecarga-dos-juizes-no-periodo-eleitoral.shtml

Bertha Maakaroun -
Publicação: 18/04/2012 06:00Atualização: 18/04/2012 07:44

 (16/02/2012 Fellipe Sampaio/STF/Divulgação)
Ela é a primeira mulher a assumir a Presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Para além do gênero, a ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, de 58 anos, que conduzirá, sob a vigência da Lei Ficha Limpa, as eleições municipais em 5.564 cidades brasileiras, tomará posse hoje, numa solenidade rápida e austera. Num ano eleitoral em que o caso do mensalão entrará em pauta do Supremo Tribunal Federal (STF), o acúmulo de funções não assusta essa magistrada: ela frequenta poucos eventos sociais e trabalha 16 horas por dia. Entre um tribunal e outro, Cármen Lúcia garante: estará habilitada a julgar o mensalão assim que pautado pela Presidência do STF.

“Como dizia Milton Campos, acho que se espera de qualquer juiz é que esteja sempre em seus cálculos a conduta austera como é própria da República e modesta como convém aos mineiros", afirma essa ministra que cultiva hábitos republicanos de preferir os táxis aos carros oficiais, não se furtando às filas de check-in nos aeroportos, carregando a própria valise.

Entre os desafios e prioridades administrativas de sua gestão estão a implantação do processo eletrônico na Justiça Eleitoral, a continuidade do processo de implantação da biometria, além de dar a maior celeridade possível aos julgamentos dos candidatos atingidos pela Ficha Limpa, evitando situações de insegurança jurídica. Há ainda a análise, caso a caso, do uso das novas mídias nas campanhas políticas. “Nem se pode permitir, num Estado de direito, que haja um espaço livre para qualquer pessoa sentir-se livre para atingir outro, a reputação e até mesmo criando situações de dúvidas sobre alguém que interferem na eleição de candidato, nem se pode judicializar toda manifestação livre dos cidadãos que fazem uso dessas novas ferramentas", considera.

O que marcará a sua gestão à frente do TSE? Quais são as suas principais metas?

Há um dever de tomar todas as providências para que se tenha essa administração de forma a que se chegue ao processo a contento. Por outro lado, há um número significativo de demandas, mesmo ainda de prefeitos eleitos em 2008, que precisam ser julgadas até o próximo mês de maio para que se tenha a tranquilidade de o eleitor e do interessado em se candidatar, sobre a sua situação. Esta será a primeira eleição sujeita à lei denominada Ficha Limpa, o que talvez leve a uma demanda judicial maior, que também terá de ser mais rápida para não permitir situações de insegurança jurídica. Temos ainda a continuidade do processo de biometria, que a cada eleição cobre um número maior de eleitores. A mudança de direção em tribunal é natural e o processo eleitoral é um continuum, quer dizer, dá-se continuidade ao que está em curso e aperfeiçoa-se dando os passos necessários para sempre maior segurança ao processo eleitoral e mais rapidez ao processo judicial eleitoral. Esses temas que têm sido objeto das preocupações das administrações anteriores serão também, primordialmente, as minhas. Preocupa-me o atraso do processo eletrônico na Justiça Eleitoral, do que se ressentem os tribunais regionais eleitorais, o que será uma de minhas prioridades levar a efeito.

Apesar de a Justiça Eleitoral ser considerada ágil, muitos dos condenados em primeira e em segunda instância eleitos em 2006 terão praticamente completado o seu mandato quando transitarem em julgado. Na avaliação da senhora, isso coloca em xeque a Justiça Eleitoral?

Não, porque a Justiça eleitoral é considerada muito eficiente. Esse é um passivo importante, porém pequeno se analisado em relação ao universo de 5.564 municípios onde houve eleições em 2008 e esse é o número de eleições que serão também realizadas este ano. Se hoje houver 50 casos por julgar, é no total de mais de cinco mil municípios que temos de avaliar esse que você chama de passivo. Aliás, um universo que é ainda maior, pois um número enorme de processos foram julgados e deram causa a eleições suplementares. Mas não há qualquer dúvida de que nosso objetivo é zerar os processos para impedir que um município sequer viva esta situação, de ainda ter prefeitos e vereadores cassados por decisões originárias, mas sem terminar definitivamente o processo, pelo que muitos continuam nos cargos, apesar das irregularidades.

Resolvida a questão da aplicação da Ficha Limpa, há outra grande indefinição nas eleições deste ano: o PSD terá tempo no horário eleitoral gratuito?
Nesse caso, houve pedido formulado pelo partido e que foi distribuído para o ministro Arnaldo Versiani, que concluiu pela concessão de cinco minutos, tempo mínimo para cada partido. Contra a sua decisão foi interposto agravo regimental, que deverá ser julgado pelo plenário. Sou relatora de pedido também formulado pelo partido para a propaganda no ano de 2013. Como esse segundo depende e terá a mesma solução daquele primeiro, preferi aguardar a conclusão do primeiro.

Com as mídias digitais definitivamente incorporadas às campanhas políticas, e dentro de um contexto em que elas são mais empregadas para ataques à reputação, como deve ser, em sua avaliação, o tratamento pela Justiça Eleitoral?

Esse é um desafio novo para a Justiça Eleitoral. As novas mídias produzem situações a serem analisadas caso a caso, porque nem se pode permitir, num estado de direito, que haja um espaço livre para qualquer pessoa atingir o outro, a reputação e até mesmo criando situações de dúvidas sobre alguém que interferem na eleição de candidato, nem se pode judicializar toda manifestação livre dos cidadãos que fazem uso dessas novas ferramentas. A alternativa haverá de ser caminhar nessa nova trilha com prudência e de forma casuística, ou seja, avaliar em cada situação o que tenha ocorrido e seus efeitos na vida e na proposta de quem se afirme atingido.

O STF tem em sua pauta, este ano, alguns temas complexos que dividem o plenário. O caso mensalão é um deles. Esse julgamento poderá “contaminar” o pleno do TSE?

A demanda no período eleitoral é mesmo muito maior, mas é periódica, tem-se um mandato. O povo brasileiro merece este período de sobrecarga, que é mais sacrificada do ponto de vista pessoal, mas que é função constitucional do juiz do Supremo Tribunal. Não dá para fazer praticamente nada além disso, como ter uma vida social ou cultural. Mas, insisto, é apenas uma fase na vida, portanto exerço com todo o empenho, querendo muito que tudo saia o que melhor atenda os cidadãos dos quais somos apenas servidores.

O julgamento do mensalão deve, em sua opinião, acontecer antes de julho, a partir de quando partidos e candidatos podem começar a campanha eleitoral?

Não sei como o ministro relator e revisor estão encaminhando. Todos nós, juízes, estamos estudando o processo porque se trata de um processo complexo, com muitos volumes, com muito trabalho, 600 testemunhas, muitos documentos. Quando pautado pelo presidente do STF, imediatamente estarei habilitada a votar.

Em sua opinião, esse julgamento poderá ter impacto na decisão do eleitor?
Não sei se impactará. Só o eleitor poderá dizer. Não compete ao STF julgar como compete ao eleitor votar. O juiz constitucional não pode deixar de prestar jurisdição em qualquer caso por eventual impacto que poderá causar. Portanto, é o eleitor quem informado deve decidir.

A senhora tem um perfil austero. Como será o ritmo de sua gestão?
Como dizia Milton Campos, acho que se espera de qualquer juiz é que esteja sempre em seus cálculos a conduta austera como é própria da República e modesta como convém aos mineiros. Pretendo exatamente seguir esses que nos ensinaram que nós servidores existimos para servir, para cumprir determinada finalidade. Por mais que possa ser agradável a presença em eventos externos, nem sempre é possível quando se tem um alentado trabalho para fazer com que os julgamentos aconteçam. É preciso afastarmos a pecha de morosidade que toma conta do Judiciário, que é verdadeira, não é nossa culpa, mas é nossa responsabilidade. 

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