O depoimento do Frei Carlos de Arary, missionário Capuchinho, quando aqui esteve, em 1951, por ocasião de uma reportagem especial que fazia para o periódico católico “A Voz de São Francisco”, enfocando os 50 anos do massacre do Alto Alegre, é o retrato fiel de um fato histórico pessimamente interpretado por esse segmento da Igreja Católica, até os dias atuais. Dizia o Frei:
“A fim de assistirmos à inauguração da Igreja – Monumento aos Mártires de Alto Alegre, à transladação das relíquias das vítimas da hecatombe de 13 de março de 1901, para o novo templo, e à ordenação de três novos sacerdotes capuchinhos, na Igreja – Monumento, partimos do Ceará, no dia 16 de dezembro próximo passado rumo à Barra do Corda (...)".
O chamado "Monumento aos Mártires de Alto Alegre" continua exposto na Matriz de Barra do Corda. As imagens das "vítimas" estão também expostas na fachada da Igreja.
Estamos com certeza diante de mais um episódio protagonizado pela Igreja Católica que mereceria uma atenção do Papa Francisco.
O chamado "massacre de Alto Alegre" e suas rituais homenagens sempre esconderam a análise crítica sobre a presença dos Capuchinhos na região, e o modelo de suas pretensões evangelizadoras autoritárias sobre os indígenas guajajara.
O episódio, em verdade, revela uma das principais guerras de resistência do povo indígena do país, contra o massacre de suas identidades étnicas.
Em 1901, o povo guajajara se levantou contra o modelo missionário evangelizador que atacava sua forma de vida tradicional e sua religiosidade.
Os indígenas de várias aldeias reunidas da região atacaram com armas de fogo e mataram os religiosos da Missão de Alto Alegre - um enclave evangelizador dentro do território indígena, que internava crianças e imobilizava a força de trabalho dos índios para o modelo das missões.
Logo em seguida, tomaram de assalto várias fazendas da região entre Grajaú e Barra do Corda, espalhando o medo e o terror pelo interior do estado. Aproximadamente 1000 indígenas foram mortos em represália.
A memória desse povo ainda guarda, no entanto, o ocorrido. A disputa do Alto Alegre está relacionada ao conflito do povoado São Pedro dos Cacetes (um episódio mais recente para a sociedade não-indígena local).
De um lado, índios Tentehar/guajajara e, de outro, os moradores dos povoados São Pedro dos Cacetes, Alto Alegre e Centro do Meio (também denominado Centro do Felipe Preto), incluindo-se uma missão de frades capuchinhos, que lutavam pela posse de parte da área demarcada sob a denominação de terra indígena Cana Brava/Guajajara.
Pois bem. Até recentemente a missão dos Capuchinhos, mesmo depois da tragédia do Alto Alegre, tentava legitimar o esbulho da terra indígena, somando forças com os povoados não-indígenas que ali se radicaram à força.
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