terça-feira, 17 de dezembro de 2019

GUAJAJARA: UMA LONGA HISTÓRIA DE RESISTÊNCIA

Nas postagem anterior relembrei das disputas entre não-indígenas e o povo guajajara. A área onde se instalou a Missão dos Capuchinhos Lombardos continuou historicamente alimentado os conflitos com os indígenas até o ano de 1996.

Esta área está localizada nos municípios de Jenipapo dos Vieiras, Barra do Corda e Grajaú.

Os povoados intrusos eram compostos por trabalhadores rurais e pequenos comerciantes e se instalaram na terra indígena a partir da Missão dos Capuchinhos Lombardos (no século XIX).

O povo Guajajara, mesmo depois da brutal repressão do levante de Alto Alegre, jamais aceitou a intrusão.

No final da década de setenta, os conflitos entre índios e não-indígenas se agravaram. A FUNAI conseguiu a retirada dos invasores que habitavam o Alto Alegre e o Centro do Meio, mas o povoado São Pedro dos Cacetes permaneceu no local.O fato continuou a gerar contínuos conflitos, que se agudizaram no início dos anos 90.

Fato curioso de se relembrar é que, em 1979, foi firmado o Convênio nº 080/79, entre a FUNAI e o Estado do Maranhão, para transferências das famílias ocupantes das terras indígenas - Lagoa Comprida, São Pedro dos Cacetes e Alto Alegre.

A FUNAI repassou para o Estado do Maranhão cento e sessenta milhões de cruzeiros, em duas parcelas. Embora tenha recebido estes valores, o Estado não cumpriu sua obrigação contratual e, desta forma, o Povoado São Pedro dos Cacetes permaneceu lá com seus problemas.

Alguns acontecimentos favoreceram o acirramento dessa disputa secular.

a) a demarcação, em 1977, e a homologação da terra indígena Canabrava, em 1991;

b) uma liminar concedida pela justiça federal em 1993, obrigando a desintrusão;

c) A posição formal contrária à desintrusão das autoridades municipais de Grajaú (prefeito e 18 vereadores);

d) dois vereadores de Grajaú, residentes no povoado passaram a incentivar o loteamento da área, facilitando a entrada de mais pessoas não-indígenas;

e) o ataque a tiros a nove indígenas grávidas por moradores de São Pedro dos Cacetes;

f) a morte de um dos fazendeiros da região, atribuída aos indígenas;

g) A vingança da família do fazendeiro, ocorrida no mesmo dia, com a colaboração da Polícia Militar, resultando no homicídio de dois indígenas Guajajara, cujos corpos foram jogados no rio Mearim;

h) os limites dos territórios reivindicados pelos Guajajaras foram desconsiderados pelos decretos de demarcação;

i) a posição ambígua da FUNAI, ora reconhecendo o território,ora fazendo o jogo dos interesses religiosos e ruralistas;

j) a proposta de elevação do povoado de São Pedro dos Cacetes à categoria de município, constante do art. 48 do Ato das Disposições transitórias da Constituinte estadual de 1989s, barrada pelo STF;

Por fim, a retirada do povoado do Alto Alegre ocorreu em 1981. A do São Pedro dos Cacetes, que deveria ter ocorrido, também em 1981, só foi efetivada no ano de 1996.

Foram portanto cerca de 26 anos de disputa pela posse da terra, com o incitamento da população não-indígena local contra os indígenas.

Os problemas envolvendo a desintrusão agravaram a ambiência de preconceito e hostilidades na região. Reassentados não receberam indenizações compatíveis com as benfeitorias, políticos fizeram promessas de compensações que nunca ocorreram.

Os não-indígenas que foram retirados da T.I. e foram morar em povoados dos arredores compuseram e incentivaram a opinião pública dominante entre não-indígenas contra o povo Guajajara até os dias atuais.

Dessa forma, do início da contato, em 1615, com as diversas formas de escravidão instituídas, de 1985 (ano da implantação do projeto missionário dos Capuchinhos), passando pela desintrusão (concluída apenas na década de (90), acrescentando-se a invasão do território pela Eletronorte, cujas compensações nunca foram negociadas a contento, os conflitos prosseguem.

Desde o primeiro contato registrado de colonizadores com os Guajajara, em 1615, por uma expedição francesa às margens do rio Pindaré, na verdade, nunca houve trégua.

Até meados daquele século, os Guajajara foram alvo de expedições de portugueses que buscavam indígenas para escravizar. Muitas aldeias foram exterminadas e a preagem de índios era institucionalizada.

As missões dos jesuítas se instalaram nos territórios guajajara entre 1653 e 1755. Em troca de proteção contra a escravidão dos fazendeiros, instituíram um sistema de dependência e servidão, que desorganizava seu modo tradicional de organização social.

Na metade do século 19, após a saída dos jesuítas do Brasil, o trabalho dos Guajajara voltou a ser explorado por fazendeiros locais. O modelo de semi-escravidão foi reinstalado.

Além da missão dos Capuchinhos, em 1895, entre 1960 e 1970 vieram os fazendeiros, empurrando posseiros para dentro do território guajajara. As madeireiras chegaram na década de 80.

Em 1992, assassinos de aluguel sequestraram e mataram o filho de um cacique guajajara da região. No dia seguinte, os indígenas mataram um trabalhador rual e posteriormente, cerca de mil indígenas bloquearam a rodovia, fazendo 400 reféns que por ali transitavam.

Ainda nos anos 2000 eram retiradas cerca de 30 caminhões de madeira das terras indígenas dos guajajara.Em 2007, ocorreram novos episódios violentos com madeireiros, que realizaram manifestações resultantes em conflitos armados com os indígenas.

A disputa deixou vários feridos e resultou em bloqueios de rodovias, saques de caminhões e lojas e destruição de equipamentos do Ibama.

Em 2015, madeireiros ilegais atacaram uma equipe do Ibama que fiscalizava a Terra Indígena Arariboia, onde havia suspeita de queimadas ilegais.

Os dados sobre a violência contra os guajajara e outros povos do Maranhão foram postados anteriormente. No espaço de dez anos, de 35 mortos indígenas, 26 são da etnia guajajara.

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