segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Falando no pé de ouvido

Quando voltei do recesso, fiquei surpreso com várias reportagens, a respeito do sistema prisional maranhense.

Chamou a minha atenção principalmente uma suposta determinação de detentos, para que criminosos praticassem estupros na ruas de São Luís. No site da Folha, por exemplo, se diz que, durante a inspeção, de 10 a 20 detentos teriam relatado que mulheres de presos ameaçados eram estupradas nas visitas ao presídio.

O que pior: tais estupros seriam praticados também fora dos muros dos presídios. Em pesquisa, no google, sobre esse assunto, encontrei simplesmente 43 registros. A notícia foi reproduzida histericamente pelo Brasil afora.  Pudera. Da forma com que foi colocada, quis dizer que a temporada de estupros estava aberta, nas ruas de São Luís. Para mim, soou estranha, visto que não é prática das facções a incitação de estupros.

Depois veio um vídeo de um suposto detento com a perna dissecada. A notícia também foi para a Folha de São Paulo e fundamentou o relatório da inspeção do CNJ. Segundo a própria Folha de São Paulo, o vídeo teria sido enviado pelo sindicato dos agentes penitenciários,  um adversário histórico de Sebastião Uchoa, titular da Sejap.

No blog do Gilberto Leda, consta a informação de que a entidade dos agentes penitenciários seria historicamente ligada à oposição no  Maranhão. Menos, Gilberto. É mais razoável admitir que se trata de uma disputa de frações, dentro do próprio grupo Sarney.

O fato é que o vídeo não tem mesmo nenhuma relação com o sistema prisional maranhense e já circulava na rede  desde 2011

Por último, presenciei quando a comissão  foi avisada por agentes penitenciários que não poderíamos adentrar a determinados pavilhões, porque simplesmente era dia de visita íntima. Confesso que não vi nenhum impedimento decorrente de determinações de facções criminosas, mas principalmente um cuidado em relação à privacidade dos presos e seus parceiros afetivos.

Por outro lado, a Comissão insistiu para entrar em outras localidades dos vários presídios visitados, como nas próprias celas, mas não obteve garantias de segurança. Na Cadet, por exemplo, a Diretora informou que as revistas de celas somente ocorriam por  ocasião do banho de sol dos detentos e que os corredores que dão acesso às celas são muito estreitos para permitir a circulação das autoridades com a segurança necessária.

Nesse ponto (não naquele das visitas íntimas), o sistema não conseguiu demonstrar total controle sobre o presídios. Isto é fato.

Quanto aos abusos sexuais, afirmo que não é um fenômeno recente, decorrente exclusivamente da presença das organizações criminosas nos presídios. Não apenas familiares de presos do sexo feminino são vítimas de violência e abuso sexual. Não como fenômenos sistemáticos, coletivos, mas como registros pontuais, dignos de atenção.

Em relação aos estupros de detentos do sexo masculino, o Brasil jamais conseguiu banir totalmente essa prática, como lei de cadeia, para criminosos sexuais, especialmente. Por isso, geralmente, a existência dos chamados "seguros", onde ficam confinados detentos com esse perfil.

Por último, afirmo que o sistema de justiça criminal é corresponsável pelo atual estado de coisas. O Poder Judiciário sequer pode falar muito grosso. Os presos provisórios, por exemplo, que abarrotam o sistema, só para dar um exemplo singelo, constituem um nó histórico do sistema. que também precisa ser desatado.

Ainda encontramos muitos presos provisórios, padecendo dentro do sistema, por crimes que não representam grave ameaça à sociedade, à revelia da atual modificação no sistema das prisões cautelares. Além disso, o nosso Tribunal de Justiça nunca resolveu o problema da competência dos juízes das varas de execuções penais, que não podem socorrer os presos vindos das Comarcas do interior do Estado, geralmente abandonados à própria sorte.

Por último, meus caríssimos leitores, sem uma Central de Inquéritos, continuaremos a assistir detentos presos por critérios distintos, desproporcionais, ao sabor das interpretações de cada magistrado que mantém o flagrante das prisões.

Por isso, no caso do Maranhão, todo mundo tem que falar baixinho mesmo.

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