quarta-feira, 2 de novembro de 2016

O discurso mitico da união das esquerdas

Depois do cenário eleitoral de 2016 mais claro pelos seus números, resta ler as mais diferentes reflexões sobre o destino da esquerda no Brasil.

É importante fazer esse debate, mas não sem antes tomar algumas precauções.

Temos precauções em relação algumas linhas de raciocínio que pecam por sua superficialidade (malícia ou ingenuidade tudo indica impregnam tais análises também).

Portanto, é importante conhecer de onde partem tais análises e de que lugar partem, sob pena de aceitarmos pressupostos qustionáveis para o debate.

Em primeiro lugar. É preciso desconstruir o chavão de que "a esquerda só se une na cadeia". Alguns evocam a frase para reclamar de algo que merece aprofundamento. O chavão não ajudar a entender porque nos dividimos e apenas reforça o mito de que divergimos simplesmente porque somos loucos ou imbecis.

A direita também se divide. Mas também tem menos motivos para isso do que a esquerda. O programa da direita é o capital. O programa da esquerda, por outro lado, não é apenas o socialismo. Se fosse apenas o socialismo já seria complexo.

Nós nos dividimos porque não é simples derrotar o capitalismo. E o caminho para se chegar à vitória tem nuances.

O exemplo mais próximo de nós está no fracasso petista. Quando alcançou o poder, esse partido implementou uma determinada visão de governo e de sociedade. Não errou no objetivo estratégico (visto que talvez nem esteja mais no seu horizonte o socialismo) mas no caminho para consolidar um modelo de democracia.

No entanto, a derrota do PT não quer dizer que a esquerda esteja totalmente certa. Quer apenas dizer que uma das fórmulas para ocupar o poder foi testada e fracassou.

Por isso mesmo, quando alguém reclama da desunião das esquerdas, sendo do PT ou do PCdoB, prefere não tocar nas situações onde pareceu absurdo não haver coligações com o PSOL, como por exemplo em Belém, em Porto Alegre e no Rio de Janeiro. Nesse tipo de análise, o PSOL geralmente aparece como o partido que inviabiliza as alianças por sua radicalidade.

Outro exemplo são as postagens do Governador Flávio Dino, que receberam a chamada de "A esquerda deve olhar menos para trás e mais para a frente". De acordo com tais opiniões, será muito difícil unir a esquerda, mesmo. Digo porque:

a) A guinada do eleitorado para a direita não pode ser obra exclusiva da crise econômica. Os erros que a esquerda cometeu em torno do projeto de poder petista também devemm ser levados em consideração. Esse é o pressuposto importante para unir a esquerda: a autocrítica. E não olhar para trás quer dizer exatamente não fazer autocrítica. É um pressuposto para não estarmos diante da possibilidade de nos encontrar novamente com Henrique Meirelles, Kátia Abreu e todas as concessões à direita que inviabilizaram a reforma agrária, a titulação dos quilombos, a demarcação dos territórios indígenas, a democratização do sistema de segurança e a reforma do sistema prisional, por exemplo.

b) Quanto tempo levará a onda conservadora se a chamada esquerda flexível continuou a fortalecer em vários Estados os partidos do golpe?  Ou seja, esses partidos são contra o golpe mas compõe as forças do golpe? A pergunta é: temos como debater um programa com essa esquerda?

c) O Governador também defendeu a união das esquerdas sob um novo projeto, que reúna, "desenvolvimento" e garantia dos "direitos"; e um "novo programa sustentado por uma frente ampla", que volte a atrair a atenção do eleitor médio, que rapidamente "vai se desiludir com certas coisas esquisitas". Quanto à frente ampla das esquerdas temos acordo. O problema é saber a extensão dessa amplitude. Com o PSDB, por exemplo, como presenciamos no Estado, simplesmente é inviável. E temos muitas coisas esquisitas por aqui também.

Sem falar em nome de nenhum partido, posso dizer que existe uma esquerda que ainda se constrange em votar na direita ou na esquerda que paquera com o programa da direita.

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