domingo, 8 de junho de 2014

A mudança pelo sindicato rural de Imperatriz


Flávio Dino, Pastor Porto, Sebastião Madeira e Zé Reinaldo (foto jornal O progesso).

A propósito da visita do candidato Flávio Dino ao sindicato rural de Imperatriz, convém relembrar. Nada de patrulhamentos ideológicos sectários, porque, a final de contas, um candidato a governador dever dialogar com todos os segmentos da sociedade. O que preocupa é o simbolismo do gesto, que fala ou cala muito, dentro de uma dinâmica de campanha.  Sim, porque o sindicato rural de Imperatriz, sempre foi o berço da UDR no Maranhão, o principal reduto conservador do país, com atuação violenta principalmente no período pré-constituinte.

A União Democrática Ruralista foi fundada em 1985 por fazendeiros do setor pecuarista contrários à reforma agrária. Articulava de várias formas, organizando os fazendeiros, articulando milícias armadas, fazendo pressão sobre os governos e parlamentares. Entrou em declínio no final de 1988, depois do assassinato de Chicos Mendes no Acre, onde foi revelada a participação de fazendeiros vinculados à organização no homicídio. Algo semelhante ocorreu no Maranhão, com a morte do Padre Josimo, em 1986, em Imperatriz. Encerrou suas atividades a partir de 1990, sendo substituída pela Confederação Nacional da Agricultura (CNA) que apresenta uma atuação também destacadamente conservadora, de ataque aos movimentos sociais agrários, indígenas e ambientalistas. 

A estratégia da chamada "frente ampla", montada pela candidatura de Flávio Dino caminha em direção às mesmas posturas públicas adotadas pelo seu partido, o PCdoB, por ocasião da votação do Código Florestal. Weverton Rocha, um dos principais expoentes desse campo político, tem se destacado em posições abertamente em favor do ideário ruralista e patronal - contra a demarcação de terras indígenas no Maranhão, assinando a CPI contra o INCRA e a FUNAI, contra a Convenção 169, da OIT e até liderando uma frente parlamentar contra as unidades de conservação no país.

A visita de Flávio Dino ao sindicato rural de Imperatriz insere a plataforma da candidatura dentro de uma certa lógica, onde o agronegócio tem lugar de destaque. Diz respeito a uma sinalização para o modelo de desenvolvimento que um gesto como esse prenuncia. 

Relembro, para ornamentar o simbolismo da história, o que aconteceu com D. Afonso Felipe Gregory, primeiro bispo de Imperatriz, que morreu em agosto do ano de 2008.  Gregory sempre foi um fervoroso defensor da reforma agrária, presidente da Cáritas Internacional e responsável pelo setor da pastoral social da CNBB, por vários anos.

Pois bem, o sindicato rural de Imperatriz, no ano de 1991, patrocinou uma campanha escandalosa contra D. Gregory, exatamente no governo Lobão. Um belo dia as principais ruas da cidade amanheceram repletas de faixas, 
com frases atacando o dirigente maior da Igreja Católica. As frases dizia: "DOM GREGORY, O ANJO MAU"; "GOVERNADOR, D. GREGORY INCENTIVA A VIOLÊNCIA NO CAMPO"; "DOM GREGORY, NÃO MATARÁS! NÃO ROUBARÁS" (Cfr. o jornal O Progresso, 2.4.92, Imperatriz).

Os Bispos maranhenses tinham estado duas vezes com o Governador Edson Lobão, exigindo solução para a questão dos despejos forçados, das torturas e prisões de trabalhadores rurais.  Dia 12 de Março, 
em Imperatriz, D. Gregory prestou firme depoimento perante a CPI do Congresso Nacional que investigou a violência no campo. Do outro lado, o fazendeiro José da Cruz Rocha havia acusado a Igreja e o sindicato de trabalhadores rurais, liderado por Manoel da Conceição, de incentivar a violência.

No dia 27 de Março, Rocha foi tocaiado e barbaramente assassinado. No mesmo dia, o Comandante da 
Políciia Militar de Imperatriz, Coronel Guilherme Batista Ventura (historicamente vinculado ao grupo da UDR) e o secretário de segurança, Agostinho Noleto , fizeram declaraçõess a` imprensa, responsabilizando a Igreja Católica pelo assassinato do fazendeiro. O Governador Édson Lobão, pressionando pela opinião pública, demitiu imediatamente o Coronel e o Secretário.

José da Cruz Rocha estava em conflito com posseiros da Fazenda S. Jorge. Ele se dizia dono, mas não tinha o título de propriedade. Na verdade, a terra era devoluta e habitada por 55 famílias há' mais de 20 anos. Em 1991, durante o conflito, entraram mais 30 famílias no imóvel. Rocha as despejou e conseguiu policiais para queimar casas e roças dos posseiros antigos, torturando alguns barbaramente, obrigando-os a comer esterco de galinha.

Em 1991, conforme relato da Comissão Pastoral da Terra, somente em 35 grandes conflitos, houve 14 mortes, 11 tentativas de assassinatos, 17 ameaçados de morte e 1.706 famílias despejadas. Dezesseis mil e quatrocentos e duas famílias que moram nessas áreas que somavam 1.548.915 ha (incluindo a'reas indígenas) estavam sujeitas a ser despejadas. 

O próprio Governador, Édson Lobão, confessara que existiam no seu governo mais de 100 ordens
de despejo. Era uma conjuntura de muita omissão e cumplicidade com os crimes praticados pelo latifúndio. 

Mas esse é apenas um dos episódios envolvendo o sindicato rural de Imperatriz, tão simbólico para a história da contra-reforma agrária como é a figura de Manoel da Conceição para a luta camponesa. Acho que Flávio Dino e seu grupo deve ter a fórmula para conciliar interesses tão antagônicos.

O episódio também revela que é impossível fazer política no Maranhão sem memória. O governo de Edson Lobão, cujo filho se lança candidato a governador agora, reproduziu uma institucionalidade violenta no campo, como jamais vista no Estado.

Nenhum comentário: