terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Legítima defesa ou vingança privada?

A morte do assaltante Auclines de Menezes Costa, apelidado por Piauí, na manhã de terça-feira, dia 7, na porta da agência do banco Bradesco do Calhau, após ter realizado um assalto, produziu um frenesi midiático com sérias consequências não apenas para a segurança pública, mas principalmente para a advogada, que teria provocado os disparos.

A partir da abordagem jornalística, pouco comprometida com a ordem jurídica, percebe-se um certo clima emocional reativo, no sentido de incentivar o cidadão comum a reagir à criminalidade, por sua própria conta e risco. A ineficiência do sistema de segurança contribui, sem dúvida, para fortalecer esses pontos de vista.
No episódio envolvendo a advogada, apesar de aclamada por setores da mídia e por seus seguidores, a apologia da reação não a socorre, pelo contrário. As cores com que se pintam as circunstâncias em que o assalto, na porta do Bradesco, ocorreu, têm o fito de endeusar um gesto, que simbolizaria, antes de mais nada, pura vingança privada.

A advogada, despida da sua condição de vítima indefesa, assume o lugar da mão justiçeira, capaz de, como paradigma, apontar o caminho a seguir, em situações semelhantes. Os entusiastas da recriação dessa realidade virtual são os mesmos que levantam as bandeiras do porte de arma e da reação violenta às abordagens criminosas.

Do outro lado desta exposição midiática sombria, emergem as opiniões preocupadas com os excessos jornalísticos, simploriamente cultuados por um segmento expressivo da população. Mas também erram, por abrirem a divergência a partir um cenário reconstruído pelos seus adversários de visão de mundo e de sociedade. Esquecem que as peças desse presépio foram montadas ao arrepio da realidade ocorrida e em prejuízo da defesa da vítima do assalto.

Não ser a favor de reações armadas também não pode implicar na defesa da pura e simples criminalização da vítima, desconhecendo a sua peculiar condição de mulher, inserida no cenário da violência primeiramente deflagrada por uma quadrilha armada. Cabe aqui lembrar a desproporção do poderio armado, o cálculo frio da abordagem e a ação combinada de vários agentes contra uma mulher, acompanhada da genitora sexagenária. Esse cenário, em relação ao que foi criado por esse segmento da mídia, é totalmente distinto. A partir da realidade dos fatos, é um cenário inteiramente reconstruído.

Sem a pretensão de substituir a defesa da colega, nem tampouco interferir negativamente na estratégia a ser adotada futuramente, é importante repor a verdade dos fatos, até para que ela eventualmente não venha a ser prejudicada, por um setor da mídia.

Faço isso porque conversamos com ela e com os delegados envolvidos com a investigação dos fatos e extraímos versões outras do cenário e das circunstâncias em que o fato ocorreu, contrariando inúmeras versões criadas pela mídia:

a) a advogada estava na direção veículo, ainda com o motor ligado;
b) sua mãe, idosa, desceu do veículo para efetuar o depósito, quando foi abordada por um dos assaltantes na porta do banco;
c) havia outros integrantes do grupo criminoso no momento e sacaram de suas armas, efetuando disparos;
d) o assaltante, por apelido, Piauí, foi atingido por um único tiro de revólver 38, na lateral do rosto, entre o ouvido e a têmpora.
e) advogada não é atiradora e não é associada a nenhum clube de tiro.

Portanto, é necessário cuidado com os julgamentos precipitados, na avaliação do episódio. Não é o caso de se fazer loas a uma suposta nova heroína, mas também não é o caso de criminalizar a conduta de quem foi afetada por um episódio violento e pode ter se utilizado da defesa possível num momento de grande stress e dentro de um quadro de excepcionalidade.

Compreender o episódio dessa forma em absoluto quer dizer que o recurso à reação armada seria recomendável ou que o excesso na conduta defensiva seja apoiado. Diante do que vi e ouvi, não me atreveria a induzir um juízo de reprovação, pura e simplesmente. Aguardemos o desfecho do inquérito.

A defesa criminal da advogada caberá ao seu patrono, ou a ela própria, se tiver condições emocionais para tanto. A missão da OAB foi apresentar sua associada e colaborar com o procedimento de apuração do fato.

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