As notícias são gravíssimas nos últimas dias, com ônibus sendo incendiados em vários bairros, provocando o recolhimento da frota, por três dias seguidos na Capital.
Mesmo com a grande mobilização da polícia e a intensificação das abordagens nas ruas, o clima de insegurança se alastrou.
Os episódios de violência na região metropolitana repõem a questão da presença das facções no sistema prisional, contrariando a eufórica propaganda governamental sobre um suposto controle dos presídios.
Não há mais como negar que não há controle algum sobre os presídios e que a política de segurança pública adotada não está articulada a um programa mais amplo de combate à violência, com prevenção e inteligência.
Também é preciso dizer: os ataques não estão relacionados a uma suposta ofensiva do governo contra as facções. Líderes das facções andam tranquilamente pelas ruas, sem qualquer monitoramento. Mensagens enviadas por celulares nos presídios não orientam investigações e planos emergenciais de segurança, tudo indica pela política adotada, que hipertrofia o policiamento repressivo.
No momento em que escrevo essas linhas, mais um ataque a ônibus ocorre no Alto Turu, e 26 adolescentes infratores fogem da unidade de cumprimento de medida socioeducativa do Vinhais, causando novo pânico na população.
O governador já anunciou a vinda da Força Nacional de Segurança, no momento em que faccionados do Bonde dos Quarenta dão ordem para fechar o comércio no bairro do Coroadinho. Tal medida é anunciada hoje pelo mesmo grupo político que há dois anos atrás considerava a presença dessa força militar como simples confissão de incompetência local.
Ficamos tristes, não comemoramos a vitória dos fatos sobre a propaganda de governo. Não apenas a sociedade está perdendo, mas um campo político que deveria estar transformando a realidade do nosso Estado.
Não adianta lutar contra o golpe e reforçar a lógica do golpe. Dilma caiu exatamente por isso. Precisamos de uma concepção de segurança pública que supere a beligerância e a repressão, pura e simples. Essa é a lógica de polícia que está ao lado do golpe: seletiva, antidemocrática e repressiva. Ninguém elege governo de esquerda para continuar experimentando isso.
Desde o início do governo Dino temos notado o discurso facistóide do comando da Segurança Pública. Não avançamos nada em matéria de segurança pública preventiva, policiamento comunitário, participação e controle social do sistema de segurança. Apenas um arremedo da polícia de Alckmim, beligerante, violenta, impermeável aos movimentos de direitos humanos. O governo Dino aumentou incrivelmente os números da letalidade policial, direcionada especialmente aos mais pobres da periferia.
O mesmo ocorre na área prisional. Temos um secretário importado do governo mineiro de Anastasia, fechado em si mesmo, incapaz de dialogar com a sociedade civil, reproduzindo as mesmas mazelas do sistema prisional. O governo Dino anistiou servidores envolvidos com denúncia de corrupção e tortura, fazendo exatamente um movimento de retrocesso na gestão prisional.
De outro lado, tentou, contrariando a opinião das entidades de direitos humanos, vender a imagem de que a separação das facções criminosas por unidades prisionais teria sido obra sua. Aproveitando-se de uma trégua momentânea, quis afirmar uma autoridade inexistente sobre o sistema prisional, manejando números que demonstravam a baixa do número de mortes nas cadeias, resultado da simples separação das facções.
Tudo o mais no sistema prisional foi relegado ao segundo plano, com o abandono da política de ressocialização em larga escala, com o incremento da superlotação, com o agravamento das condições indignas de salubridade do cárcere de forma geral, além do reforço de situações de maus tratos e tortura.
As últimas decisões administrativas apenas cuidavam de restringir cada vez mais os direitos dos presos, tais como visitas de familiares, banho de sol e entrada de alimento. O governo foi gradualmente avançando sobre o limite do tolerável. Era de se esperar uma reação das facções.
A gota d'água ocorreu com a repressão que seguiu à morte do auxiliar penitenciário, no início de maio, na Vila Kiola. O cavalo doido foi solto, espalhando o pânico na cidade. E saber o que pretende o Bonde é mais difícil. Mas que o salve em andamento está relacionado aos presídios, isso está.
Não seria preciso dizer que não se combate organizações criminosas apenas com a força bruta e o discurso de guerra. Corpos deitados ao chão não deveriam orientar a melhor estratégia de defesa da sociedade, inspirada no birô de um ex-juiz com perfil supostamente progressista.
Hoje, podemos dizer de forma objetiva que a máscara caiu. Se o governo Flávio Dino quiser compor um projeto político de resistência contra a onda conservadora no país, deverá repensar o que faz na área da segurança pública e no sistema prisional. Estamos diante da mais pura e escancarada falta de sintonia entre o discurso e a prática.
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