segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019

O JULGAMENTO DA CRIMINALIZAÇÃO DA HOMOFOBIA


JULGAMENTO SUSPENSO


O julgamento da criminalização da homofobia foi suspenso, sem previsão de pauta. Até o momento, quatro ministros voltaram a favor da criminalização da homofobia: Celso de Mello, Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Roberto Barroso.

O julgamento é baseado na ADO 26 (Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão) e do MI 4733 (Mandado de Injunção), apresentadas pelo PPS (Partido Popular Socialista) e pela ABGLT(Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros).


A ESTRATÉGIA JURÍDICA

Até 2007, essas ações serviam apenas para dar ciência ao Poder Legislativo de que havia uma mora. Naquele ano, quando o STF examinou a mora legislativa em relação ao direito de greve dos servidores públicos, a lei de greve do setor privado passou a ser aplicável, como efeito concreto de uma interpretação conforme a Constituição (ou seja, o intérprete adota a interpretação mais favorável à Constituição Federal, considerando-se seus princípios e a jurisprudência, sem, contudo, se afastar da finalidade da lei).

A Constituição Federal determina, em seu artigo 5º, inciso XLI, que a "lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais". Esse dispositivo até os dias atuais não mereceu a atenção do Congresso Nacional, no sentido de criar uma legislação que tipifique o crime de homofobia. É essa omissão que está sendo questionada pelas duas ações.

O julgamento atende a um pleito antigo da chamada comunidade LGBTTT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros) ou LGBTT+ (intersexos).

Em resumo, as ações postulam:

a) Que sejam reconhecidos que a homofobia e a transfobia se enquadram no conceito ontológico constitucional de racismo nos termos do julgamento do HC 82.424 RS (caso Ellwanger), racismo (art. 5º, inciso XVII) e da Lei nº 7.716/89, que define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor
  ; 

b) Que seja declarada a mora inconstitucional, concedendo-se prazo para que o Congresso Nacional produza a lei específica que tipifique a homofobia como ilícito penal.

O Caso Ellwanger é uma referência a um livreiro que publicava obras com conteúdo antissemita, no Rio Grande do Sul. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul condenou-o por racismo, com base na legislação de 1989, e o STF negou-lhe um pedido de habeas corpus. 

No bojo desse julgamento, o Supremo entendeu que o racismo é um conceito político social mais amplo, não só para questão de raça, cor de pele, mas que se enquadra em qualquer tipo de inferiorização de um grupo por outro, por um atributo que o grupo tenha. Assim, foram incluídos judeus nesse grupo. E agora se pede a inclusão da comunidade LGBTI na Lei Federal 7716/89 – Lei Antirracismo, por raciocínio analógico. 

OS FUNDAMENTOS TEÓRICOS DE DIREITOS FUNDAMENTAIS

A discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero retira das pessoas a justa expectativa de que tenham igual valor. 
O direito à igualdade sem discriminações abrange a identidade ou expressão de gênero e a orientação sexual. 

Tratados internacionais de que o Brasil é parte e a Constituição de 1988 orientam a criminalização de toda e qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais (o direito à igualdade está no art. 24 do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos); a proibição contra a discriminação, no art. 4º da Convenção para Eliminação da Discriminação Racial e no art. 2º do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos). 

Qualquer tipo de discriminação, inclusive a que se fundamenta na orientação sexual das pessoas ou da identidade de gênero, é atentatório ao Estado Democrático de Direito, segundo o Relator, Ministro Celso de Mello.

Existem vários relatórios elaborados pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos que mostram o Brasil como o país onde mais ocorrem relatos de violência contra a população LGBT.

Também o STF já havia reconhecido que “o direito à igualdade sem discriminações abrange a identidade ou expressão de gênero” e que “a identidade de gênero é manifestação da própria personalidade da pessoa humana e, como tal, cabe ao Estado apenas o papel de reconhecê-la, nunca de constituí-la” (ADI 4.275, Rel. Min. Marco Aurélio, Red. para o Acórdão Min. Edson Fachin, acórdão ainda pendente de publicação).

Em outro julgamento, o STF já declarou que reconhecimento do direito à liberdade de orientação sexual condiz com a própria liberdade existencial do indivíduo (ADPF 291, Rel. Min. Luiz Roberto Barroso, DJe 10.05.2016).

Já houve precedentes que diretamente examinaram o conteúdo do direito previsto no art. 5º, XLI, da Constituição Federal, que trata da crimes de discriminação . Por exemplo, na ADI 4.424, sob Rel. Ministro Marco Aurélio, DJe 31.07.2017, o Plenário do STF deu interpretação conforme à Constituição para que não fossem aplicados à lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher os dispositivos da lei dos juizados especiais.

O fato é que a proteção dos direitos fundamentais pode implicar também na criação de tipos penais próprios. A Constituição de 1988 contém um significativo elenco de normas que, em princípio, não outorgam direitos, mas que, antes, determinam a criminalização de condutas (CF, art. 5º, XLI, XLII, XLIII, XLIV; art. 7º, X; art. 227, § 4º). 

Em todas essas normas é possível identificar um mandato de criminalização expresso, tendo em vista os bens e valores envolvidos. 

O Ministro Fachin alegou que 


  1. "(...) os direitos fundamentais não podem ser considerados apenas como proibições de intervenção (Eingriffsverbote), expressando também um postulado de proteção (Schutzgebote). 
  2. Pode-se dizer que os direitos fundamentais expressam não apenas uma proibição do excesso (Übermassverbote), como também podem ser traduzidos como proibições de proteção insuficiente ou imperativos de tutela (Untermassverbote).
  3. Os mandatos constitucionais de criminalização, portanto, impõem ao legislador, para o seu devido cumprimento, o dever de observância do princípio da proporcionalidade como proibição de excesso e como proibição de proteção insuficiente.” (HC 104410, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 06/03/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe062 DIVULG 26-03-2012 PUBLIC 27-03-2012). "

De acordo com esse entendimento, o princípio da proporcionalidade, na modalidade de proibição de proteção insuficiente, é o fundamento pelo qual o STF tem reconhecido que o direito penal é o instrumento adequado para a proteção de bens jurídicos 

IDENTIDADE DE GÊNERO

“A identidade de gênero é a vivência interna e individual do gênero tal como cada pessoa o sente, o qual pode ou não corresponder com o sexo designado no momento do nascimento, incluindo a vivência pessoal do corpo (que pode compreender – ou não – a mudança da aparência ou função corpora por meio de procedimentos médicos, cirúrgicos ou de outra índole, sempre que ela for livremente escolhida) e outras expressões de gênero, incluindo a vestimenta, o modo de falar e as maneiras.

ORIENTAÇÃO SEXUAL

“Se refere a atração emocional, afetiva e sexual por pessoa de um gênero diferente do seu, ou do seu mesmo gênero, ou de mais um gênero, assim como a relações íntimas e/ ou sexuais com essas pessoas.


PROJETOS DE LEI

Hoje existem, ao menos, dois projetos que propõem a criminalização da homofobia. O Projeto de Lei da Câmara (PLC) 122, de 2006, proposto pela ex-deputada federal Iara Bernardi (PT-SP), está arquivado no Senado. Em 2014, a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS) apresentou o PL 7.582, com a mesma proposta, que está paralisado na Câmara.

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