A conduta do deputado estadual Fernando Furtado ainda hoje é causa de espanto. O ataque gratuito ao juiz federal, José Carlos Madeira, que presidiu o processo de demarcação da terra indígena Awá Guajá e todo o procedimento de desintrusão, constitui mais um capítulo de uma trajetória de insanidade.
Em 1985, trabalho de levantamento da FUNAI identificou a existência de centenas de fazendeiros e trabalhadores com praticas de pecuária de corte e extração de madeira dentro do território indígena.
Logo depois, em 1994, assumia seu primeiro mandato como Governadora do Estado, Roseana Sarney, aliada do tucano Fernando Henrique Cardoso. Roseana, que se elegeu com o apoio do PCdoB, sob o comando de Marcos Kowarick, entregou o órgão de terras para os comunistas. No ITERMA, Kowarick desenvolveu aliança estreita com o antigo PFL na região, estreitando laços com Cláudio Azevedo.
O Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública em 2002 (2002.37.00.003918-2), com laudo antropológico e estudos da FUNAI, subsidiando todo o procedimento. Apesar da resistência dos grupos empresariais e fazendeiros, a TI foi homologada por decreto do presidente Lula em 2005.
Dentre as ações judiciais que visavam barrar a demarcação, sobressaíam as da Agropecuária Alto Turiaçu e as do Município de Zé Doca.
Os ruralistas se mobilizaram intensamente contra a demarcação da terra indígena. Em em agosto de 2013, levaram à Comissão da Amazônia da Câmara dos Deputados sob a liderança do deputado Weverton Rocha (PDT), dezenas de pequenos produtores, recrutados nas cidades de Zé Doca e São João do Caru, vestidos em camisetas amarelas com a frase: "Diga não à demarcação da suposta terra indígena Awá-Guajá".
Foram muitos os incidentes provocados pela desorientação disseminadas sobretudo pela Faema e Aprocaju. Elas pregavam a resistência no meio da operação de desintrusão, impedindo que centenas de posseiros fizessem o cadastro para ter acesso aos benefícios contemplados pela decisão do juiz federal.
Madeira é considerado magistrado progressista, de vasta cultura jurídica democrática, preocupado com questões sociais que atravessam os processos. Nos seus vinte e dois anos de magistratura, contabiliza respeito e admiração entre seus pares e em amplos setores da sociedade civil organizada.
A Terra Indígena (TI) Awá, localizada entre os municípios de Centro Novo do Maranhão, Governador Newton Bello, São João do Caru e Zé Doca, no estado do Maranhão, é um território de ocupação do povo indígena Awá-Guajá, onde vivem grupos isolados e de recente contato, ameaçados de extinção, abrangendo uma área de 116.582 hectares.
A demarcação desse território envolveu uma intensa campanha internacional a favor de um dos últimos povos caçadores e coletores do Brasil.
Oficialmente, o primeiro contato dessa etnia com não índios data de 1979. Nesse período, a política indigenista do governo brasileiro era promover a atração dos grupos classificados como 'arredios', para principalmente evitar conflitos nas áreas dos grandes projetos governamentais da época, tais como a Estrada de Ferro Carajás.
Além dos grupos contactados, que reúnem atualmente 400 índios, existem outros que, para evitar o contato com as frentes de atração, embrenharam-se cada vez mais na mata, e vagam na região sob condições de sobrevivência cada vez mais difíceis. Antes do contato com os não índios, os Awá eram mais de mil. A organização Survival Internacional relata que "quando a ferrovia atravessou a terra dos Awá, muitos não indígenas massacraram famílias inteiras. Outros morreram de doenças que não existiam quando viviam isolados".
A Fazenda Agropecuária Alto Turiaçu Ltda se instalou na região em 1985, apossando-se de 37.980 hectares da TI Awá e tinha como representante Cláudio Azevedo (presidente da Associação dos Criadores, entidade herdeira da UDR).
Ali também estavam grupos como Serraria Sampaio e Carutui do grupo INDUSPAR. que fomentaram o surgimento de milícias armadas, o desmatamento, as carvoarias, a construção de estradas clandestinas, a extração ilegal de madeira e o progressivo extermínio dos Awá.
Desde então, iniciou-se a pressão contra a delimitação da TI Awá, quando foi identificada com 232 mil hectares.
A área reconhecida hoje como Terra Indígena Awá, assim como as terras indígenas Caru e Alto Turiaçu, encontravam-se dentro dos limites da extinta Reserva Florestal, abrigando as etnias Guajajara, Ka'apor e Awá-Guajá. Daí em diante, grupos de trabalhos de um Grupo Técnico de Identificação e Delimitação da TI Awá, estabeleceram os limites entre a TI Carú, coabitada por grupos Awá-Guajá e Guajajara; a TI Alto Rio Turiaçu; coabitada por grupos Awá-Guajá e Ka'apor; e a Reserva Biológica do Gurupi.
O processo de regularização do território, no entanto, remonta ao ano de 1961, quando o Presidente Jânio Quadros cria a Reserva Florestal do Gurupi, no estado do Maranhão, com 1,6 milhão de hectares, por meio do Decreto n.º 51.026 de 25/07/1961, sendo reconhecido o direito de ocupação dos indígenas que nela habitavam.
Em 1992, a terra dos Awá foi declarada de posse permanente desse grupo indígena, quando foi publicada a portaria de interdição da FUNAI.
Logo depois, em 1994, assumia seu primeiro mandato como Governadora do Estado, Roseana Sarney, aliada do tucano Fernando Henrique Cardoso. Roseana, que se elegeu com o apoio do PCdoB, sob o comando de Marcos Kowarick, entregou o órgão de terras para os comunistas. No ITERMA, Kowarick desenvolveu aliança estreita com o antigo PFL na região, estreitando laços com Cláudio Azevedo.
O PCdoB desenvolveu a estratégia de resistência à TI Awá, distribuindo títulos de terra a pequenos e grandes proprietários da região, mesmo depois da portaria de interdição da FUNAI, para inviabilizar a demarcação do território. Muitos posseiros que foram alvo da desintrusão recente na verdade foram incentivados a entrar na área em função da política de conciliação de classes implementada na região pelo PCdoB.
Vários outros movimentos de resistência à demarcação foram deflagrados por políticos oportunistas, que criaram falsas expectativas de vitória, incentivando não só a permanência como novas intrusões de trabalhadores rurais.
Dentre as ações judiciais que visavam barrar a demarcação, sobressaíam as da Agropecuária Alto Turiaçu e as do Município de Zé Doca.
Em 2009, a Ação Civil Publica, proposta pelo MPF foi sentenciada por Carlos Madeira, num processo permeado por recursos e incidentes, exigindo fundamentação memorável e análise profunda dos diversos nuances dos interesses conflagrados. Madeira ratificou corajosamente os estudos da FUNAI, considerando válidas a provas apresentadas para subsidiar a demarcação da TI
Awá.
No ano de 2010, o Juiz Madeira visitou a Terra Indígena Awá- Guajá. Foi constatar in loco as denúncias que perpassavam os autos e no contexto mais amplo das inúmeras reportagens e campanhas internacionais sobre os Awá. Ele presenciou o genocídio em curso e a grilagem do território indígena.
O TRF da 1ª Região, a partir de uma apelação interposta pela Agropecuária Alto Turiaçu, suspendeu a retirada dos invasores que ocupam a Terra
Indígena Awá Guajá, e especialmente das instalações da Agropecuária Alto
Turiaçu, atrasando o desfecho do processo. Em 2012, a Sexta Câmara desse mesmo tribunal confirmou a decisão de Carlos Madeira, determinando a desintrusão (Cfr. APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO 0003846-47.2002.4.01.3700 (2002.37.00.003918-2)/MA).
A desintrusão exigiu mais uma vez não apenas habilidade, mas também sensibilidade do Juiz, Carlos Madeira. Ele criou uma dinâmica para facilitar a desocupação voluntária, promovendo reuniões com os trabalhadores rurais e suas entidades representativas; com órgãos e ministérios envolvidos; criando o Comitê de Desintrusão.
Por várias vezes presenciei o esforço desse magistrado para mitigar os impactos da desintrusão, determinando inúmeras providências para reassentar, fazer o transporte dos pertences, identificar novas áreas com a participação dos atingidos, mobilizando órgãos para assistir os trabalhadores rurais em vários aspectos, como previdência, transferência de renda, crédito agrícola.
Enquanto o magistrado abria espaços de diálogos para resolver os problemas da desintrusão, avançando para muito além das funções de um magistrado de feição tradicional, presenciamos a lentidão e por vezes a omissão dos órgãos dos governos, em cumprir as diretrizes da sentença, que apontava para a proteção social dos mais vulneráveis atingidos pela demarcação, disputados por entidades ruralistas e políticos anti-indígenas.
A desintrusão, por força da sentença, ficou sob a responsabilidade de uma força tarefa interministerial, coordenada pela Secretaria-Geral da Presidência da República em parceria com os ministérios da Justiça (Funai, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Secretaria Nacional de Segurança Pública/Força Nacional de Segurança Pública), Gabinete de Segurança Institucional (Abin); Defesa (Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia / Censipam), Saúde (Secretaria de Saúde Indígena) Desenvolvimento Agrário (Incra), Meio Ambiente (Ibama/ Instituto Chico Mendes), Ministério do Desenvolvimento Social e Secretaria Nacional de Direitos Humanos (SDH) e Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS).
O deputado Fernando Furtado, ao atacar o magistrado Carlos Madeira, demonstra ser desinformado e subordinado aos interesses dos ruralistas. Mais uma vez, o seu partido cumpre um péssimo papel na histórica luta dos Awá pelo direito à vida.
Os ataques de Fernando Furtado foram divulgados pelo blogue do Domingos Costa (http://www.domingoscosta.com.br/?p=41047) e apenas confirmam o desequilíbrio e a insensatez do deputado, que foi alvo de representações protocoladas por várias entidades de direitos humanos do Estado (http://blog-do-pedrosa.blogspot.com.br/2015/09/entidades-da-sociedade-civil-protocolam.html).
Até onde ele irá impunemente?
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