domingo, 10 de janeiro de 2016

Usurpando o demérito na gestão prisional

Dizem que setores do governo deram piti por conta da entrevista no blog do Diego Emir. Não falei nenhuma novidade. Esse debate está sendo feito ao longo da tramitação da denúncia perante a OEA, desde o ano de 2013. Mais recentemente, uma magistrada afirmou em alto e bom som a mesma coisa. Já fiz essa mesma reclamação em audiência com o governo do Estado. É impossível continuarmos a nos enganar. A Lei de Execução Penal não está sendo cumprida. O sistema progressivo do cumprimento da pena é um direito fundamental dos detentos. Está articulado a uma lógica sistêmica que contempla princípios como o da humanidade; o da individualização da pena; o da ressocialização do apenado; o da finalidade da pena etc.

A readaptação social do condenado está contemplada na Convenção Americana de Direitos e, portanto, é um direito fundamental do apenado.

A aplicação desse instituto demonstra que a pena não tem finalidade vingativa ou puramente de retribuição, pois é função da execução recuperar aquele que infringiu a lei penal.

O art. 33 do Código Penal dispõe sobre essa progressão da pena privativa de liberdade: 

a) o regime fechado deve ser cumprido em estabelecimento de segurança máxima ou média por condenados a penas superiores a oito anos; 
b) o regime semi-aberto tem rigor intermediário, é cumprido em colônia agrícola, industrial ou similar e destina-se, inicialmente, aos condenados primários a penas privativas de liberdade superiores a quatro e inferiores a oito anos e aos condenados submetidos ao regime fechado pela regra da progressividade dos regimes; 
c) o regime aberto é o modo menos rigoroso de todos e deve ser cumprido em casa de albergado, destinando-se inicialmente aos condenados primários a penas iguais ou inferiores a quatro anos e aos condenados submetidos a outros regimes pela regra da progressividade.

A progressão compõe a lógica principal do sistema de execução penal. Uma das funções da pena é a ressocialização e a volta do condenado ao convívio social. É dever do Estado prepará-lo gradativamente mediante o acompanhamento de seu comportamento durante o cumprimento da pena. 

É entendimento consensual na área penal que trancafiar alguém por longo período projeta efeito contrário à ressocialização. O presídio passa a ser um ambiente que condiciona o apenado para conduta mais agressivas contra a sociedade.

É disso que trato, uma vez que na reta final do Governo Roseana dividiu-se os presídios por facções criminosas, sucumbindo o Estado à pauta de reivindicação das facções criminosas, tecida no teatro das grandes tragédias penitenciárias que passaram a ocorrer desde o ano de 2010 no Maranhão.

O Governo Flávio Dino não apenas tentou furtar o demérito do governo anterior, traduzindo esse acordo espúrio em avanço na gestão prisional, como também adotou isso como princípio, sem o menor constrangimento.

Leia a entrevista, que está no blog do Diego Emir e trata de assuntos mais amplos:


Governo Flávio Dino faz “concessões a facções criminosas” para controlar mortes no sistema penitenciário, revela Pedrosa



O advogado Luís Antônio Pedrosa assumiu na última sexta-feira (8), assumiu a presidência do PSOL no Maranhão. Nos últimos seis anos, ele esteve encarregado de conduzir a Comissão de Direitos Humanos da OAB, onde ganhou muito destaque e por muitas vezes desenvolvendo um debate duro principalmente no governo Roseana Sarney, mas mantendo papel semelhante de fiscalizador no governo Flávio Dino.

No entanto Pedrosa tem uma nova missão, muito mais espinhosa, agora conduzir um partido político que ainda está em processo de desenvolvimento no Maranhão e que por vezes já foi palco de polêmica entre os próprios filiados principalmente quando houve a entrada de nomes como Haroldo Saboia. O advogado fala da missão em 2016 da legenda e da disputa municipal.

Durante a entrevista, Pedrosa também analisa os governos Flávio Dino (PCdoB) e Edivaldo Holanda Júnior (PDT), o novo presidente do PSOL do Maranhão faz duras críticas aos dois e diz que São Luís está mergulhada numa “miséria governamental”.

Porém a declaração mais reveladora de Luís Antônio Pedrosa é sobre o sistema penitenciário maranhão, ele diz de forma clara que o governo dialoga diretamente com facções criminosas e faz acordos para que o número de mortos diminua no Complexo Penitenciário de Pedrinhas, mas ao mesmo tempo acaba perdendo controle do que ocorre nas ruas de São Luís e do estado.

Confira na íntegra a entrevista:

Blog do Diego Emir – Pedrosa o senhor deixa a Comissão de Direitos Humanos da OAB e agora assume a presidência do PSOL. O que difere a sua atuação nesses dois campos?

Luís Antônio Pedrosa – Na CDH da OAB/MA minha atuação sempre levou em consideração o respeito e a obediência às diretrizes dos Conselhos da entidade, que não se confundem com as visões dos partidos políticos. É um princípio caro à OAB a independência em relação aos governos e partidos. Como presidente daquela comissão procurei separar as duas coisas em atenção esse principio de independência.

No Psol será um pouco diferente, embora eu traga a mesma bagagem ética e os mesmos compromissos com a luta social e a defesa dos direitos humanos. Evidentemente que serei convidado a expressar a crítica política de um segmento partidário que é oposição programática ao governo Dino e ao Governo Dilma.

Blog do Diego Emir – Qual a sua missão enquanto presidente do PSOL?

Luís Antônio Pedrosa – Abrir o partido para uma nova militância, capaz de colocar o partido no cenário da disputa política onde os movimentos sociais e a classe trabalhadora assumam o protagonismo; aproximar o Psol do PCB e PSTU para conquistar mandatos que expressem o campo político da esquerda autêntica; direcionar o partido para a luta contra os setores conservadores, unificando as correntes internas em torno de uma proposta política independente e antagônica ao modelo tradicional de política.

Blog do Diego Emir – Qual o principal objetivo do PSOL no Maranhão em 2016?

Luís Antônio Pedrosa – Nosso objetivo é conquistar mandatos de prefeitos e vereadores profundamente articulados com a luta social, ampliando nossa presença em um número cada vez maior de municípios. Essa luta no campo da representação política sempre se realiza de forma combinada com a luta por mais direitos no interior da sociedade.

Blog do Diego Emir – O PSOL vai disputar eleição para prefeito em quantos municípios maranhenses?

Luís Antônio Pedrosa – Estamos presentes em 41 municípios mas podemos ampliar essa participação até o mês de abril para algo em torno de mais vinte municípios. O crescimento para nós importa em conteúdo e qualidade, não interessando simplesmente criar o partido cartorialmente.

Blog do Diego Emir – E em São Luís como vai se comportar o PSOL?

Luís Antônio Pedrosa – Vamos tentar construir a Frente de Esquerda. Temos força política para lançar candidato majoritário e até eleger vereadores. Existe um vazio ideológico muito grande na disputa para a prefeitura. Os opositores de Edvaldo circulam em torno das mesmas práticas políticas e suas alianças reproduzem o modelo tradicional de política que está em crise de representatividade. O Psol será a alternativa à esquerda capaz de dialogar com setores mais amplos e críticos da sociedade.

Blog do Diego Emir – Será possível finalmente o PSOL alcançar uma vaga na Câmara Municipal?

Luís Antônio Pedrosa – Temos agora candidatos com densidade eleitoral para isso. Esperamos que a reforma política não atrapalhe o desempenho do partido. Será bem diferente das eleições para governador, onde lançamos candidatura dentro de uma disputa plebiscitária. Agora, está cada vez mais evidente que a mudança efetiva exige novos caminhos.

Blog do Diego Emir – O senhor é candidato a prefeito?

Luís Antônio Pedrosa – Ainda não mas posso ser. Depende da nossa conferência eleitoral e do que a construção da Frente de Esquerda exigirá como tarefa do Psol.

Blog do Diego Emir – PSOL, PCB e PSTU: é possível essa união?

Luís Antônio Pedrosa – Sempre é. Mas é preciso habilidade na condução desse processo e deliberações programáticas em torno dos nossos objetivos conjunturais. Afinidades ideológicas não há dúvidas que temos. Diante da agressão da última reforma política, é possível que a aproximação seja uma necessidade de cunho mais pragmático.

Blog do Diego Emir – Qual sua opinião a respeito do governo Flávio Dino?

Luís Antônio Pedrosa – É um governo que alcançou a vitória eleitoral criando grandes expectativas na população. O desejo do povo é na verdade a superação das antigas práticas políticas do clientelismo, do fisiologismo e da corrupção eleitoral e administrativa, o que evidentemente não está acontecendo. Depois de um ano de governo Dino, está mais fácil explicar para a população suas limitações e contradições insuperáveis. Para que haja mudança, é preciso avançar mais e depurar esse condomínio que mais parece uma colcha de retalhos, travada por compromissos elitistas dos tortuosos caminho das oligarquias políticas, rurais e empresariais.

Blog do Diego Emir – Alguns comparam Flávio Dino a Vitorino Freire pelo caráter perseguidor. O senhor concorda?

Luís Antônio Pedrosa – Tenho ouvido algumas queixas a esse respeito, sobretudo de servidores públicos e setores da mídia. Mas, com todos os defeitos do autoritarismo que vários integrantes do governo extravasam, é preciso resguardar as diferenças entre um e outro, por fidelidade histórica. A violência institucional hoje acontece por mecanismos mais sutis de repressão.

Blog do Diego Emir – E sobre a administração Edivaldo Holanda Júnior?

Luís Antônio Pedrosa – Criticou tanto o João Castelo e terminou caindo na mesma bitola. Sem participação social, sem criatividade, reproduzindo as mesmas relações políticas com o parlamento e com os setores empresariais do transporte e da especulação imobiliária.

As promessas de campanha estão sendo lembradas no último ano do governo, quando não dá mais tempo de fazer nada. Ele criou um verdadeiro vazio político dentro do campo do Dinismo, que está sendo disputado na base da cotovelada.

Está claro que São Luís merece coisa melhor. É uma cidade pujante, rica do ponto de vista cultural e social, esplêndida em belezas naturais, dona de um valioso patrimônio histórico, que não poderia estar mergulhada nessa miséria governamental.

Blog do Diego Emir – O senhor concorda com o status que ganhou o governo do Maranhão como referência na política de administração penitenciária?

Luís Antônio Pedrosa – Esse status existe como obra de ficção da propaganda governamental. Desafio qualquer pessoa a visitar os presídios e reafirmar isso publicamente. As mortes do sistema foram controladas na base das concessões a facções criminosas e aos setores mais retrógrados do sistema. A sociedade paga um preço muito alto com isso aqui fora, com a diversificação das ações criminosas, onde as facções operam os assaltos a ônibus, os latrocínios e as explosões de banco com muito maior intensidade.

A redução pequena dos índices de homicídios está relacionada em grande parte à consolidação dos territórios da facções, diminuindo os confrontos entre elas. A doutrina da beligerância conseguiu apenas aumentar os índices de letalidade policial, de um lado, e ceifar a vida de policiais, de outro. Do programa Pacto pela Vida só se tem hoje vaga lembrança.

Blog do Diego Emir – Qual sua opinião sobre o impeachment da presidente Dilma?

Luís Antônio Pedrosa – Dilma paga o preço da liquidação ideológica do PT e dos seus satélites da esquerda domesticada. O conservadorismo avançou e uma parte da população quer mudar no momento impróprio, recorrendo aos artifícios criados por líderes da direita corrupta e reacionária.

Depor Dilma agora seria assinar um cheque em branco para gente como Eduardo Cunha e sua turma. A ordem de sucessão do poder nos empurrará para o abismo. Temos o dever de canalizar essa insatisfação popular derrotando o arrocho fiscal e a pauta conservadora, preparando a população para um salto à frente, com vitória nas urnas em direção a um governo efetivamente da classe trabalhadora e dos setores excluídos desse modelo de desenvolvimento.

Fora das regras do jogo democrático ninguém mais conseguirá governar até o final do mandato, sem conviver com uma perigosa ambiência de instabilidade e ruptura política.

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