Assisti atentamente a entrevista do Ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, na Mirante, agora de manhã.
Também estive na audiência pública na Câmara dos Deputados, no dia 10 deste mês, onde ele esteve presente, para defender o AST (Acordo de Salvaguardas Tecnológicas).
Lendo atentamente o documento, não há mudanças profundas na estrutura do texto do ano de 2000, no governo de Fernando Henrique Cardoso.
Os EUA, como era de se esperar, impuseram suas condições, como detentor de 80% dos lançamentos do mercado aeroespacial. Embora o documento diga que se destina a proteger a tecnologia das partes, deve ser lido como um acordo para a proteção da tecnologia americana.
O encarte distribuído pelo governo dissemina informações parciais sobre o projeto. Fala que "em 20 anos, estima-se que, devido a não aprovação do AST, o Brasil perdeu aproximadamente US$ 3,9 bilhões (aproximadamente R$ 15 bilhões) em receitas de lançamentos
não realizados, considerando-se apenas 5% dos lançamentos ocorridos no mundo neste
período, além de não desenvolver o potencial tecnológico e de turismo regional".
Mas nada diz sobre os projetos de vida que ali foram destruídos, com a implantação do CLA. Não pode mensurar matematicamente o preço que vidas humanas pagaram pela expulsão de suas terras, pelo êxodo rural, pelo incremento da violência nas periferias, pelo desemprego e muito mais.
A propaganda governamental não foi feita para convencer quilombolas ameaçados de perder seus territórios, decerto. Não fala em quase quarenta anos de indefinição, de projetos de vida em suspenso, sob a perspectiva de perder tudo, tal qual perderam as cerca de trezentas famílias deslocadas, no início da década de oitenta.
Fala-se em 10 bilhões por ano de faturamento a partir de 2040, quando o projeto estiver em pleno funcionamento. Isso fez brilhar os olhos dos oportunistas de plantão, da mesma maneira que a perspectiva de encontrar minério faz um presidente da república querer entregar a Amazônia.
O modelo de desenvolvimento prometido é o mesmo de sempre: incremento do comércio local, mais infraestrutura para o município, formação de mão de obra especializada, mas empregos, etc.
As referências de sucesso do Ministro são absolutamente questionáveis: Kourou (na Guiana Francesa) e o SpaceX no Kennedy Space Center - EUA. Kourou até pouco tempo, sob uma onda protestos comunitários e a outra, um Centro Espacial cuja infraestrutura e localização geográfica não podem ser comparadas sob nenhum ângulo à realidade de Alcântara.
Na Câmara dos Deputados, o Ministro foi peremptório ao afirmar que não havia planos de expansão do CLA. Aqui já atenuou a afirmação com um "por enquanto". Ou seja, há planos de expansão para o futuro e isso não tranquiliza quem poderá ser deslocado, principalmente quando não se apresenta nenhuma proposta de compensação.
A preocupação do governo brasileiro é simplesmente aprovar o AST, depois diz que vai pensar nas consequências. Ou seja, o AST continua sendo um cheque em branco para quem pode ser prejudicado pela política de expansão, para ficar só por aí, já que não se quer falar em soberania nacional, diante do novo alinhamento subalterno aos EUA.
O problema é que o CLA praticou um crime e, como todo criminoso, espera a sua prescrição, pelo apagar da memória dos fatos. Se o interesse não fosse ludibriar, porque não tratou de corrigir os erros do passado, não procedeu à consulta PRÉVIA, conforme determina a Convenção da OIT, não fez o Relatório de Impacto Ambiental, não apresentou uma proposta de expansão, com suas consequências e impactos sobre as comunidades, e, o que é melhor, não propõe alguma coisa nesse aspecto?
A impressão que dá é que - mesmo com a visita a Só Assim e Peptal (agrovilas empobrecidas como resultado das expulsões) - o Ministro está longe de compreender as razões de quem desconfia. E desconfia porque já foi roubado várias vezes.
E mais longe do que o Ministro estão os parlamentares do Maranhão que apoiam incondicionalmente ou ingenuamente (?) o AST. Eles aderem ao ponto de vista do governo, pelo simples desejo de trazer o dinheiro para o município de Alcântara ou para o Estado, ou apenas estão alinhados à ideologia neo-colonial do presidente Bolsonaro.
O governo do Estado. Esse expôs antecipadamente sua precária posição em relação ao tema. Propôs um seminário para recepcionar o Ministro, cuja pauta tecnológica mais uma vez exclui as comunidades. O protesto das entidades o fez - não modificar a pauta do seminário - mas simplesmente construir outro, puxado pela SEDHIPOP, revelando a esquizofrenia de uma coalizão governamental que reúne raposas e galinhas, cobras e sapos, piranhas e piabas.
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