terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Se houver o impeachment

Cada um faz a sua análise. É o ponto de vista do sujeito que cria o objeto, como diria Ferdinad Saussure. Eu escrevo agora logo após mais uma surpreendente derrota do governo Dilma no Congresso, com a chapa da oposição vencendo a disputa por vagas na comissão do impeachment. Foram 272 votos contra 199, dos governistas*.

Nessas alturas, no limiar do impeachment, o projeto político petista começa a fazer água. Sobram agora os vaticínios, de um lado e outro. Os simpatizantes do PT vão se apresentar como vítimas. A direita reacionária vai se apresentar como a vestal da moralidade.

É preciso então pensar o after day, o pós-afastamento dessa presidência tão confusa. Isso pode ser feito por quem não apóia o governo Dilma mas também detesta o PSDB, o DEM, o Cunha e comandita. Achei importante avisar isso, porque não entro aqui no debate de apoiar ou não o impeachment. Segue-se a teoria do "se".

Se o PMDB assumir a presidência da República, com Michel Temer, a política econômica continuará a mesma. É exatamente por isso que setores de esquerda fugiram do PT. Ele não apenas se juntou com setores da direita, com a desculpa da governabilidade. Ele também assumiu a política econômica com um viés fortemente de direita.

O PT e seus satélites ideológicos já eram refém da direita há algum tempo no Congresso. No segundo mandato de Dilma a obra de destruição dos ideais de esquerda se completou com a crise e o ajuste fiscal. Sobrou pouca coisa. Tão pouco que hoje se discute se vale a pena brigar por ela. Portanto, Michel Temer será a continuidade e por isso já escreveu uma carta de aceno no melhor estilo Silvério dos Reis para tranquilizar o mercado.

Lembrando o governo Jackson, vai ser difícil colocar a população nas ruas para defender esse governo, embora alguns poucos idealistas estejam empenhados com isso, talvez menos por idealismo do que por força das necessidades mais prementes da sobrevivência política.

Muito óbvio falar disso, mas somente agora, nos 47 minutos do segundo tempo, o PMDB descobriu que o PT não gosta dele. O casamento se desfez por conveniências oportunistas, não por diferenças de concepção de política econômica. 

Nesse batido, Cunha não vai demorar também. Útil para o momento, será descartado posteriormente pela força do moralismo que avança cegamente. Ele foi exposto, será devorado pelas hienas que um dia o alimentaram, apenas para justificar o clima udenista que se forjou. Apesar disso, a agenda conservadora será mantida no Congresso, embora com um bancada petista e seus satélites mais combativos e resistentes, porém esturricados e rasgados pelos tiroteio.

O PCdoB buscará salvar seu único governo no Maranhão com acordos inacreditáveis para os crédulos. Isso não será uma tarefa impossível para quem já apoiou Roseana em tempos passados. O PMDB com Michel Temer, abrirá espaços para o grupo Sarney, mas precisará de bancada no Congresso. Será mais importante de novo a governabilidade.

Com os acordos fisiológicos estabelecidos na Assembleia, Dino continuará com o controle do Legislativo, porque manterá a chave do cofre da burra na mão. Isso é o que importa por aqui. Sarney continuará manobrando, mas o revés do projeto petista poderá provocar a oscilação do PCdoB para outros caminhos, cenários que ainda estão por se configurar. O certo é que o grupo do bigodão terá uma sobrevida, colocando as barbas dos comunistas de molho por aqui.

As eleições municipais de 2016 serão o termômetro do discurso de vitimização do projeto petista. Eles vão se aproximar de novo dos  movimentos sociais e com um discurso mais claramente de esquerda. Com o povo desacreditando deles, vai ser difícil não caírem no abismo. Eles trocaram deputados e senadores para apoiar governadores do PMDB e outros partidos da direita. Esses não estarão mais com o PT, por força da irresistível atração do Planalto.

Em 2018, as eleições para governador e presidente serão comandadas pelo PMDB, partido com grande know-how em matéria de fisiologismo e clientelismo. Tudo o que os governos petistas deixaram de fazer para mobilizar o povo vai fazer falta. A despolitização da classe trabalhadora e da juventude pode comprometer a reação, embora tudo se possa esperar, até um clima de Grécia, de jornadas de junho e de ocupação de escolas.

Abrindo um ligeiro parêntesis: quem sabe uma depuração do PT unifique as esquerdas, incluindo o PCdoB. Nessas alturas, o povo que pediu o impeachment já teria compreendido melhor que a direita morde para valer. Uma nova vertente da esquerda poderia assumir a alternativa à barbárie, fazendo convergir setores estilhaçados em vários partidos, comprometidos com a agenda progressista.

Por isso, quando um petista quiser te convencer a defender a Dilma para proteger Flávio Dino no Maranhão, desconfie. Os dois projetos não caminham tão juntos assim. Tanto é que o vice-governador aqui é um tucano. O que os assemelha é a vontade sôfrega de fazer política entregando as calças para a direita. Por isso é necessário vigiar e combater.

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* - Mal fechei o texto, vejo o Eliakim Araújo anunciando uma liminar concedida pelo Ministro Fachin, do STF, suspendendo a formação e a instalação da comissão especial que irá analisar o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff na Câmara dos Deputados. Como se vê, outras variantes estão surgindo.

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