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Vanessa Gonçalves |
22/05/2012
16:40
Nesta
terça-feira (22/5), jornalistas baianos divulgaram uma carta aberta repudiando
os abusos cometidos por programas policialescos na Bahia. A nota foi emitida
após reportagem do "Brasil Urgente" com a repórter Mirella Cunha, da Band-BA,
ganhar repercussão nacional nas redes sociais.
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Crédito:Reprodução
Reportagem gerou polêmica entre internautas e
imprensa
No
vídeo, Mirella entrevista um jovem negro que acabara de ser preso acusado de
assalto e estupro. No vídeo, o jovem assume o assalto, mas quando diz que não
houve estupro, a repórter afirma ele “queria estuprar”.
Na
sequência da matéria, o jovem nega várias vezes o crime e pede para a vítima
fazer o exame para provar sua inocência. Confuso, ele solicita que façam o exame
de "próstata" em vez de corpo de delito. Mirella Cunha ainda chama o detido de
estuprador e tira sarro pelo fato dele não saber ao certo para que serve o
exame.
Diversos
blogs e jornalistas repudiaram a atitude da repórter da Band. Agora,
profissionais da imprensa baiana rechaçam a atitude da jornalista em nota
oficial. A iniciativa dos jornalistas reflete a indignação com "atos comumente
praticados por programas noticiosos no Estado da Bahia".
De
acordo com o texto, "provoca a indignação dos jornalistas abaixo-assinados e
motiva questionamentos sobre a conivência do Estado com repórteres antiéticos,
que têm livre acesso a delegacias para violentar os direitos individuais dos
presos, quando não transmitem (com truculência e sensacionalismo) as ações
policiais em bairros populares da região metropolitana de Salvador".
A
nota ainda retoma o artigo 6º do Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros que
diz que "é dever do jornalista: opor-se ao arbítrio, ao autoritarismo e à
opressão, bem como defender os princípios expressos na Declaração Universal dos
Direitos Humanos". Para os jornalistas, "o direito à liberdade de expressão não
se sobrepõe ao direito que qualquer cidadão tem de não ser execrado na TV, ainda
que seja suspeito de ter cometido um crime".
Além
disso, os autores da carta ressaltam que a responsabilidade dos abusos comumente
cometidos no Estado não são apenas dos repórteres, mas também dos produtores do
programa, da direção da emissora e de seus anunciantes.
Por
fim, o documento pede aos órgãos competentes que acompanhem o caso e garantam
que o acusado tenha seus direitos garantidos e seja julgado com
imparcialidade.
Acompanhe
o texto na íntegra:
Carta
aberta de jornalistas sobre abusos de programas policialescos na Bahia
"O
demo a viver se exponha,
Por
mais que a fama a exalta,
Numa
cidade onde falta
Verdade,
honra, vergonha."
(Gregório
de Mattos e Guerra)
Ao governador do Estado da Bahia, Jaques Wagner.
À
Secretaria da Segurança Pública do Estado da Bahia.
Ao
Ministério Público do Estado da Bahia.
À
Defensoria Pública do Estado da Bahia.
À
Sociedade Baiana.
A
reportagem "Chororô na delegacia: acusado de estupro alega inocência", produzida
pelo programa "Brasil Urgente Bahia" e reprisada nacionalmente na emissora Band,
provoca a indignação dos jornalistas abaixo-assinados e motiva questionamentos
sobre a conivência do Estado com repórteres antiéticos, que têm livre acesso a
delegacias para violentar os direitos individuais dos presos, quando não
transmitem (com truculência e sensacionalismo) as ações policiais em bairros
populares da região metropolitana de Salvador.
A
reportagem de Mirella Cunha, no interior da 12ª Delegacia de Itapoã, e os
comentários do apresentador Uziel Bueno, no estúdio da Band, afrontam o artigo
5º da Constituição Federal: "É assegurado aos presos o respeito à integridade
física e moral". E não faz mal reafirmar que a República Federativa do Brasil
tem entre seus fundamentos "a dignidade da pessoa humana". Apesar do clima de
barbárie num conjunto apodrecido de programas policialescos, na Bahia e no
Brasil, os direitos constitucionais são aplicáveis, inclusive aos suspeitos de
crimes tipificados pelo Código Penal.
Sob
a custódia do Estado, acusados de crimes são jogados à sanha de jornalistas ou
pseudojornalistas de microfone à mão, em escandalosa parceria com agentes
policiais, que permitem interrogatórios ilegais e autoritários, como o de que
foi vítima o acusado de estupro Paulo Sérgio, escarnecido por não saber o que é
um exame de próstata, o que deveria envergonhar mais profundamente o Estado e a
própria mídia, as peças essenciais para a educação do povo brasileiro.
Deve-se
lembrar também que pelo artigo 6º do Código de Ética dos Jornalistas
Brasileiros, "é dever do jornalista: opor-se ao arbítrio, ao autoritarismo e à
opressão, bem como defender os princípios expressos na Declaração Universal dos
Direitos Humanos". O direito à liberdade de expressão não se sobrepõe ao direito
que qualquer cidadão tem de não ser execrado na TV, ainda que seja suspeito de
ter cometido um crime.
O
jornalista não pode submeter o entrevistado à humilhação pública, sob a
justificativa de que o público aprecia esse tipo de espetáculo ou de que o crime
supostamente cometido pelo preso o faça merecedor de enxovalhos. O preso tem
direito também de querer falar com jornalistas, se esta for sua vontade. Cabe
apenas ao jornalista inquirir. Não cabem pré-julgamentos, chacotas e ostentação
lamentável de um suposto saber superior, nem acusações feitas aos gritos.
É
importante ressaltar que a responsabilidade dos abusos não é apenas dos
repórteres, mas também dos produtores do programa, da direção da emissora e de
seus anunciantes - e nesta última categoria se encontra o governo do Estado que,
desta maneira, se torna patrocinador das arbitrariedades praticadas nestes
programas. O governo do Estado precisa se manifestar para pôr fim às
arbitrariedades; e punir seus agentes que não respeitam a integridade dos
presos.
Pedimos
ainda uma ação do Ministério Público da Bahia, que fez diversos Termos de
Ajustamento de Conduta para diminuir as arbitrariedades dos programas
popularescos, mas, hoje, silencia sobre os constantes abusos cometidos contra
presos e moradores das periferias da capital baiana.
Há
uma evidente vinculação entre esses programas e o campo político, com muitos dos
apresentadores buscando, posteriormente, uma carreira pública, sendo portanto
uma ferramenta de exploração popular com claros fins político-eleitorais.
Cabe,
por fim, à Defensoria Pública, acompanhar de perto o caso de Paulo Sérgio,
previamente julgado por parcela da mídia como "estuprador", e certificar-se da
sua integridade física. A integridade moral já está arranhada.
Salvador,
22 de maio de 2012.
Nota do blog: qualquer semelhança será mera coincidência com o Maranhão.
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