A semana do governo Bolsonaro, como não poderia deixar de ser, teve novidades, desta vez no campo do uso da gramática.
O anti-intelectualismo da nova direita tem consequências, como se pode constatar.
Nos tempos de Lula, a direita em voga mantinha o preconceito contra a fala de um operário que alcançara a presidência da República.
Agora, viver no submundo das fake news é um pressuposto para o atestado de ignorância, o maior galardão da nova hegemonia.
Marcus Vinicius Rodrigues substituiu Murilo Resende, acusado de plágio; Resende foi realocando e agora é assessor do MEC.
Vinícius, nesta quarta-feira (dia 24/01), na sua posse como presidente do INEP, pronunciou duas vezes a palavra "cidadões" e ainda disse a expressão "pseudos" intelectuais (https://twitter.com/analumeri/status/1088574538705784832).
Logo que chega de Davos, Bolsonaro fez pronunciamento formal sobre a notícia do desastre ambiental de Brumadinho-MG, e menciona uma "bagagem de dejeitos" (https://www.youtube.com/watch?v=RGmtEdldLSQ).
Já em Minas Gerais, Bolsonaro, em rápida entrevista com a imprensa mencionou o primeiro-ministro de Israel, como "Benjamin Netaniel" (https://twitter.com/PodresAltBr/status/1089381029176135681).
E, há três dias, o presidente afirmou em entrevista em que fazia o relato de sua atuação em Davos, que, em poucos minutos fez "uma retrospectiva do Brasil do futuro" (https://www.youtube.com/watch?v=T2ZfNxipqJ0).
Para quem não dispensava os deslizes de português de um operário e ainda se escandalizava com os tropeços retóricos da Dilma, os apoiadores de Bolsonaro estão em situação delicadíssima.
domingo, 27 de janeiro de 2019
domingo, 13 de janeiro de 2019
MAIS ARMAS, MENOS SEGURANÇA
Como era previsível, o governo Bolsonaro levará adiante a promessa de flexibilizar a posse e o porte de armas.
Pela proposta do governo, três em cada quatro brasileiros poderão ser contemplados pelo decreto que o governo Jair Bolsonaro está preparando para facilitar a posse de arma de fogo.
Haverá a liberação simplificada para quem mora em cidades onde a taxa de homicídios por 100 mil habitantes é maior que 10, ou seja 62% dos municípios do país, onde vivem 159,8 milhões de pessoas ou 76% da população brasileira.
Pela lógica, quanto mais violenta a cidade mais plausível a efetiva necessidade de o cidadão ter a posse de armas. As cidades que poderão ter as regras alteradas, além de compreender parcela significativa da população, concentram 94% dos homicídios.
Seremos o laboratório para testes defasados. Especialistas em segurança pública no mundo inteiro desaprovam a posse e ou o porte de armas como estratégia para prevenir a violência. O argumento do governo, contudo, parece ser ideológico: garantir o direito de legítima defesa, como princípio, como é nos EUA. O problema é que esse direito pode agravar o problema da violência, por isso não há como separar o princípio das estatísticas de violência.
Até no campo da esquerda há quem defenda a população armada, para combater eventuais governos tiranos. Invocam o mito de que os governos tiranos desarmam a população, mas em várias experiências autoritárias ocorreu exatamente o contrário: partidários desses governos se transformam em milícias armadas para reprimir os protestos da população.
O cenário também é previsível: aumentará o número de ocorrências envolvendo armas de fogo para situações não convencionais, tipo violência doméstica, brigas de bar, conflitos de trânsito, disputas entre vizinhos, suicídios, etc.
A Lei 10.826/2003 — conhecida como Estatuto do Desarmamento - foi um mecanismo fundamental para a redução do ritmo de crescimento dos homicídios por arma de fogo.
Enquanto entre 1997 e 2003 o número absoluto de homicídios por arma de fogo cresceu na média 6,8% ao ano, a partir de 2004, quando a lei entra em vigor, até 2015 (último ano disponível no DATASUS), o crescimento cai para 1,9% ao ano.
O Atlas da Violência 2018 afirma que entre 1980 e 2016 cerca de 910 mil pessoas foram mortas por perfuração de armas de fogo no país.
A corrida armamentista que vinha acontecendo desde meados dos anos 1980 só foi interrompida em 2003, quando foi sancionado o Estatuto do Desarmamento.
No começo da década de 1980 a proporção de homicídios por arma de fogo girava em torno de 40%, com esse indíce em progressão violenta até o ano de 2003, quando atingiu o patamar de 71,1%. O Estatuto garantiu uma estabilidade nesse índice de violência até o ano de 2016, mas o recorte da arma de fogo nos homicídios sempre foi muito alto. Por exemplo, em 2015, 71% dos homicídios se deram através de armas de fogo.
De lá para cá se observa que os estados onde se constatou o maior crescimento da violência letal na última década são aqueles em que houve, concomitantemente, maior crescimento da vitimização por arma de fogo.
Contra tudo e contra todos o governo Bolsonaro levará adiante uma proposta insana, por vários motivos:
a) o cidadão comum terá dificuldades para reagir a situações de violência, sem preparo emocional e psicológico e sem treinamento;
b) o recurso à arma de fogo será disponibilizado para pessoas violentas que tentarão resolver seus conflitos por intermédio da bala;
c) Organizações criminosas utilizarão laranjas para ter acesso a mais armas, incrementando a criminalidade armada;
d) O cidadão de posse da arma será alvo de criminosos, que buscarão se apossar das mesma;
h) O mercado clandestino de armas será incrementado, com o maior número de armas em circulação.
Dois setores, sem dúvida, lucrarão com a liberação das armas para a população: as funerárias e a indústria de armas. É pagar pra ver.
Pela proposta do governo, três em cada quatro brasileiros poderão ser contemplados pelo decreto que o governo Jair Bolsonaro está preparando para facilitar a posse de arma de fogo.
Haverá a liberação simplificada para quem mora em cidades onde a taxa de homicídios por 100 mil habitantes é maior que 10, ou seja 62% dos municípios do país, onde vivem 159,8 milhões de pessoas ou 76% da população brasileira.
Pela lógica, quanto mais violenta a cidade mais plausível a efetiva necessidade de o cidadão ter a posse de armas. As cidades que poderão ter as regras alteradas, além de compreender parcela significativa da população, concentram 94% dos homicídios.
Seremos o laboratório para testes defasados. Especialistas em segurança pública no mundo inteiro desaprovam a posse e ou o porte de armas como estratégia para prevenir a violência. O argumento do governo, contudo, parece ser ideológico: garantir o direito de legítima defesa, como princípio, como é nos EUA. O problema é que esse direito pode agravar o problema da violência, por isso não há como separar o princípio das estatísticas de violência.
Até no campo da esquerda há quem defenda a população armada, para combater eventuais governos tiranos. Invocam o mito de que os governos tiranos desarmam a população, mas em várias experiências autoritárias ocorreu exatamente o contrário: partidários desses governos se transformam em milícias armadas para reprimir os protestos da população.
O cenário também é previsível: aumentará o número de ocorrências envolvendo armas de fogo para situações não convencionais, tipo violência doméstica, brigas de bar, conflitos de trânsito, disputas entre vizinhos, suicídios, etc.
A Lei 10.826/2003 — conhecida como Estatuto do Desarmamento - foi um mecanismo fundamental para a redução do ritmo de crescimento dos homicídios por arma de fogo.
Enquanto entre 1997 e 2003 o número absoluto de homicídios por arma de fogo cresceu na média 6,8% ao ano, a partir de 2004, quando a lei entra em vigor, até 2015 (último ano disponível no DATASUS), o crescimento cai para 1,9% ao ano.
O Atlas da Violência 2018 afirma que entre 1980 e 2016 cerca de 910 mil pessoas foram mortas por perfuração de armas de fogo no país.
A corrida armamentista que vinha acontecendo desde meados dos anos 1980 só foi interrompida em 2003, quando foi sancionado o Estatuto do Desarmamento.
No começo da década de 1980 a proporção de homicídios por arma de fogo girava em torno de 40%, com esse indíce em progressão violenta até o ano de 2003, quando atingiu o patamar de 71,1%. O Estatuto garantiu uma estabilidade nesse índice de violência até o ano de 2016, mas o recorte da arma de fogo nos homicídios sempre foi muito alto. Por exemplo, em 2015, 71% dos homicídios se deram através de armas de fogo.
De lá para cá se observa que os estados onde se constatou o maior crescimento da violência letal na última década são aqueles em que houve, concomitantemente, maior crescimento da vitimização por arma de fogo.
Contra tudo e contra todos o governo Bolsonaro levará adiante uma proposta insana, por vários motivos:
a) o cidadão comum terá dificuldades para reagir a situações de violência, sem preparo emocional e psicológico e sem treinamento;
b) o recurso à arma de fogo será disponibilizado para pessoas violentas que tentarão resolver seus conflitos por intermédio da bala;
c) Organizações criminosas utilizarão laranjas para ter acesso a mais armas, incrementando a criminalidade armada;
d) O cidadão de posse da arma será alvo de criminosos, que buscarão se apossar das mesma;
h) O mercado clandestino de armas será incrementado, com o maior número de armas em circulação.
Dois setores, sem dúvida, lucrarão com a liberação das armas para a população: as funerárias e a indústria de armas. É pagar pra ver.
sábado, 5 de janeiro de 2019
sexta-feira, 4 de janeiro de 2019
O ESTOPIM DO SISTEMA PRISIONAL
Mal houve a posse do novo governo, os presídios já deram o primeiro sinal das prováveis dificuldades que virão.
Jair Bolsonaro se elegeu fazendo um discurso agressivo contra a criminalidade e contra a população carcerária. No Maranhão, quem não se lembra de um vídeo, difundido em grupos de whatsapp, em que o capitão diz que a melhor coisa no Maranhão era Pedrinhas (fazendo alusão à sua posição em defesa do extermínio de presos).
Nas proximidade da posse, Bolsonaro defendeu a extinção do progressão de regime e a não concessão do indulto de Natal. Temer novamente não concedeu o indulto, pelo segundo ano consecutivo. A massa carcerária vem acumulando pressão.
Pode até não ter relação com o governo de Bolsonaro, mas os ataques que atingem o Ceará pelo terceiro dia consecutivo, nesta sexta-feira (4), ocorreram a mando de presidiários, depois de declarações do atual Secretário de Administração Penitenciária, Luís Mauro Albuquerque, que além de prometer maior rigor nas fiscalizações, afirmou não reconhecer facções e nem se sujeitar à separação delas por presídio.
Os CPPLs (CCPL 1, 2, 3 e 4) estão sendo apontados como os locais de onde estão partindo os "salves" . Lá estão presos membros do PCC (Primeiro Comando da Capital), do CV (Comando Vermelho) e do GDE (Guardiões do Estado).
Ataques a ônibus e prédios públicos e privados ocorrem desde a noite de quarta-feira (2), em um total de 56 crimes. Quarenta e cinco pessoas foram detidas e três pessoas se feriram desde o início da onda de violência.
Numa conjuntura em que soluções de força são anunciadas desde o palanque eleitoral, faz-se necessário lembrar do que foi capaz o PCC depois da criação do Regime Disciplinar Diferenciado nos presídios, em São Paulo.
E de lá para cá, muita coisa mudou. As facções são uma realidade nos presídios, com os governos estaduais adotando a gestão do mais fácil: conceder espaço para facções nos presídios.
Segundo estudo divulgado pela Pastoral Carcerária, o Brasil possui mais de 725 mil pessoas presos, ficando atrás apenas da China (1,6 milhão) e dos EUA (2,1 milhão) em população carcerária.
As prisões do país têm uma taxa de ocupação de 200% – ou seja, elas têm capacidade para receber somente a metade do número de presos.
Boa parte desses presos hoje estão recrutados por facções criminosas que estão em uma guerra, desde meados de 2016, envolvendo a cisão entre os dois maiores grupos nacionalizados, PCC e CV.
Bolsonaro foi eleito também a partir de um clamor popular adestrado pela mídia sensacionalista dos programas policiais de rádio e de tv, que, dentre outras pérolas, defendem que "direitos humanos é para defender bandido" e que "bandido bom é bandido morto".
Essa lógica pode empurrar o governo federal para a linha dura no tratamento dos presídios, que exige maior e melhor estrutura, assim como análise profunda de questões criminológicas.
Sem estrutura para conter rebeliões em massa, coordenadas por facções nacionais, e sem conhecimento de causa de uma questão complexa como essa, o atual governo ainda não caiu na realidade. Se esse estopim for aceso, uma tragédia estará a caminho em breve no país.
Jair Bolsonaro se elegeu fazendo um discurso agressivo contra a criminalidade e contra a população carcerária. No Maranhão, quem não se lembra de um vídeo, difundido em grupos de whatsapp, em que o capitão diz que a melhor coisa no Maranhão era Pedrinhas (fazendo alusão à sua posição em defesa do extermínio de presos).
Nas proximidade da posse, Bolsonaro defendeu a extinção do progressão de regime e a não concessão do indulto de Natal. Temer novamente não concedeu o indulto, pelo segundo ano consecutivo. A massa carcerária vem acumulando pressão.
Pode até não ter relação com o governo de Bolsonaro, mas os ataques que atingem o Ceará pelo terceiro dia consecutivo, nesta sexta-feira (4), ocorreram a mando de presidiários, depois de declarações do atual Secretário de Administração Penitenciária, Luís Mauro Albuquerque, que além de prometer maior rigor nas fiscalizações, afirmou não reconhecer facções e nem se sujeitar à separação delas por presídio.
Os CPPLs (CCPL 1, 2, 3 e 4) estão sendo apontados como os locais de onde estão partindo os "salves" . Lá estão presos membros do PCC (Primeiro Comando da Capital), do CV (Comando Vermelho) e do GDE (Guardiões do Estado).
Ataques a ônibus e prédios públicos e privados ocorrem desde a noite de quarta-feira (2), em um total de 56 crimes. Quarenta e cinco pessoas foram detidas e três pessoas se feriram desde o início da onda de violência.
Numa conjuntura em que soluções de força são anunciadas desde o palanque eleitoral, faz-se necessário lembrar do que foi capaz o PCC depois da criação do Regime Disciplinar Diferenciado nos presídios, em São Paulo.
E de lá para cá, muita coisa mudou. As facções são uma realidade nos presídios, com os governos estaduais adotando a gestão do mais fácil: conceder espaço para facções nos presídios.
Segundo estudo divulgado pela Pastoral Carcerária, o Brasil possui mais de 725 mil pessoas presos, ficando atrás apenas da China (1,6 milhão) e dos EUA (2,1 milhão) em população carcerária.
As prisões do país têm uma taxa de ocupação de 200% – ou seja, elas têm capacidade para receber somente a metade do número de presos.
Boa parte desses presos hoje estão recrutados por facções criminosas que estão em uma guerra, desde meados de 2016, envolvendo a cisão entre os dois maiores grupos nacionalizados, PCC e CV.
Bolsonaro foi eleito também a partir de um clamor popular adestrado pela mídia sensacionalista dos programas policiais de rádio e de tv, que, dentre outras pérolas, defendem que "direitos humanos é para defender bandido" e que "bandido bom é bandido morto".
Essa lógica pode empurrar o governo federal para a linha dura no tratamento dos presídios, que exige maior e melhor estrutura, assim como análise profunda de questões criminológicas.
Sem estrutura para conter rebeliões em massa, coordenadas por facções nacionais, e sem conhecimento de causa de uma questão complexa como essa, o atual governo ainda não caiu na realidade. Se esse estopim for aceso, uma tragédia estará a caminho em breve no país.
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