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Escrito por Administrator | 29 Setembro 2012
Um dos nossos entrevistados deste mês é Haroldo Freitas Pires de Sabóia, candidato a prefeito na capital maranhense pela coligação “São Luís, o caminho é pela esquerda”, que reúne o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) e o Partido Comunista Brasileiro (PCB). Ele nasceu em São Luís, em 1950. Estudou na Escola Modelo, no Marista e no Liceu Maranhense. É economista e advogado. Estudou Economia na Universidade de Paris I Panthéon-Sorbonne (França) e Direito na Universidade de Brasília. Tem mestrado em Planejamento. É do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal e membro da OAB-DF.
Foi vereador de São Luís, duas vezes deputado estadual e três vezes federal. Em seu primeiro mandato como deputado federal, conquistado em 1986, participou da Assembleia Nacional Constituinte (87/88), que elaborou a atual Constituição Federal do Brasil. Junto com outros parlamentares progressistas, recebeu, por seu trabalho na constituinte, nota dez, pela atuação em defesa dos direitos dos trabalhadores. A avaliação foi feita pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP). Durante o governo de Cristóvam Buarque, em Brasília, Haroldo foi diretor administrativo-financeiro e, em se seguida, presidente da Companhia Energética de Brasília (CEB), a maior empresa da Capital Federal.
Vias de Fato – Qual a sua motivação para ser, novamente, candidato a prefeito de São Luís?
Haroldo Sabóia – São várias as motivações para participar da disputa pela Prefeitura de São Luís. Contribuir para a reconstrução, a recomposição, a rearticulação de uma oposição de esquerda em São Luís, na Ilha e em todo o Estado. É, sem dúvida, o primeiro grande desafio, a primeira grande motivação.
Tivemos oportunidade de afirmar, em pronunciamento no Sindicato dos Bancários, em uma Plenária Popular PSOL-PCB, que a coligação "São Luís, o caminho é pela esquerda!" seria vitoriosa em qualquer circunstância: "se tivermos 1, 2, 3, 5 ou dez por cento dos votos seremos vitoriosos, pois teremos avançado na reconstrução de uma oposição de esquerda no Maranhão".
Afirmamos ainda: "Seremos vitoriosos porque colocamos sempre a política adiante do eleitoral, e, mais, a História à frente da política". Em outras palavras, procuramos fazer política com P maiúsculo, a política em uma dimensão histórica.
Outra grande motivação inegavelmente é a de ter oportunidade de oferecer um programa, um conjunto de propostas à sociedade de nossa cidade, com base nos interesses concretos da população, sem demagogia e sem fantasias mirabolantes.
Defender, por exemplo, sem vacilações, a aplicação rigorosa de recursos públicos em obras e serviços públicos: educação pública e gratuita de qualidade, defesa e fortalecimento do SUS, o Sistema Único de Saúde, entre vários outros pontos.
Poderíamos também falar em outras motivações como a de fortalecer em nossa cidade e em nosso Estado o PSOL, Partido Socialismo e Liberdade, que se afirma cada vez mais como o maior partido de oposição de esquerda em nosso país.
E, ainda, e por que não?, também, aos 62 anos de vida e uma longa trajetória de lutas, sou motivado pelo desejo de, pelo exemplo, provocar e estimular o espírito de militância daqueles de minha geração e, sobretudo dos mais jovens, que perderam ou não encontraram ainda o sentido da luta pela igualdade, pela liberdade, pelo socialismo.
Nada me fortalece mais que ouvir de companheiros e companheiras que seus filhos e filhas e/ou netos e netas estão espontaneamente fazendo a campanha do PSOL, do PSOL 50, a campanha do "quero água na torneira/praia limpa pra banhar".
Vias de Fato – A elite maranhense e a maioria da classe política do Maranhão ignoram, completamente, a preservação ambiental. A estupidez é total! São Luís, por exemplo, inchou sem o menor planejamento, convivendo, entre outras coisas, com os impactos negativos de grandes projetos. O que é ainda possível ser feito, em nossa pequena ilha, em termos de desenvolvimento sustentável?
Haroldo Sabóia – Quando as elites maranhenses e a oligarquia política dominada pela família Sarney desprezam a questão ecológica e a emergência para o planeta da preservação ambiental, eles seguem a lógica perversa do desenvolvimento capitalista. Lógica que faz de conta que desconhece que a maioria dos recursos naturais são recursos não-renováveis.
Mas aqui a situação é agravada exponencialmente. Como poder político periférico, a oligarquia Sarney e as elites maranhenses não reivindicam do poder central, do governo federal (que tanto sustentam e apoiam) ações e intervenções que, pelo menos, possam minorar e reduzir os inumeráveis impactos negativos dos grandes projetos. Em resumo, para responder com brevidade à pergunta "o que é ainda possível ser feito, em nossa pequena ilha, em termo de desenvolvimento sustentável?" eu diria: tudo!
Vias de Fato – Ainda em relação à pergunta anterior, nos últimos dez anos, São Luís perdeu muito em qualidade de vida. O avanço indiscriminado dos condomínios horizontais de classe média e a construção de imensos shoppings destruíram inúmeras áreas verdes, desalojaram comunidades e criaram sérias dificuldades para a mobilidade urbana. Neste último ponto, trechos que há oito anos eram percorridos em poucos minutos, agora estão estrangulados. E todos ficam imobilizados, tanto quem utiliza os ônibus, quanto quem se locomove em carros menores. O que fazer diante disso?
Haroldo Sabóia – Há que ter uma administração municipal que tenha e saiba exercer sua autoridade. Que não seja prisioneira das grandes imobiliárias e dos grandes especuladores. Uma administração que seja transparente e absolutamente rigorosa com a coisa pública. O caos urbano que está instalado em São Luis resulta do não cumprimento da legislação, mesmo da frágil e muitas das vezes ultrapassada legislação que temos.
Do Plano Diretor ao Código de Postura nada é respeitado em São Luís. O resultado é o crescimento urbano cada vez mais desordenado que inviabiliza qualquer planejamento.
Se amanhã tivermos a necessidade de ampliar uma avenida, construirmos uma ligação entre um bairro e outro (mesmo que seja de pequena distância), o custo das desapropriações será tão alto que ou inviabilizará ou retardará em muito a execução da obra desejada.
Em resumo, o que fazer diante disso? Cumprir as leis e aperfeiçoá-las urgente e inteligentemente.
Vias de Fato – E a água e o esgoto? Continuaremos a mercê da irresponsabilidade, das tramóias e das licitações de Roseana, Ricardo Murad e Fernando Sarney? O que a prefeitura pode fazer e não fez?
Haroldo Sabóia – A Prefeitura é o poder concedente. Ela tem toda a legitimidade para exigir da CAEMA o cumprimento dos termos do contrato de concessão que assinou com o poder municipal. Todavia, por descaso, negligência e, sobretudo por submissão política os sucessivos prefeitos de São Luís fazem vista grossa: não fiscalizam nem exigem intervenções da CAEMA, não estimulam a sociedade civil a cobrar medidas do Ministério Público e tampouco cumprem seu dever de ajuizar diretamente ações na Justiça contra a CAEMA.
Nossa proposta é de manter o contrato com a CAEMA (pois não temos recursos para encampá-la), passar a fiscalizá-la com rigor, ao mesmo tempo em que buscaremos novas alternativas. Entre elas a mais importante é a criação de um Serviço Autônomo de Água e Esgoto de São Luís.
O nosso SAAE municipal priorizará a distribuição de água e a coleta e o tratamento de esgotos nas áreas da periferia não cobertos ou mal atendidos pela CAEMA.
Não é um modelo novo. Já foi implantado em Belém há mais de 10 anos pelo ex-prefeito e nosso companheiro do PSOL, deputado Edmilson Rodrigues.
Vias de Fato – No Chile, recentemente, Eike Batista tentou instalar uma termelétrica igual a esta que ele construiu em São Luís. Diferente do que ocorreu aqui, lá a população, os ambientalistas, o Ministério Público e o Poder Judiciário, não permitiram a instalação. Sendo o carvão mineral altamente poluente, o que fazer para que esse novo empreendimento não comprometa a saúde dos moradores da nossa ilha?
Haroldo Sabóia – Mobilizar a população. Não há outro caminho. Temos em São Luís o exemplo histórico do Comitê de Defesa da Ilha, criado em 1979, contra a instalação da Alcoa em São Luís, por Nascimento de Moraes Filho, Maria Aragão, Raul Ximenes Galvão, Salscher, João Otávio Malheiros, Josemar Pinheiro e tantos outros.
O Comitê de Defesa da Ilha não logrou impedir a instalação da Alcoa em São Luís, mas foi vitorioso ao levar a consciência ecológica a amplos setores da nossa população. Recentemente, setores ambientalistas tentaram reeditar as mobilizações em São Luís em defesa do meio ambiente, mas inexplicavelmente desconheceram a História e ignoraram, pelo visto deliberadamente, as lutas e as experiências exitosas do Comitê de Defesa da Ilha. Resultado: nunca conseguiram popularizar o movimento.
Vias de Fato – Como a prefeitura pode agir para impedir o racismo e a criminalização de negros e moradores da periferia de São Luís, por parte do aparato de segurança do Estado, além de conter o evidente avanço da violência e do tráfico de drogas?
Haroldo Sabóia – Criaremos a Secretaria de Direitos Humanos para, entre outros objetivos, combater o abuso e a exploração sexual de crianças e adolescentes, combater a homofobia, promover o respeito à diversidade, à orientação sexual, cultural e religiosa de todo cidadão e cidadã.
É, igualmente, compromisso nosso humanizar a cidade e garantir políticas para os setores historicamente excluídos da sociedade com a criação da Secretaria da Mulher, da Secretaria de Igualdade Racial, da Secretaria da Infância e da Juventude, da Secretaria para Pessoas Deficientes.
Vias de Fato – O que você pensa a respeito de participação popular e do controle social na administração pública?
Haroldo Sabóia – Defendemos a criação do Conselho Municipal de Transparência Pública e Controle Social e lutaremos pela aplicação da Lei de Acesso à Informação com severidade, eficácia e rigor. Não daremos trégua à corrupção. Toda a tramitação dos atos administrativos deverá ser publicada em tempo real.
Vias de Fato – Em Belém do Pará, houve uma coligação entre PSOL,PCdoB, PCB e PSTU. No momento em que o lulismo descambou para a direita, qual a sua avaliação sobre esta articulação ocorrida no Pará?
Haroldo Sabóia – O PCdoB entrou na coligação com o PSOL em Belém do Pará muito provavelmente por mero oportunismo. Devido à imensa força política e eleitoral do PSOL paraense, que tem lideranças como Edmilson Rodrigues, político com preparo, perfil e estatura para disputar até mesmo a Presidência da República; como a senadora Marinor Brito e o ex-senador José Neri.
Já a presença do PSTU na coligação em Belém tem outro significado e aponta para a unidade da oposição de esquerda em um futuro bem próximo e em todo o país. Entendo que PSOL, PSTU e PCB têm a tarefa histórica de construir a unidade da oposição de esquerda ao governo PT/PMDB, à aliança Dilma/Sarney.
Vias de Fato – No Maranhão, ainda dominado pelo grupo de José Sarney, qual o papel da esquerda nesta conjuntura pré-2014?
Haroldo Saboia – O papel da esquerda, no Maranhão, deve ser antes de tudo ser de esquerda. Fazer oposição de esquerda tanto aos neoliberais da direita conservadora, representada pelo PSDB, quanto à oligarquia Sarney e todo seu bloco de sustentação política, como também travar a luta ideológica com esses setores que se dizem de esquerda, mas continuam prisioneiros da aliança PT/PMDB. Por exemplo, o PCdoB presidido por Flávio Dino, que ocupa cargo no governo Dilma/Sarney e faz todo o tipo de aliança (de Humberto Coutinho a Dedé Macedo e Edivaldo Holanda) e, também, a denominada resistência petista, liderada pelo deputado Bira do Pindaré, que votou, agora em julho, em Ricardo Murad para vice-presidente da Assembleia Legislativa (poderia votar contra, votar em branco ou se abster) e ainda 'namora' com a candidatura de Eliziane Gama para a prefeitura.
*Entrevista publicada na 36º edição do Jornal Vias de Fato, que circula no começo de outubro de 2012.