segunda-feira, 13 de junho de 2016
Dia de Exú
SANTO ANTÔNIO
O racismo costuma pensar a religião do povo como simples apêndice das religiões oficiais ou dominantes. É a visão etnocêntrica de conquista.
Santo Antônio não é o santo casamenteiro por simples acaso ou influência européia. Seu correspondente sincrético no terreiro é Exú, a entidade encarregada de ligar o mundo dos espíritos ao mundo material, sendo responsável também pelas ligações amorosas.
E a fogueira para Santo Antônio também está inscrita no panteão africano ritual, porque Exú é o dono do fogo.
A festa junina incomoda certos segmentos religiosos fundamentalistas exatamente porque não é apenas ritmo e dança. É também a narrativa sub-reptícia de uma crença que se impôs para além do controle e da repressão dominante.
Quando for festejar, pense no arraial não apenas como palco de apresentações inofensivas das elites maranhenses. Ele na verdade é um território de disputas onde ocorre a guerra surda pela afirmação da identidade.
domingo, 12 de junho de 2016
A sucessão em São Luís: uma leitura de campo
Não há nada de novo nas pesquisas para a sucessão à prefeitura de São Luís.
Os candidatos que se apresentaram até agora não sugerem qualquer mudança fundamental de gestão ou de visão da política. São conservadores, que fazem a política tradicional.
Diríamos que essas candidaturas sequer dialogam com o cenário de esgotamento da politica no Brasil. Eles são parte do problema, para falar a verdade.
Os campos nos quais se inserem essas candidaturas podem ser descritos dessa forma:
a) o campo evangélico fundamentalista e golpista, alinhado com o governo de Michel Temer e seus satélites políticos;
b) o campo evangélico fundamentalista indiferente ao golpe, alinhado com o Governador Flávio Dino e seus satélites políticos;
c) o conservadores golpistas, de oposição ao governo Flávio Dino.
Esses três grandes campos políticos estão submersos na estratégia do financiamento privado de campanha, que deu origem à crise ética em curso. De uma forma ou de outra, suas plataformas de campanha são dependentes de estruturas politicas de mandato. Um deles inclusive luta pela reeleição.
Não analiso pesquisas, mas apenas cenários. Existe um vazio para pelo menos dois campos, que ainda não se apresentaram com definitividade:
a) o campo político progressista, laico e de oposição ao governo Temer, alinhado ao Lulismo e seus equívocos aliancistas, bem como ao Governador Flávio Dino;
b) o campo político socialista, laico, de oposição aos governos Temer e Dino e crítico ao Lulismo.
Esses dois campos acima detalhados podem convergir ou um deles simplesmente pode se diluir.
Como esse vazio será preenchido depende de vários fatores. O mais esperado é que a população entenda que São Luís não aguentará mais um governo de descalabro. Soluções que orbitam em torno do mesmo pecado original precisam ser rechaçadas.
Os candidatos que se apresentaram até agora não sugerem qualquer mudança fundamental de gestão ou de visão da política. São conservadores, que fazem a política tradicional.
Diríamos que essas candidaturas sequer dialogam com o cenário de esgotamento da politica no Brasil. Eles são parte do problema, para falar a verdade.
Os campos nos quais se inserem essas candidaturas podem ser descritos dessa forma:
a) o campo evangélico fundamentalista e golpista, alinhado com o governo de Michel Temer e seus satélites políticos;
b) o campo evangélico fundamentalista indiferente ao golpe, alinhado com o Governador Flávio Dino e seus satélites políticos;
c) o conservadores golpistas, de oposição ao governo Flávio Dino.
Esses três grandes campos políticos estão submersos na estratégia do financiamento privado de campanha, que deu origem à crise ética em curso. De uma forma ou de outra, suas plataformas de campanha são dependentes de estruturas politicas de mandato. Um deles inclusive luta pela reeleição.
Não analiso pesquisas, mas apenas cenários. Existe um vazio para pelo menos dois campos, que ainda não se apresentaram com definitividade:
a) o campo político progressista, laico e de oposição ao governo Temer, alinhado ao Lulismo e seus equívocos aliancistas, bem como ao Governador Flávio Dino;
b) o campo político socialista, laico, de oposição aos governos Temer e Dino e crítico ao Lulismo.
Esses dois campos acima detalhados podem convergir ou um deles simplesmente pode se diluir.
Como esse vazio será preenchido depende de vários fatores. O mais esperado é que a população entenda que São Luís não aguentará mais um governo de descalabro. Soluções que orbitam em torno do mesmo pecado original precisam ser rechaçadas.
sábado, 11 de junho de 2016
A frente única de resistência da classe trabalhadora
Cansei de ouvir que um dos maiores desafios da esquerda no Brasil é a unidade.
Acredito que é inútil esperar por ela, diante de diferenças de pensamento tão grandes. A começar pela própria noção de democracia e a função eleitoral dentro dos sistemas democráticos.
De resto, será sempre difícil compor um campo eleitoral com partidos que rejeitam a chamada democracia "burguesa" e convivem contraditória e esquizofrenicamente com ela.
O processo de impeachment aprofundou essa divisão, introduzindo mais nuances para divergências sem sentido profundo para a classe trabalhadora e o eleitorado de esquerda.
No auge da crise, o PSTU colocou como política fundamental o “Fora Todos e Eleições Gerais”, mesmo que a consigna termine sendo funcional tanto para as alas da direita que defendem o impeachment, quanto para as que defendem a cassação da chapa Dilma-Temer, via TSE, e antecipação das eleições.
O processo de mobilização de onde fala esse controverso campo político também cindiu-se: de um lado, a CSP-Conlutas, no "Espaço Unidade de Ação", liderada pelo PSTU e movimentos alinhados; Frente Povo Sem Medo, liderada pelo MTST e setores hegemônicos do PSOL, incluindo Insurgência e MRT. Do outro lado desse campo, a Frente Brasil Popular, reunido os movimentos sociais governistas, tais como a CUT, UNE, CTB e MST, além dos partidos de sustentação do governo Dilma (PT e PCdoB).
O PCB, posteriormente, aderiu à Frente Povo Sem Medo.
O PSTU e as tendências internas do PSOL, MES e CST continuam basicamente reproduzindo a mesma análise, desconhecendo a questão da correlação de forças e reforçando a Operação Lava Jato.
Para nós, a política do Fora Todos é uma fórmula funcional à direita da FIESP, do partido Judiciário e da Rede Globo. As eleições gerais, por outro lado, dão legitimidade ao golpe, na medida em que institucionalizam a ruptura do mandato presidencial. Não é por acaso que o Movimento Brasil Livre (MBL) de Kim Kataguiri, aplaude o PSTU, cada dia mais efusivamente.
Não existe hoje nenhuma mobilização independente e de massas da classe trabalhadora para tirar o governo do PT pela esquerda, justificando o Fora Todos, como primeiro ato de uma irrealizável insurreição geral. A greve geral, retórica persistente de um determinado ideário trotkista mecanicista, também faz parte deste receituário simplista e ingênuo. Eleições, nesse momento preciso de franco avanço da direita seria um desastre irreparável.
É uma aventura lançar a política de “Fora Todos” em um momento em que a correlação de forças está marcada por atos dirigidos pela direita, que lidera amplamente a mídia, a classe média alta das grandes cidades e o próprio sistema de justiça. Até hoje as pesquisas indicam o amplo apoio ao impeachment e sequer a maioria da população compreende bem porque Dilma Roussef caiu.
A classe trabalhadora de modo geral não foi para as manifestações do Fora Todos, atos que se restringiram a um punhado de militantes, vide o primeiro de abril.
A tarefa de frente única contra o golpe busca reforçar a resistência contra a onda conservadora, colocando a classe trabalhadora contra a direita e não a serviço dela. A experiência das Frentes não pode ser interpretada como primeiro passo para coligações eleitorais sob pena de confundirmos movimentos sociais de massa com partidos políticos. O divisionismo sectário confunde as duas coisas.
As Frentes apenas dão unidade pontual à resistência e pretendem impulsionar os movimentos de rua contra o governo Temer, mesmo que sob consignas diferentes (a FPSM/democracia; FBP/volta Dilma), reunindo os setores mais avançados da classe trabalhadora.
Não compreender a complexidade desse momento histórico, inclusive de disputa real da base social da esquerda e do eleitorado progressista, é cavar o próprio isolamento.
sexta-feira, 10 de junho de 2016
Sair da crise pela esquerda
A crise econômica é crise política também.
Não há nenhuma solução para a crise econômica fora do campo da política. E a política tradicional no Brasil não pode oferecer saídas consistentes para essa crise, uma vez que ela própria é parte da crise, que insiste em se reproduzir melancolicamente.
Sim, porque a política no Brasil da crise é a política corriqueira e trivial, a qual aderiu o projeto petista, que agora está sendo cuspido por ela, depois de fazer seu jogo.
O golpe parlamentar em curso é composto por diferentes setores da sociedade cujo mediador universal é fluido: a onda conservadora. Mas a intuição para defenestrar o PT e aliados do poder contudo não é suficiente para garantir a coerência interna desse desarticulado conjunto.
Por isso, achamos que o golpe não está concluso, nem seu projeto de poder. Os vazamentos continuam esgarçando o governo Temer, embora o arcabouço judicial esteja praticamente sedado agora.
Daí que seguem as movimentações Lulistas por um novo arranjo institucional que não apenas garanta o retorno de Dilma Roussef, mas a governabilidade de seu mandato.
Tais movimentações soam tão nefastas quanto a própria onda conservadora em curso. Eu diria que são um apêndice dela, porque dependem de um cenário onde as velhas raposas da política seriam salvas do naufrágio.
Setores da esquerda enraizaram-se tão profundamente na política tradicional que sua militância nem sonha o que articulam na calada da noite. No chão das manifestações, contudo, sobressaem palavras de ordem singelas e vitimistas, tais como: Volta Dilma! - cuja função parece ser apenas ofuscar o espaço da autocrítica.
Se a autocrítica requer espaço próprio para se realizar (sob pena de emprestar munição para a direita), contudo ela não pode simplesmente ser relegada para o último plano das reflexões, legitimando antigas práticas políticas fisiológicas.
É disso que falamos quando conclamamos o eleitor de esquerda a fazer a ruptura com esse estado de coisas. Sem esse gesto de coragem jogaremos fora uma oportunidade única de construir alternativas legítimas para derrotar a onda conservadora e seus apêndices.
Não há nenhuma solução para a crise econômica fora do campo da política. E a política tradicional no Brasil não pode oferecer saídas consistentes para essa crise, uma vez que ela própria é parte da crise, que insiste em se reproduzir melancolicamente.
Sim, porque a política no Brasil da crise é a política corriqueira e trivial, a qual aderiu o projeto petista, que agora está sendo cuspido por ela, depois de fazer seu jogo.
O golpe parlamentar em curso é composto por diferentes setores da sociedade cujo mediador universal é fluido: a onda conservadora. Mas a intuição para defenestrar o PT e aliados do poder contudo não é suficiente para garantir a coerência interna desse desarticulado conjunto.
Por isso, achamos que o golpe não está concluso, nem seu projeto de poder. Os vazamentos continuam esgarçando o governo Temer, embora o arcabouço judicial esteja praticamente sedado agora.
Daí que seguem as movimentações Lulistas por um novo arranjo institucional que não apenas garanta o retorno de Dilma Roussef, mas a governabilidade de seu mandato.
Tais movimentações soam tão nefastas quanto a própria onda conservadora em curso. Eu diria que são um apêndice dela, porque dependem de um cenário onde as velhas raposas da política seriam salvas do naufrágio.
Setores da esquerda enraizaram-se tão profundamente na política tradicional que sua militância nem sonha o que articulam na calada da noite. No chão das manifestações, contudo, sobressaem palavras de ordem singelas e vitimistas, tais como: Volta Dilma! - cuja função parece ser apenas ofuscar o espaço da autocrítica.
Se a autocrítica requer espaço próprio para se realizar (sob pena de emprestar munição para a direita), contudo ela não pode simplesmente ser relegada para o último plano das reflexões, legitimando antigas práticas políticas fisiológicas.
É disso que falamos quando conclamamos o eleitor de esquerda a fazer a ruptura com esse estado de coisas. Sem esse gesto de coragem jogaremos fora uma oportunidade única de construir alternativas legítimas para derrotar a onda conservadora e seus apêndices.
segunda-feira, 6 de junho de 2016
Organizações de Direitos Humanos foram barradas em Pedrinhas
Imagem: http://g1.globo.com/ma/maranhao/noticia/2015/01/fotos-mostram-vida-de-detentos-e-detentas-no-presidio-de-pedrinhas.html
A Sociedade Maranhense de Direitos Humanos – SMDH, a Justiça Global e a Conectas Direitos Humanos, entidades signatárias da denúncia contra o Estado brasileiro, por conta das violações de direitos humanos em Pedrinhas, foram impedidas de entrar no complexo semana passada, dia 01 de junho.
As peticionárias foram proibidas de realizar inspeção nas unidades denominadas CDP (Centro de Detenção Provisória), PSL 1 e PSL 2 (Presídio São Luís 1 e Presídio São Luís 2), integrantes do Complexo Penitenciário de Pedrinhas, todas objeto das Medidas Provisórias emanadas pela Comissão de Direitos Humanos e pela Corte Interamericana.
No CDP (Centro de Detenção Provisória), a entidades foram informadas pelo diretor daquele estabelecimento prisional, Sr. VALTER ESTEVAM SERRA JÚNIOR, de que não teriam autorização de ingresso visto que um suposto ofício ou portaria de autorização de ingresso das peticionárias estaria sem validade.
Mesmo sendo informado de que ainda está em vigor a portaria de Nº 40/2014 da SEJAP, que regulamenta o ingresso das peticionárias no interior da unidade, o referido diretor se limitou a comunicar que a decisão partira do Secretário Adjunto de Segurança Penitenciária, notadamente o Sr. JOÃO FRANCISCO RODRIGUES e que se estenderia para todas as unidades, razão pela qual as atividades de inspeção foram suspensas.
Estranhamente, o momento da inspeção coincidiu com ocorrência de forte explosão no interior da Unidade denominada CDP (Centro de Detenção Provisória), seguido de cheiro de fumaça, provavelmente em razão de lançamento de bomba de efeito moral.
As entidades, ao comunicar a obstrução à Corte Interamericana, alegaram que há forte clareza de que o Estado Brasileiro violou determinações esculpidas nas Medidas Provisórias do “Complexo Penitenciário de Pedrinhas”, notadamente em relação ao itens 2 e 4:
Item 2 - Requerer ao Estado que, mantenha os representantes dos beneficiários informados sobre as medidas adotadas para implementar a presente medida provisória.
Item 4 - Solicitar aos representantes dos beneficiários que apresentem as observações que considerem pertinentes ao relatório requerido no ponto resolutivo anterior dentro de um prazo de quatro semanas, contado a partir do recebimento do referido relatório estatal.
É incrível como depois de tanto tempo Pedrinhas continua vivendo à margem das normativas internacionais de direitos humanos, além do que continua a descumprir frontalmente a Lei de Execução Penal brasileira.
A nota pública das entidades pode ser lida abaixo.
NOTA PÚBLICA
Organizações de direitos humanos têm entrada barrada em Pedrinhas Na quarta-feira (01/06/2016), os representantes das entidades peticionárias junto à OEA foram impedidas de ingressar no sistema penitenciário de Pedrinhas.
A justificativa de diretores foi a de que "a documentação das peticionárias estava vencida". Embora se argumentasse que a jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos em relação aos presídios de Urso Branco e o de Araraquara obriga o Estado brasileiro a dar acesso aos peticionários de ações relativas ao sistema prisional na OEA, manteve-se o argumento frágil de "desatualização" dos dados.
Reiteramos que a ausência de liberdade das entidades de direitos humanos nas dependências das unidades do Complexo de Pedrinhas é uma grave afronta por parte do Estado não apenas a essas entidades, mas aos presos, que, muitas vezes, reconhecem apenas nelas a possibilidade de denunciar as violações que ocorrem dentro do sistema prisional.
A Corte Interamericana de Direitos Humanos, em Resolução do ano de 2006, entende ser direito dos peticionários de ingressarem livremente em qualquer espaço do estabelecimento prisional a fim de monitorar os locais de privação e a possível adoção de medidas para o cumprimento das decisões do sistema interamericano de direitos humanos.
Em relação ao Brasil, especificamente, existe uma jurisprudência da Corte Interamericana sobre o dever do Estado de conceder acesso pleno a monitores de direitos humanos, conforme, por exemplo, suas resoluções sobre as prisões de Urso Branco e Araraquara.
Não importa quais os meios formais adotados pelo Estado para regulamentar o ingresso das peticionárias, contando que não criem óbice ao livre ingresso das peticionarias. No caso do Maranhão, o ingresso das peticionárias foi regulamentado pela Portaria de nº 40/2004 2 da SEJAP, não havendo razão para a obstrução, que apenas confirma a ausência de transparência na gestão dos presídios e o temor de que as entidades tenham acesso a uma realidade de plena e afrontosa violação de direitos humanos.
Por tudo isso, lamentamos que o atual Governo do Estado, por intermédio de sua Secretaria de Administração Penitenciária, apesar de respondendo a um processo junto à Corte Interamericana de Direitos Humanos, ainda repise os antigos e graves equívocos que os coloca na contramão da atuação das entidades de defesa dos direitos humanos e impeçam o monitoramento das recomendações adotadas por aquele Corte Internacional.
São Luís, Rio de Janeiro e São Paulo, 06 de junho de 2016
Sociedade Maranhense de Direitos Humanos
Conectas Direitos Humanos
Justiça Global
São Luís, Rio de Janeiro e São Paulo, 06 de junho de 2016
É golpe mas parece que eles gostam mesmo é dos golpistas
Nós do PSOL ficamos esperando mudanças na esquerda que deu sustentação ao governo Dilma. Afinal, eles reclamam tanto do golpe e acusam tanto a direita (boa parte dela composta de ex-aliados) de golpistas que até pareciam sinceros.
É a hora de reconfigurar a esquerda, repensar o presidencialismo de coalizão e as velhas práticas de cooptação parlamentar fisiológica. É hora de repensar a representação política, aprofundar a democracia direta, ampliar os espaços de controle social da gestão e dos orçamentos. Sobretudo, é preciso religar a utopia do socialismo com a ética política. Isso será possível apenas quando houver um projeto de poder de esquerda, efetivamente.
Eles sabem que em 2016 teremos um ensaio do que será o Congresso Nacional em 2.018. Também será uma prévia das eleições presidenciais futuras. A onda conservadora não é apenas uma marola, como diria Lula. Ela tem força suficiente para cassar o mandato de Dilma Roussef. E se ela escapar (o que é muito difícil), não terá condições de governar.
Toda a preparação ideológica do golpe e seus sinais evidentes não foram capazes de produzir uma guinada tática nessa esquerda domesticada. É incrível como eles estão sem rumo, completamente adormecidos pelo pragmatismo imbecil.
Toda a movimentação em torno das coligações continua a reproduzir o mesmo ciclo perverso da capitulação ideológica. Não há projeto de poder para essa esquerda. Eles sucumbiram à direita e não pretendem lutar por nada além do pacto das elites brasileiras. É só olhar o que estão fazendo na capital e nos municípios mais populosos do Estado.
Eles não fazem a autocrítica, querem liderar toda a esquerda, apresentando os mesmos nomes problemáticos para a retomada de uma trajetória ideológica que se perdeu no tempo. Isso não é socialismo. É puro narcisismo.
Já é possível dizer, salvo algumas exceções em alguns Estados, que essa esquerda não terá condições de liderar um processo de rebelião contra a onda conservadora. Eles são parte dela, e a operação Lava Jato se encarregará de colocar a pá de cal nesse projeto.
Aqui no Maranhão, está cada vez mais claro que a defesa do governo Dilma, levada a cabo pelo governador Flávio Dino, nada tinha de ideológico. Era apenas um jogo para viabilizar um nome para a sucessão do legado petista.
O governador continua atolado nos seus compromissos de direita, fazendo o jogo dos partidos conservadores, inclusive com aqueles que estiveram à frente do golpe parlamentar. A principais lideranças eleitas pelo governador são golpistas e já tramam a sucessão pela direita, constatando que a barca do petismo afundou irremediavelmente.
A continuar nesse diapasão, teremos em 2018 um congresso pior do que o atual. Nichos de resistência surgirão pela força moral do PSOL, juntamente com quem se aproximar desse protagonismo insurgente de alguns poucos, apoiados pela base social da esquerda progressista, pela juventude e pelos movimentos sociais.
Nós não fizemos coro com a direita nos ataques ao PT e seus aliados, mas nunca abrimos mão da crítica aos seus governos. Construímos uma plataforma crítica pela esquerda mas sabemos que nesse lado não há espaço para a autocrítica. Eles caminham fatalmente em direção ao iceberg. E da morte no gelo será preciso surgir outra esquerda.
É a hora de reconfigurar a esquerda, repensar o presidencialismo de coalizão e as velhas práticas de cooptação parlamentar fisiológica. É hora de repensar a representação política, aprofundar a democracia direta, ampliar os espaços de controle social da gestão e dos orçamentos. Sobretudo, é preciso religar a utopia do socialismo com a ética política. Isso será possível apenas quando houver um projeto de poder de esquerda, efetivamente.
Eles sabem que em 2016 teremos um ensaio do que será o Congresso Nacional em 2.018. Também será uma prévia das eleições presidenciais futuras. A onda conservadora não é apenas uma marola, como diria Lula. Ela tem força suficiente para cassar o mandato de Dilma Roussef. E se ela escapar (o que é muito difícil), não terá condições de governar.
Toda a preparação ideológica do golpe e seus sinais evidentes não foram capazes de produzir uma guinada tática nessa esquerda domesticada. É incrível como eles estão sem rumo, completamente adormecidos pelo pragmatismo imbecil.
Toda a movimentação em torno das coligações continua a reproduzir o mesmo ciclo perverso da capitulação ideológica. Não há projeto de poder para essa esquerda. Eles sucumbiram à direita e não pretendem lutar por nada além do pacto das elites brasileiras. É só olhar o que estão fazendo na capital e nos municípios mais populosos do Estado.
Eles não fazem a autocrítica, querem liderar toda a esquerda, apresentando os mesmos nomes problemáticos para a retomada de uma trajetória ideológica que se perdeu no tempo. Isso não é socialismo. É puro narcisismo.
Já é possível dizer, salvo algumas exceções em alguns Estados, que essa esquerda não terá condições de liderar um processo de rebelião contra a onda conservadora. Eles são parte dela, e a operação Lava Jato se encarregará de colocar a pá de cal nesse projeto.
Aqui no Maranhão, está cada vez mais claro que a defesa do governo Dilma, levada a cabo pelo governador Flávio Dino, nada tinha de ideológico. Era apenas um jogo para viabilizar um nome para a sucessão do legado petista.
O governador continua atolado nos seus compromissos de direita, fazendo o jogo dos partidos conservadores, inclusive com aqueles que estiveram à frente do golpe parlamentar. A principais lideranças eleitas pelo governador são golpistas e já tramam a sucessão pela direita, constatando que a barca do petismo afundou irremediavelmente.
A continuar nesse diapasão, teremos em 2018 um congresso pior do que o atual. Nichos de resistência surgirão pela força moral do PSOL, juntamente com quem se aproximar desse protagonismo insurgente de alguns poucos, apoiados pela base social da esquerda progressista, pela juventude e pelos movimentos sociais.
Nós não fizemos coro com a direita nos ataques ao PT e seus aliados, mas nunca abrimos mão da crítica aos seus governos. Construímos uma plataforma crítica pela esquerda mas sabemos que nesse lado não há espaço para a autocrítica. Eles caminham fatalmente em direção ao iceberg. E da morte no gelo será preciso surgir outra esquerda.
O que o governo Dilma fez (e não fez) para garantir o direito à terra e áreas para conservação?
ISA
Quarta-feira, 01 de Junho de 2016
O ISA publica a partir de hoje série de reportagens com balanço da política territorial do governo Dilma. Você vai saber mais sobre o que foi feito, nesses cinco anos, para oficializar Terras Indígenas, Unidades de Conservação, Territórios Quilombolas e Assentamentos de Reforma Agrária. Texto de hoje traz dados e análises sobre Terras Indígenas.
O governo da presidente afastada Dilma Rousseff é frequentemente criticado por ser um dos que menos fez, nos últimos 30 anos, pelos assentamentos de reforma agrária e as áreas protegidas – Terras Indígenas (TIs), Unidades de Conservação e Territórios Quilombolas. Os números confirmam essa realidade. A paralisação no reconhecimento dessas áreas, segundo os especialistas, guarda relação direta com os acordos firmados por Dilma com sua base parlamentar fortemente ruralista.
Mas se o desempenho no setor foi tão baixo, o que precisamos defender?
Para responder a essa pergunta, entre esta e a próxima semana, o ISA publica uma série de quatro reportagens especiais para avaliar o impacto dos atos do governo Dilma sobre o reconhecimento de assentamentos e áreas protegidas. Abaixo você confere um balanço, com opinião de quatro especialistas, do que a gestão de Dilma fez e não fez pela demarcação de Terras Indígenas.
Poucas Terras Indígenas reconhecidas
Os dados não deixam dúvidas: no governo de Dilma Rousseff, apenas 21 TIs foram homologadas, 25 TIs foram declaradas e 44 TIs foram identificadas e delimitadas – segundo dados monitorados pelo ISA. O processo de demarcação de TIs é complexo e demorado, envolvendo várias etapas e órgãos, desde a Fundação Nacional do Índio (Funai), até a Presidência de República, passando pelo Ministério da Justiça. (Veja como é a demarcação).
Quando o assunto é homologações, a última etapa da demarcação de TIs, os atos da presidente Dilma Rousseff ficaram restritos à região em que estão 98% das TIs já demarcadas, a Amazônia Legal. Das 21 TIs homologadas só uma está no centro-sul do país, onde os conflitos são mais intensos: a TI Piaçaguera, do povo Guarani Ñandeva, com 2,7 mil hectares, no litoral sul do estado de São Paulo. A caneta de Dilma trabalhou mais nos anos de 2012 e 2015, que tiveram um total de sete decretos de homologação cada. Em 2014, ano de reeleição, nenhum decreto foi assinado.
Já as TIs declaradas pelos ministros da Justiça José Eduardo Cardozo e Eugênio Aragão chegaram à marca de 25. Dessas, 15 estão dentro da Amazônia Legal, a maioria no Amazonas, e outras 10 fora dela: três em São Paulo, três no Rio Grande do Sul, duas no Mato Grosso do Sul e duas no Ceará.
Entre abril e maio de 2016, Aragão assinou quase o mesmo número de portarias declaratórias que seu antecessor, Cardozo, que ocupou a pasta por mais de cinco anos: foram 12 de Aragão contra 13 de Cardozo.
Para Sonia Guajajara, da coordenação da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), as medidas responderam à mobilização indígena em Brasília na mesma semana em que ocorreu a votação da admissibilidade do impeachment de Dilma no Senado. “Na semana passada, todos os processos estavam paralisados. Com a nossa vinda aqui, eles se sentiram pressionados”, avaliou Sonia, ao final do Acampamento Terra Livre.
No dia 20/5, um grupo de organizações indígenas, indigenistas e ambientalistas, entre elas o ISA, lançaram a campanha “O governo é provisório, nosso direito é originário!” contra a ameaça de revogação, pelo governo interino de Michel Temer, dos últimos atos de reconhecimento de TIs da gestão de Dilma.
Terra Indígena, só com autorização da presidente
O desempenho da Funai também oscilou: a maior parte das portarias de identificação e delimitação de terras foi publicada entre 2011 e 2013, com uma diminuição sensível em 2014 e uma retomada entre abril e maio de 2016. Essa irregularidade acompanhou as mudanças na direção do órgão: em cinco anos, foram cinco presidentes, dois deles interinos. E não faltaram denúncias de que o órgão estava sendo impedido de realizar sua função constitucional de reconhecer Terras Indígenas.
As reclamações começaram já no final de 2011, quando o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) apontou que a constituição de Grupos de Trabalho para iniciar novos processos de demarcação pela Funai estaria submetida à aprovação de Dilma (leia aqui). Em 2013, foi a vez da ex-presidente interina do órgão, Maria Augusta Assirati, denunciar que a Casa Civil e o Ministro da Justiça estariam intervindo politicamente na tramitação dos processos e paralisando o trabalho do órgão (relembre).
Às vésperas do afastamento de Dilma, o então presidente da Funai, João Pedro Gonçalves da Costa, assinou nove portarias de identificação de TIs, boa parte no Mato Grosso do Sul, São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul – onde os conflitos com interesses ruralistas são maiores (confira o placar de demarcações deste ano). A última portaria, da TI Dourados-Amambaipeguá I, área de 55 mil hectares, já enfrenta a oposição de fazendeiros da região sul de Mato Grosso do Sul.
Aluísio Azanha, advogado e cientista social que trabalhou na Funai entre 2007 e 2015, identifica esse atos como um dos pontos positivos de atuação do órgão no governo Dilma, mas pondera: “Se citamos como positivos a delimitação de TIs do povo Guarani no Mato Grosso do Sul (Panambi-Lagoa Rica, Iguatemi-Pegua I, Ypoi-Triunfo e Dourados-Amambaipeguea I) temos que reconhecer que diversas outras terras em estágios mais avançados nesse estado, não tiveram continuidade em seus processos, como é o caso das Tis Sombrerito, Arroio-Korá, Taquara, Yvy Katu, Ñanderu Marangatu, Guyraroka – sobretudo, por razões judiciais”.
Azanha também destaca os esforços para retirar invasores de TIs já regularizadas, inclusive por governos anteriores, caso das TIs Marãiwatséde (MT), Awá (MA) e, recentemente, TI Apiterewa (PA), mas com poucos avanços fora da Amazônia Legal, em razão do baixo orçamento da Funai, carência de técnicos e resistência dos ocupantes não indígenas.
Mãe do PAC
Mesmo tendo estado no foco das demarcações de TIs no governo Dilma, a Amazônia não passou incólume. Grandes projetos hidrelétricos, como Belo Monte, no Rio Xingu, e o Complexo Tapajós, ambos no Pará, parte do Programa de Aceleração de Crescimento (PAC), foram as meninas dos olhos de Dilma, considerada a “mãe” da iniciativa.
A TI Sawré Muybu, do povo Munduruku (PA), que é uma das áreas que serão afetadas pelas cinco hidrelétricas que o governo quer construir no Tapajós, foi cenário de diversos conflitos no período – e de reclamações dos Munduruku sobre seu direito à consulta prévia, livre e informada sobre projeto, garantida pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Além de descumprir o tratado, o governo Dilma chegou a publicar, em 2013, um decreto colocando a Força Nacional para acompanhar estudos de impacto ambiental e garantir que eles fossem feitos no prazo. Para os Munduruku, espera: os estudos de identificação de Sawré Muybu, mesmo prontos desde 2013, só saíram em abril de 2016.
Adriana Ramos, coordenadora do Programa de Política e Direito Socioambiental do ISA, lamenta que os direitos indígenas tenham ficado à mercê de negociações políticas no governo Dilma, levando à demora na conclusão de demarcações que sequer tinham impedimentos.
“É sempre bom destacar que algumas das terras declaradas e homologadas constavam das condicionantes de obras como Belo Monte – e mesmo assim demoraram desnecessariamente para ser formalizadas”, critica Ramos. Esse é o caso da TI Cachoeira Seca, homologada em abril de 2016 após 30 anos de luta do povo Arara e que deveria ter sido efetivada seis anos atrás, antes do início das obras de Belo Monte (saiba mais).
Já o antropólogo Luis Donizete Benzi Grupioni, da Rede de Cooperação Amazônica (RCA), ressalta que a presidenta lançou mão de uma política de desenvolvimento obsoleta para a Amazônia, revelando desinteresse em atualizar a matriz energética do país e em olhar para desafios como o das mudanças climáticas.
Fora da Amazônia
O fato de ter reconhecido mais TIs na chamada Amazônia Legal não é uma exclusividade do governo Dilma. Segundo os dados monitorados pelo ISA, todos os governos desde José Sarney enfatizaram e avançaram mais nessa região.
Para Daniel Pierri, antropólogo do Centro de Trabalho Indigenista (CTI), o fato de, mesmo no apagar das luzes, o governo Dilma ter reconhecido TIs no sul e no sudeste é importante.
Entre essas terras, está Taunay-Ipegue (MS), palco de conflitos com latifundiários há décadas, que levou doze anos para ser declarada como de posse permanente do povo Terena, em maio de 2016.
O pior legado do governo Dilma, segundo Pierri, está em ter aberto caminho para ataques frontais aos direitos indígenas no Legislativo e no Judiciário. "O governo Dilma de fato foi bastante nocivo aos interesses e direitos dos povos indígenas, mas não tanto pelos aspectos quantitativos, normalmente citados que não refletem bem as diferenças de contexto em cada periodo. Houve nos últimos anos um ataque frontal aos direitos indígenas, especialmente ao direito à terra", critica.
Ele avalia que a paralisação das demarcações pelo Ministério da Justiça fortaleceu teses conservadoras no Judiciário e lembra a visita feita, em 2013, pela então ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, ao Congresso, munida de um suposto laudo da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) que questionava as demarcações feitas pela Funai. “Esse gesto desastroso abriu espaço para a CPI da Funai e para o seu desmonte completo que se anuncia mais fortemente com o governo golpista. Se a Ministra Chefe da Casa Civil critica as demarcações e o Ministro da Justiça as paralisa, qual constrangimento teriam o Legislativo e o Judiciário de questioná-las com cada vez mais força?”, questiona.
Tatiane Klein e Marília Senlle
ISA
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Quarta-feira, 01 de Junho de 2016
O ISA publica a partir de hoje série de reportagens com balanço da política territorial do governo Dilma. Você vai saber mais sobre o que foi feito, nesses cinco anos, para oficializar Terras Indígenas, Unidades de Conservação, Territórios Quilombolas e Assentamentos de Reforma Agrária. Texto de hoje traz dados e análises sobre Terras Indígenas.
O governo da presidente afastada Dilma Rousseff é frequentemente criticado por ser um dos que menos fez, nos últimos 30 anos, pelos assentamentos de reforma agrária e as áreas protegidas – Terras Indígenas (TIs), Unidades de Conservação e Territórios Quilombolas. Os números confirmam essa realidade. A paralisação no reconhecimento dessas áreas, segundo os especialistas, guarda relação direta com os acordos firmados por Dilma com sua base parlamentar fortemente ruralista.
Mas se o desempenho no setor foi tão baixo, o que precisamos defender?
Para responder a essa pergunta, entre esta e a próxima semana, o ISA publica uma série de quatro reportagens especiais para avaliar o impacto dos atos do governo Dilma sobre o reconhecimento de assentamentos e áreas protegidas. Abaixo você confere um balanço, com opinião de quatro especialistas, do que a gestão de Dilma fez e não fez pela demarcação de Terras Indígenas.
Poucas Terras Indígenas reconhecidas
Os dados não deixam dúvidas: no governo de Dilma Rousseff, apenas 21 TIs foram homologadas, 25 TIs foram declaradas e 44 TIs foram identificadas e delimitadas – segundo dados monitorados pelo ISA. O processo de demarcação de TIs é complexo e demorado, envolvendo várias etapas e órgãos, desde a Fundação Nacional do Índio (Funai), até a Presidência de República, passando pelo Ministério da Justiça. (Veja como é a demarcação).
Quando o assunto é homologações, a última etapa da demarcação de TIs, os atos da presidente Dilma Rousseff ficaram restritos à região em que estão 98% das TIs já demarcadas, a Amazônia Legal. Das 21 TIs homologadas só uma está no centro-sul do país, onde os conflitos são mais intensos: a TI Piaçaguera, do povo Guarani Ñandeva, com 2,7 mil hectares, no litoral sul do estado de São Paulo. A caneta de Dilma trabalhou mais nos anos de 2012 e 2015, que tiveram um total de sete decretos de homologação cada. Em 2014, ano de reeleição, nenhum decreto foi assinado.
Já as TIs declaradas pelos ministros da Justiça José Eduardo Cardozo e Eugênio Aragão chegaram à marca de 25. Dessas, 15 estão dentro da Amazônia Legal, a maioria no Amazonas, e outras 10 fora dela: três em São Paulo, três no Rio Grande do Sul, duas no Mato Grosso do Sul e duas no Ceará.
Entre abril e maio de 2016, Aragão assinou quase o mesmo número de portarias declaratórias que seu antecessor, Cardozo, que ocupou a pasta por mais de cinco anos: foram 12 de Aragão contra 13 de Cardozo.
Para Sonia Guajajara, da coordenação da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), as medidas responderam à mobilização indígena em Brasília na mesma semana em que ocorreu a votação da admissibilidade do impeachment de Dilma no Senado. “Na semana passada, todos os processos estavam paralisados. Com a nossa vinda aqui, eles se sentiram pressionados”, avaliou Sonia, ao final do Acampamento Terra Livre.
No dia 20/5, um grupo de organizações indígenas, indigenistas e ambientalistas, entre elas o ISA, lançaram a campanha “O governo é provisório, nosso direito é originário!” contra a ameaça de revogação, pelo governo interino de Michel Temer, dos últimos atos de reconhecimento de TIs da gestão de Dilma.
Terra Indígena, só com autorização da presidente
O desempenho da Funai também oscilou: a maior parte das portarias de identificação e delimitação de terras foi publicada entre 2011 e 2013, com uma diminuição sensível em 2014 e uma retomada entre abril e maio de 2016. Essa irregularidade acompanhou as mudanças na direção do órgão: em cinco anos, foram cinco presidentes, dois deles interinos. E não faltaram denúncias de que o órgão estava sendo impedido de realizar sua função constitucional de reconhecer Terras Indígenas.
As reclamações começaram já no final de 2011, quando o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) apontou que a constituição de Grupos de Trabalho para iniciar novos processos de demarcação pela Funai estaria submetida à aprovação de Dilma (leia aqui). Em 2013, foi a vez da ex-presidente interina do órgão, Maria Augusta Assirati, denunciar que a Casa Civil e o Ministro da Justiça estariam intervindo politicamente na tramitação dos processos e paralisando o trabalho do órgão (relembre).
Às vésperas do afastamento de Dilma, o então presidente da Funai, João Pedro Gonçalves da Costa, assinou nove portarias de identificação de TIs, boa parte no Mato Grosso do Sul, São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul – onde os conflitos com interesses ruralistas são maiores (confira o placar de demarcações deste ano). A última portaria, da TI Dourados-Amambaipeguá I, área de 55 mil hectares, já enfrenta a oposição de fazendeiros da região sul de Mato Grosso do Sul.
Aluísio Azanha, advogado e cientista social que trabalhou na Funai entre 2007 e 2015, identifica esse atos como um dos pontos positivos de atuação do órgão no governo Dilma, mas pondera: “Se citamos como positivos a delimitação de TIs do povo Guarani no Mato Grosso do Sul (Panambi-Lagoa Rica, Iguatemi-Pegua I, Ypoi-Triunfo e Dourados-Amambaipeguea I) temos que reconhecer que diversas outras terras em estágios mais avançados nesse estado, não tiveram continuidade em seus processos, como é o caso das Tis Sombrerito, Arroio-Korá, Taquara, Yvy Katu, Ñanderu Marangatu, Guyraroka – sobretudo, por razões judiciais”.
Azanha também destaca os esforços para retirar invasores de TIs já regularizadas, inclusive por governos anteriores, caso das TIs Marãiwatséde (MT), Awá (MA) e, recentemente, TI Apiterewa (PA), mas com poucos avanços fora da Amazônia Legal, em razão do baixo orçamento da Funai, carência de técnicos e resistência dos ocupantes não indígenas.
Mãe do PAC
Mesmo tendo estado no foco das demarcações de TIs no governo Dilma, a Amazônia não passou incólume. Grandes projetos hidrelétricos, como Belo Monte, no Rio Xingu, e o Complexo Tapajós, ambos no Pará, parte do Programa de Aceleração de Crescimento (PAC), foram as meninas dos olhos de Dilma, considerada a “mãe” da iniciativa.
A TI Sawré Muybu, do povo Munduruku (PA), que é uma das áreas que serão afetadas pelas cinco hidrelétricas que o governo quer construir no Tapajós, foi cenário de diversos conflitos no período – e de reclamações dos Munduruku sobre seu direito à consulta prévia, livre e informada sobre projeto, garantida pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Além de descumprir o tratado, o governo Dilma chegou a publicar, em 2013, um decreto colocando a Força Nacional para acompanhar estudos de impacto ambiental e garantir que eles fossem feitos no prazo. Para os Munduruku, espera: os estudos de identificação de Sawré Muybu, mesmo prontos desde 2013, só saíram em abril de 2016.
Adriana Ramos, coordenadora do Programa de Política e Direito Socioambiental do ISA, lamenta que os direitos indígenas tenham ficado à mercê de negociações políticas no governo Dilma, levando à demora na conclusão de demarcações que sequer tinham impedimentos.
“É sempre bom destacar que algumas das terras declaradas e homologadas constavam das condicionantes de obras como Belo Monte – e mesmo assim demoraram desnecessariamente para ser formalizadas”, critica Ramos. Esse é o caso da TI Cachoeira Seca, homologada em abril de 2016 após 30 anos de luta do povo Arara e que deveria ter sido efetivada seis anos atrás, antes do início das obras de Belo Monte (saiba mais).
Já o antropólogo Luis Donizete Benzi Grupioni, da Rede de Cooperação Amazônica (RCA), ressalta que a presidenta lançou mão de uma política de desenvolvimento obsoleta para a Amazônia, revelando desinteresse em atualizar a matriz energética do país e em olhar para desafios como o das mudanças climáticas.
“Dilma rifou os direitos dos índios”, Luis Donizete Benzi Grupioni
“Dilma rifou os direitos dos índios. Sua concepção atrasada de desenvolvimento e justiça social alimentou uma velha concepção de que índios e meio ambiente são entraves para o progresso e um problema para as grandes obras de infraestrutura. Pouco se fez para conter a violência contra os povos indígenas, que atingiu níveis de barbárie em certas regiões do país. Tratou o direito de consulta como mera formalidade burocrática e usou e abusou de entulho da época militar, ao lançar mão do instrumento de suspensão de liminar para consumar empreendimentos mal planejados em fatos consumados e não consultados. Nunca é demais lembrar que Dilma, em seus anos de governo, esteve formalmente com representantes dos povos indígenas em apenas duas ocasiões: às vésperas da eleição que lhe conferiu seu segundo mandato e no encerramento da I Conferência Nacional de Política Indigenista, quando afirmou que ‘Democracia é demarcação de terras indígenas’. Pena que isso não tenha sido um lema de seu governo”.
Fora da Amazônia
O fato de ter reconhecido mais TIs na chamada Amazônia Legal não é uma exclusividade do governo Dilma. Segundo os dados monitorados pelo ISA, todos os governos desde José Sarney enfatizaram e avançaram mais nessa região.
Para Daniel Pierri, antropólogo do Centro de Trabalho Indigenista (CTI), o fato de, mesmo no apagar das luzes, o governo Dilma ter reconhecido TIs no sul e no sudeste é importante.
Entre essas terras, está Taunay-Ipegue (MS), palco de conflitos com latifundiários há décadas, que levou doze anos para ser declarada como de posse permanente do povo Terena, em maio de 2016.
O pior legado do governo Dilma, segundo Pierri, está em ter aberto caminho para ataques frontais aos direitos indígenas no Legislativo e no Judiciário. "O governo Dilma de fato foi bastante nocivo aos interesses e direitos dos povos indígenas, mas não tanto pelos aspectos quantitativos, normalmente citados que não refletem bem as diferenças de contexto em cada periodo. Houve nos últimos anos um ataque frontal aos direitos indígenas, especialmente ao direito à terra", critica.
Ele avalia que a paralisação das demarcações pelo Ministério da Justiça fortaleceu teses conservadoras no Judiciário e lembra a visita feita, em 2013, pela então ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, ao Congresso, munida de um suposto laudo da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) que questionava as demarcações feitas pela Funai. “Esse gesto desastroso abriu espaço para a CPI da Funai e para o seu desmonte completo que se anuncia mais fortemente com o governo golpista. Se a Ministra Chefe da Casa Civil critica as demarcações e o Ministro da Justiça as paralisa, qual constrangimento teriam o Legislativo e o Judiciário de questioná-las com cada vez mais força?”, questiona.
“Não creio que os indígenas recuarão”, Daniel Pierri
“No apagar das luzes do Governo Dilma, atos demarcatórios de imensa importância foram publicados. O governo golpista anunciou que iria rever esses atos, mas aparentemente começa a perceber o constrangimento a que seria submetido e mudou o discurso. É mais cômodo para eles empurrar com a barriga, como Cardozo fazia. Para que esses atos tenham efetividade, é preciso tirá-los do papel. A figura tenebrosa de Alexandre Moraes à frente do Ministério da Justiça não nos permite a ingenuidade de achar que será fácil, mas a luta dos índios sempre foi e continuará sendo o único instrumento eficaz para isso. Não há outra forma de solucionar os conflitos, senão fazendo avançar esses processos, com a retirada dos não indígenas e devolução das terras para os índios. Qualquer outra solução não será outra coisa que gestão do genocídio. Em alguns contextos, a desintrusão é menos complicada, como em Tenonde Porã, por não contrariar tão diretamente interesses poderosos; em outras, como Taunay-Ipegue, há contraposição direta ao cartel ruralista, ainda mais entranhado no governo golpista do que já era nos governos petistas. Mas, em ambos os casos, não creio que os indígenas recuarão”.
Tatiane Klein e Marília Senlle
ISA
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Placa indicando a Terra Indígena Cachoeira Seca do Rio Iriri (PA), homologada por Dilma Rousseff em 2016 | Rafael Salazar-Poltrona Filme
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