O problema não é a infiltração da direita nos protestos que fazem tremer o país. O problema está mais além e está radicado na infiltração da direita no programa do maior partido de esquerda do Brasil, o PT. Três mandatos de um governo de coalização que cedeu espaço à direita foram suficientes para completar a obra de despolitização da sociedade e de imobilização de sindicatos e movimentos sociais. Nem adiantou anilhar os mais pobres com o programa de transferência de renda, porque hoje não são eles que estão nas ruas e nem serão os protagonistas de mudanças mais profundas que hoje o país precisa. O risco também reside nesse protagonismo das classes médias - que foram deixadas à margem do processo político - que robusteceram seu ódio à política e aos políticos, muito embora a sua juventude domine a nova linguagem política, dentro dos mais agressivos questionamentos ao sistema representativo, já cambaleante.
E agora? Os partidos de esquerda, os sindicatos e os movimentos sociais tradicionais apressam-se em apreender essa nova linguagem, que ameaça mobilizar o poder na atual conjuntura, deixando de fora os antigos ícones dos processos históricos de resistência popular.
O desgaste profundo das instituições políticas, sobretudo, mobilizam os protestos, eis que incapazes de justificar sua existência por intermédio da implementação de políticas públicas eficientes. Ao contrário disso, a classe política, sob a vanguarda antípoda do PT e aliados, conseguiu aprofundar sua ilegitimidade, por seu envolvimento majoritário com a corrupção. Quando se esperava a renovação política e um novo fazer político como hegemonia, assistimos o aprofundamento das concessões à velha política e seus apaniguados, é claro, dentro de um contexto onde as novas mídias fazem circular informações e insatisfações em velocidade supersônicas. Daí não constituir surpresa a rejeição a partidos políticos nas manifestações, até mesmo porque uma parte da chamada esquerda no Brasil é a grande responsável pelos fatos que justificam os protestos. Em São Paulo, não deixou de chamar a atenção o fato de que o próprio PT, no início, queria participar dos protestos, quando seu prefeito era um dos responsáveis pelo aumento das tarifas de transporte e somente com o crescimento do movimento apressou-se desdizer-se, balbuciando desculpas esfarrapadas ao lado do governador do PSDB, principal adversário político dos petistas. Como esperar que esses novos protagonistas da política aceitassem passivamente essa formidável contradição contaminar o protesto que se alastra pelo país inteiro? Imagine o quadro da CUT, que silencia durante a reforma da previdência e sai em defesa dos condenados do mensalão, acompanhada de sua co-irmã estudantil, a UNE?
O desafio agora é superar a desconfiança contra essa a juventude, que vem para as ruas de forma radical, porque o argumento mais piegas da esquerda governista é denunciá-lo como vítima de infiltração da direita, esquecendo-se ela própria que já está abraçada com a direita há muito tempo. A nova linguagem de poder que se levanta agora exige outra esquerda, que deve renascer das cinzas e não simplesmente unir-se indistintamente num infantil instinto de defesa com mensaleiros e pelegos que se entregaram a fundamentalistas, ruralistas e corruptos de plantão - travestidos de esquerda. Disputar a hegemonia desse movimento exige sobretudo coerência política.
Um comentário:
Parabéns, essa é coerência que falta em alguns!
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