Marcelo Godoy
Governo não diz quantos foragidos usavam equipamento, colocado em 4.635 detidos
Marcelo Godoy - O Estado de S.Paulo
O primeiro teste da tornozeleira eletrônica já terminou, mas o governo divulgou apenas um balanço parcial. Dos 23.639 detentos do regime semi-aberto que deixaram as penitenciárias para visitar a família no fim de ano, 4.635 usavam o novo equipamento. Ontem, foi divulgado que 1.681 (7,1%) não voltaram no dia marcado (4 de janeiro) - em 2009, haviam sido 1.985 (8,5%). Mas não se sabe quantos deles estavam sendo monitorados.
O governador Geraldo Alckmin (PSDB), que deve gastar R$ 41 milhões com as tornozeleiras, comemorou e disse que a "avaliação é extremamente positiva". Somente depois de fazer ajustes no equipamento, o governo pretende divulgar quantos presos que saíram com tornozeleira voltaram e quantos aproveitaram para escapar.
Mas as tornozeleiras viraram motivo de receio para os presos. É que os equipamentos enviaram à central de monitoramento 15 mil notificações de supostas irregularidades. Uma já seria suficiente para fazer o preso perder o direito ao semiaberto, sem direito de visitar parentes ou sair para trabalhar.
Francisco Antônio Carnaúba da Silva, de 34 anos, é um dos que têm medo. Por seis vezes, o GPS que acompanha o aparelho em seu tornozelo disparou seu bipe durante os 12 dias em que ele ficou fora da cadeia, visitando a família. O riso e a fala calma do primeiro dia, quando ele seguia para casa, na zona norte de São Paulo, transformaram-se em preocupação.
"O aparelhou começou a apitar e eu telefonei três vezes para o presídio." O GPS estava programado para denunciar Carnaúba e os demais presos que se afastassem mais de cem metros de suas casas após as 22 horas. O problema foi que o aparelho estava programado para as coordenadas da entrada de seu conjunto habitacional. "Moro no prédio dos fundos, daí o aparelho apitava toda noite." No dia 30, ele avisou a direção da prisão, que reprogramou o aparelho. "Aí ele parou de apitar."
Preso desde 2000, Carnaúba entrou na fila da tornozeleira com os colegas às 8 horas do dia 23. Levantou a calça bege e a meia branca para um funcionário do presídio pôr o aparelho em sua perna esquerda. Cinco vezes por ano, ele sai do Centro de Detenção Provisória-1 no Belém, zona leste de São Paulo, para visitar a família. A saída do fim de ano era a 11.ª desde que Carnaúba ganhou o direito de cumprir pena no semiaberto.
Pai de dois filhos, ele foi condenado a 15 anos por homicídio. "Foi uma briga. Se não estivesse armado, não teria acontecido." Ficou oito meses foragido. Teve o primeiro filho quando estava solto e o segundo, já preso. Em 2002, seu pai foi morto no Ceará, onde Carnaúba nasceu. "Senti então o mesmo que sentiu a família da pessoa que eu matei."
Desde 2009, ele trabalha dentro e fora da prisão. "Faltei um dia e agora estou respondendo sindicância", disse. Carnaúba pode perder o benefício. Mas não são todos os patrões que informam quando o preso falta no trabalho. É principalmente para controlar esses detentos que o governo aposta na tornozeleira.
"Vamos fazer ajustes", disse Sávio Bloomfield, diretor do consórcio que fornece as tornozeleiras para o governo. No dia 3, Carnaúba voltou ao presídio.
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