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Ela assina seu primeiro lote de desapropriações, mas está longe de assentar 40 mil famílias
BRASÍLIA - Sob pressão dos movimentos sociais, a presidente Dilma Rousseff assinou somente agora, após um ano de governo, seu primeiro lote de desapropriações de terras para reforma agrária. Os decretos serão publicados nesta segunda-feira no Diário Oficial. A União escolheu 60 fazendas, em 13 estados, que devem atender 2.739 famílias. Porém, Dilma está longe de alcançar a meta oficial de assentar 40 mil famílias no ano. Com isso, o ritmo de invasões de propriedades e de ameaças de invasão continua igual ao do governo Lula.
Antes de criar novos assentamentos, o governo precisou iniciar uma campanha para conter a venda ilegal de lotes pelos beneficiários da reforma agrária. Das cerca de 790 mil famílias assentadas entre janeiro de 2001 e julho de 2011, 103 mil (13%) foram excluídas do programa. A grande maioria, 78%, abandonou o lote ou vendeu as terras.
Em alguns estados, como Mato Grosso e Rio Grande do Sul, um quarto (25%) das famílias assentadas foram excluídas do programa. Agora, o governo adotou como critério para desapropriação valores médios de mercado para avaliação da área, capacidade mínima de assentar 15 famílias e a proximidade de estradas, para facilitar o acesso a políticas públicas, como as de saúde e de saneamento.
Mas movimentos sociais, antigos aliados dos governos do PT, fazem críticas ao tratamento que Dilma Rousseff dá à reforma agrária. Para o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), Alberto Broch, o programa até agora "não andou".
Com a presidente Dilma, a reforma agrária está muito devagar avaliou Broch.
Nos oito primeiros meses do governo Dilma, 159 invasões
O dirigente da Contag afirmou ainda que a falta de recursos e de crédito para assistência técnica acaba estimulando o assentado a vender seu lote.
Uma coisa são os espertos, que vendem para ganhar dinheiro. E outra são os assentados que, sem estímulo do governo, preferem seguir para outras áreas disse Broch.
Relatório da Ouvidoria Agrária Nacional, vinculada ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), contabiliza 159 invasões de terras nos oito primeiros meses do governo Dilma. No mesmo período no último ano de Luiz Inácio Lula da Silva, foram registradas 196 ocupações. Em 2009, foram 124; e, em 2008, 184. Com a petista, as invasões mantêm o ritmo.
Nas palavras do presidente do Incra, Celso Lacerda, o programa de reforma agrária passa por uma revisão. Ele negou existir uma paralisia e disse que, até outubro deste ano, foram empenhados R$ 515 milhões para obtenção de terras, com a compra de 183,5 mil hectares para assentar 6.203 famílias:
Não é verdade que a reforma agrária paralisou. Teremos a aplicação de um dos maiores orçamentos da área. Estamos num momento de revisão. É um ano de análise e de rediscussão.
Reforma agrária não é mera distribuição de terra. O que adianta criar assentamento e não dar estrutura, crédito, assistência técnica? questionou Lacerda.
Segundo ele, Dilma demorou a assinar os decretos de desapropriação por ser meticulosa:
A presidente é muito mais detalhista que os presidentes anteriores. Na reforma agrária, ela quer qualificar o processo, não quer desapropriar área ruim ou marginal. Quer conferir in loco. Esse foi o motivo da demora.
Porém, o detalhismo fará com que o governo fique bem distante da meta do Plano Plurianual, que prevê o assentamento de 40 mil famílias em 2011.
Não tem condição de atingir essa meta, devido à conjuntura orçamentária. Vamos chegar a 25 mil disse Lacerda.
Ex-assentado da reforma agrária e egresso do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), o deputado federal Valmir Assunção (PT-BA) disse que a assinatura dos decretos era fundamental para desafogar os acampamentos à beira de estradas, na fila do lote:
São milhares de acampados aguardando essas terras. Há uma demanda pela reforma agrária. Acredito que este (a assinatura dos decretos) será um presente de Natal da presidente para os sem-terra.
Já o deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO), um dos principais líderes ruralistas no Congresso, acredita que as desapropriações avançam em marcha lenta porque o governo percebeu o estado caótico dos assentamentos:
- São áreas superavaliadas, que só aumentam as despesas do governo. Acredito que a presidente fez uma análise da reforma agrária e percebeu o processo caótico, e que comprar terras, hoje, é um desperdício de dinheiro público.
Assentamento vira imobiliária
No maior assentamento do Brasil em concentração de famílias por metro quadrado, o Itamarati, em Mato Grosso do Sul, o Ministério Público Federal (MPF) denunciou dez pessoas, entre elas o secretário de Infraestrutura e Meio Ambiente de Ponta Porã (MS), Hélio Peluffo Filho, sob suspeita de contribuir ou se associar para a comercialização de lotes em terras da União. A Associação de Moradores dos Projetos de Assentamento Itamarati (Ampai) transformou o que deveria ser o núcleo urbano do assentamento, com serviços de comércio e lazer à comunidade, numa área de especulação imobiliária.
A existência da "imobiliária" foi confirmada por José Roberval Lella, o Paulo da Padaria, recém-eleito novo presidente da Ampai, e por Peluffo Filho, acusado pelo MPF de incentivar a ocupação ilegal da área, "instigando a associação a executar o loteamento clandestino", com o fornecimento de máquinas e mão de obra para abrir ruas e delimitar o projeto. Um policial militar e um ex-PM designados para vigiar o Itamarati comandaram a Ampai no auge de sua atividade imobiliária, entre 2007 e 2009.
O MPF denunciou os dirigentes da associação por invasão de terra pública, parcelamento ilegal de área urbana e disposição de coisa alheia como própria. O secretário foi denunciado pelas duas últimas acusações. A PF investiga o caso, e o presidente do Incra, Celso Lacerda, reconhece que até funcionários do órgão estão envolvidos no comércio de lotes na região:
O que foi criado lá é uma espécie de imobiliária de compra de venda de lotes.
O Itamarati tem 50 mil hectares, com 13.730 habitantes, a 45 quilômetros da fronteira entre Brasil e Paraguai. O núcleo urbano tem 221 hectares, dos quais 121 teriam sido loteados clandestinamente, segundo o MPF.
A Justiça paralisou a reforma agrária em Mato Grosso do Sul até a regularização dos assentamentos. Peluffo Filho refuta a denúncia do MPF e diz que jamais incentivou a ocupação irregular.
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