imagem colhida na net.
As ferramentas do poeta da paz que não chama atenção
SONETO DA PAZ
Nos ombros secos levamos
a rede amarga de sangue,
há um hino em cada boca
e nada nos amedronta.
Em nossas mãos a bandeira
é a camisa do morto
tremulando feito alma
expatriada do corpo.
Mas as fronteiras de arame
entre um e outro homem
serão cortadas agora
que todas as ferramentas
estão plantando na terra
a semente das auroras.
&
A BALA
Ninguém pode descrever
a trajetória da bala
penetrando na pele.
A bala antropofágica,
subtraindo o homem
de sua própria história.
A bala e o arame farpado,
subtraindo o homem
de sua própria geografia.
A bala em vez da semente,
plantando o ódio,
entre as costelas.
No entanto, a mesma bala,
nesta noite inatingível,
nem sequer desconfia
que o próximo tiro
sairá pela culatra.
&
PRIMEIRO DE MAIO
Estamos aqui reunidos
para ouvir a própria fala
dizer em nossos ouvidos
aquele que luta e não cala.
E mesmo que a força da bala
proíba que alguém se rebele
faremos ouvir nossa fala
por sobre as bandeiras da pele.
E arrancaremos estrelas
para plantar em memória
de quem já não pode mais vê-las
surgir sobre a nossa história.
E quando chegar o momento
então sairemos ao vento
colhendo a nossa vitória.
&
OFICINA
Se não existissem estrelas de ferro
não existiria fome, nem medo,
existiria apenas o cego e o mudo
construindo as esquinas
de outro mundo.
Não haveria a liquidez dos assassinatos
se não existissem armas sob a capa de chuva,
nem haveria alma se diluindo em sangue
sob a lama dos sapatos,
haveria o pensamento sólido no prato.
Na transparência do fogo
surgem novas ferramentas
para que o homem resolva
de uma vez por todas
recriar sua própria oficina.
&
MUNDICA
Das mulheres que eu feri
aquela em que eu mais ardi
se rasgou pra me cuspir
na cama
Cantaria para mim
a música de um querubim
se a vida não fosse assim
profana
Flor selvagem do Interior
cujo fruto foi a própria dor
de colher aqui tantos espinhos
Espiava pelos botequins
na embriaguez dos arlequins
tentando reconhecer seus filhos
Contaria para mim -
a fábula do jaboti
se a vida não fosse assim
a fera
que corre pelos jardins
e assalta nossos camarins
e depois foge pela janela
Bebe as tempestades nos dedais
anuncia outros carnavais
que essa febre já nos incendeia
Mata a tua sede, vai por mim,
antes que o fogo queime o capim
sai de baixo dessa terra alheia
Toma a tua terra e berra
contra os teus demônios
que a mais antiga ferida
é o nosso sonho
II
Entre todas que eu curti
aquela que eu não mereci
continua para mim a mesma
com seus dedos de marfim
cerzindo meias para mim
no inverno de tanta tristeza
Flor selvagem do Interior
foi aquela que ninguém plantou
sobre as pedras de nossa Província
Abrigava todos os ladrões
em sua caixinha de botões
antes mesmo de virar notícia
Só pra me fazer dormir
recitaria para mim
aquela poesia do Algarves
e abriria para mim
as suas pernas de cetim
se fosse pra me parir
outra vez
As agulhas não espeta mais
no seu peito como os generais
fazem com suas estrelas loucas
Foi embora sem se despedir
mas deixou a sua arte aqui
como quem parte pensando em voltar
Afugenta os bichos do lixo
tira a tua roupa
veste esta poesia, que um dia
eu te faço outra
(janeiro de 1982)
&
Cinco poemas de Cesar Teixeira, que completa hoje 58 anos de vida e arte, nele, insuperável, inseparáveis. O último é letra de música (inédita) dedicada à sua mãe. Catei os poemas em Bazar São Luís (artigos para presente e futuro) (1988), volume de crônicas de Herbert de Jesus Santos. O título deste post é o da que o autor dedica ao aniversariante do dia.
Um comentário:
PARABENS CAMARADA,,,,QUEM NOS AJUDARA......
MARTINS E CREUZA
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