terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

NEM "NOVA"... NEM "CLASSE"... NEM "MÉDIA"...

Do blog Eco das Lutas.


Franklin Douglas (*)
Os 10 anos do PT no Governo Federal foi o tema da semana no debate de mútuos ataques entre o lulo-peemedebê-petismo e o tucanato. O PT contrapôs um discurso de que elevou 40 milhões de brasileiros à chamada "nova classe média" frente à herança maldita deixada pelo PSDB. Foi o sujo falando do mal-lavado!

Leonel Brizola, certa vez quando provocado a comparar politicamente Fernando Collor e Fernando Henrique Cardoso, respondeu com um daqueles seus ditos espirituosos: "FHC é o Collor menos 10%!". Nas pegadas da tirada brizolista, poderíamos sim afirmar que, ao comparar os oito anos do governo de FHC com os 10 anos de Lula-Dilma, o governo do PT é o governo do PSDB menos 13%!
Senão vejamos:
1) FHC fez a reforma da Previdência privada, Lula a reforma da Previdência pública;
2) FHC privatizou telecomunicações, Dilma, aeroportos e estradas;
3) FHC turbinou o agronegócio, Lula também e Dilma abandonou a reforma agrária;
4) FHC veio ao Maranhão "inaugurar", junto com Roseana, o Pólo de Confecções de Rosário, que só gerou dívidas aos trabalhadores envolvidos; Lula veio ao Maranhão "inaugurar", na companhia de Roseana, o início da construção da Refinaria da Petrobras, também em Rosário, que ninguém sabe quando sairá do papel... FHC e Lula/Dilma sustentaram a oligarquia Sarney no Maranhão e por ela foram apoiados em Brasília;
5) Tanto PSDB quanto PT praticaram o denominado "presidencialismo de coalizão", sob uma governabilidade conservadora que custou o "escândalo da compra de votos para a emenda da reeleição", para FHC, e o "escândalo do mensalão", para Lula.
De fato, a unificação dos programas sociais do Governo Federal em torno do Programa Bolsa Família resultou na diminuição da pobreza. Segundo o IBGE, de 1998 a 2008, as famílias pobres passaram de 32,4% para 22,6%. Dado que segue complementado pelo IPEA que estima que 12 milhões e 800 mil brasileiros saíram da pobreza nesse mesmo período. O MDS (Ministério do Desenvolvimento Social) informa que mais de 13 milhões de famílias foram alcançadas pelo Bolsa Família, mobilizando recursos na ordem de mais de R$ 14 bilhões de reais em transferência de renda a esse setor da sociedade, considerado como abaixo da linha da pobreza.
Se esse dado aparece como um grande avanço em relação aos anos 1990, a década de gestão tucana das políticas públicas, o lulo-peemedebê-petismo superdimensiona esses números e relativiza outros. Já se viu isso no Brasil do ex-ministro Rubens Ricupero (governo Itamar): "O que é bom a gente mostra, o que é ruim a gente esconde" ...
O período Lula-Dilma, para manter-se no governo e ganhar eleições, optou por expressar um pacto de classes que remete a uma espécie de social-neoliberalismo em implantação no país. Ele permite ao Estado disponibilizar recursos para a contenção da pobreza e da miséria, ao mesmo tempo em que, em maior proporção, usa dinheiro do BNDES, por exemplo, para financiar a baixíssimos juros os projetos do grande capital mínero-metalúrgico e energético do País.
Outro exemplo: para a agricultura familiar serão destinados R$ 22 bilhões para a safra 2012/2013 (segundo dados do MDA – Ministério do Desenvolvimento Agrário), enquanto que para o agronegócio destinou-se o total de R$ 44 bilhões para a safra 2011/2012 (dados do MAPA – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento). Três vezes mais para o agronegócio do que o total de recursos destinados ao Programa Bolsa Família!
Sob a atual política monetária e de juros, o governo rola uma dívida superior a R$ 414 bilhões de reais (dados do Ministério da Fazenda sobre a dívida pública bruta consolidada). Tal pacto até resulta numa leve baixa na concentração de renda, mas quase imperceptível ao longo dos 10 anos dos governos do PT, como apurou a última PNAD do IBGE, referente ao ano de 2011: a renda média mensal dos trabalhadores brasileiros subiu 8,3% em relação a 2009, mas, de forma geral, os 10% da população ocupada com renda mais elevada ainda concentraram 41,5% do total dos rendimentos. Os 10% mais ricos concentram quase metade da renda do país!
Nessa velocidade, por exemplo, vai demorar 120 anos para incluir os trabalhadores domésticos numa "proteção social e trabalhista". Como analisou André Singer, um dos intelectuais do projeto petista, "o Brasil caminha para a frente, mas a passo tão lento que fica difícil distinguir se, nele, constrói o futuro ou eterniza o passado" (Folha de São Paulo, 09/02/2013, p. 02).
Assim, o discurso faccioso tenta nos fazer crer que, devido à política de diminuição do desemprego e aumento real do salário mínimo, tivemos um pacto de incorporação ao mercado de consumo da sociedade do que alguns denominaram de uma “nova classe média”.
Nem “nova”... Nem “classe”... Nem“média”... Como reflete lucidamente outro intelectual que, mesmo petista, não ludibria ideologicamente o fenômeno da esdrúxula política de conciliação de classes posta em execução pelo lulo-peemedebê-petismo. Analisa Márcio Pochmann, em seu livro "Nova classe média? o trabalho na base da pirâmide social brasileira":
"Mesmo com o contido nível educacional e a limitada experiência profissional, as novas ocupações de serviços, absorvedoras de enormes massas humanas resgatadas da condição de pobreza, permitem inegável ascensão social, embora ainda distante de qualquer configuração que não a da classe trabalhadora [...] Seja pelo nível de rendimento, seja pelo tipo de ocupação, seja pelo perfil e atributos pessoais, o grosso da população emergente não se encaixa em critérios sérios e objetivos que possam ser claramente identificados como classe média. [...] Associam-se, sim, às características gerais das classes populares, que, por elevar o rendimento, ampliam imediatamente o padrão de consumo. Não há, nesse sentido, qualquer novidade".
Enfim, não temos um novo ator, mas o mesmo ator que emergiu dos anos da luta democrática contra o regime militar e da resistência neoliberal que, ascendendo ao poder, “dourou a pílula”do capitalismo à classe trabalhadora brasileira, como diria Francisco Oliveira. De “novo”, uma espécie de up grade da estratégia a welfare state que garante a reprodução do sistema do capital, acomodando a questão social sob a classe trabalhadora. Nada mais velho na política brasileira!

(*) Franklin Douglas - jornalista, professor e doutorando em Políticas Públicas (UFMA), escreve para o Jornal Pequeno aos domingos, quinzenalmente. Artigo publicado no Jornal Pequeno (edição 24/02/2013, p. 12)

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